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desmatamento

Eva, estão torrando a sua herança

Nos últimos quatro anos, desmataram na Amazônia o equivalente a todo o estado do Rio de Janeiro

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Giovana Madalosso

Escritora, é autora de "Tudo Pode Ser Roubado" e "Suíte Tóquio" e colunista da plataforma de mudanças climáticas Fervura

Minha filha Eva, quando dei o seu nome, nunca imaginei que um dia cantaria aquela música do Rádio Taxi pensando que a moça do "final da odisséia terrestre" poderia ser você. Pois é, minha pequena Eva, a coisa aqui está complicada. Está todo mundo doidão discutindo triplex e maçonaria enquanto a festa rola solta com a sua herança.

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Vista de área devastada pelo garimpo ilegal na região do rio Crepori, afluente do rio Tapajós, no município de Jacareacanga, Pará - Pedro Ladeira - 15.fev.22/Folhapress

Um dos maiores patrimônios da sua geração, a floresta que dará as cartas no clima do mundo, está sendo dilapidada para encher o bolso de uma dúzia de pessoas. Nos últimos quatro anos, desmataram 47 mil km2, área equivalente a todo o território do estado do Rio, aproximando a Amazônia do ponto de não retorno, quando será incapaz de gerar chuva e de amenizar os efeitos do aquecimento, como secas severas e queda na produção de alimentos. Além de botar lenha na fogueira e levar o que é nosso, a gangue da motosserra ainda impede que o Brasil encha o cofre. Hoje a Amazônia vale muito mais de pé do que desmatada e, a cada ano, o país já vêm deixando de faturar cerca de US$ 1,5 bilhão por conta dessa ceifa.

É como se a minha geração tivesse herdado dos pais um castelo cheio de riquezas naturais e culturais, tivesse dado uma festa de arromba (que nem curtimos porque ficamos no sofá chapados de antidepressivos trocando memes) e deixado uns penetras levarem tudo, até a fiação, para depois entregar o lugar caindo aos pedaços para vocês. E, se bobear, sem nem deixar o mínimo necessário para a reconstrução: o poder de voto, outra herança que nossos antepassados conquistaram a duras penas e que também andam querendo roubar de nós.

Ah, minha pequena Eva. Que ressaca. Que vergonha dessa minha geração de paspalhos. Ia te oferecer uma maçã para adoçar esse amargor, mas nem isso posso fazer: está cheia de venenos do agro. Sabe aquele amor na última astronave? Mamãe promete que não atrapalha. Me leva junto com vocês, vai.

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