Descrição de chapéu
O que a Folha pensa

Gargalo pós-Covid

Deterioração da saúde mental na pandemia requer mais médicos para tratar do sofrimento humano

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Entrada do Hospital das Clinicas, na zona oeste da cidade em São Paulo - Bruno Santos/Folhapress

Já desde bem antes da pandemia, a saúde mental despontava como um dos principais gargalos do SUS. A Covid-19 e sua cascata de efeitos diretos e indiretos pegam uma situação ruim e a agravam.

Pesquisas mostraram que pacientes que se recuperaram de uma internação pelo coronavírus tiveram seu risco de ser acometidos por doenças psiquiátricas aumentado. O panorama dos poupados das hospitalizações não é muito melhor.

Isolamento social, lutos e desemprego, afinal, levam a mais ansiedade, depressão e consumo de álcool e drogas, o que afeta a saúde mental. O dado que mais preocupa é o acentuado aumento dos suicídios.

Nos últimos 20 anos, seu número no Brasil dobrou, passando de cerca de 7.000 ao ano para 14 mil. É mais do que o total de motociclistas mortos em acidentes, na casa dos 12 mil. Esse movimento pode até esconder uma outra notícia.

O índice de suicídios no Brasil, e na América Latina, era muito inferior à média mundial, de forma até um pouco suspeita. Por razões culturais e religiosas, as pessoas, médicos inclusive, escondiam as reais causas do óbito, contribuindo para uma enorme subnotificação.

Nos últimos anos, porém, o tema passou a ser tratado de forma mais transparente. É possível que parte do aumento reflita uma melhora na qualidade dos registros.

A má notícia é que as razões culturais e religiosas, que funcionavam também como um freio às tentativas de tirar a própria vida, se tornaram menos atuantes.

Ainda não é possível ligar a alta dos suicídios à Covid-19, mas é bastante provável que isso venha a ocorrer no futuro próximo. Os números já mostram um aumento nos casos de depressão que pode ser correlacionado à epidemia.

Pesquisa da Vital Strategies, da Universidade Federal de Pelotas, mostrou que os adultos com diagnóstico de depressão saltaram de 9,6% no período pré-pandêmico para 13,5% no primeiro trimestre deste ano. Não há dados para a dependência, mas pesquisas apontam para um aumento do consumo de álcool.

Depressão e dependência são duas das afecções mentais mais presentes entre suicidas. O suicídio, vale lembrar, é o mais trágico dos desfechos de transtornos mentais, porém não o mais comum. Para cada tentativa, há um número significativamente maior de pessoas em sofrimento e que precisariam de tratamento.

O SUS, como já ocorria antes da Covid, tem enorme dificuldade em atender a essa demanda. Basta lembrar que, dos 433 mil médicos em atividade no Brasil, apenas 12 mil (2,8%) são psiquiatras. É preciso qualificar os profissionais de outras especialidades para lidar com os casos psiquiátricos menos complexos.


editoriais@grupofolha.com.br ​ ​

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.