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Ivana Jinkings e José Castilho

Mais livros, menos armas

Não basta o slogan de campanha: trata-se de enfrentamento civilizatório

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Ivana Jinkings

Diretora editorial da Boitempo, integra o coletivo Juntos Pelo Livro

José Castilho

Consultor, é ex-secretário do PNLL (Plano Nacional do Livro e Leitura) e ex-presidente da Editora Unesp

No hipersurrealismo que pautou a vida brasileira nos últimos quatro anos, o atual presidente da República chegou a "acusar" seu adversário eleitoral de querer substituir clubes de tiro por bibliotecas.

O absurdo não escandalizou parte da elite e do "mercado", estranhamente. Agora, o que foi tema da campanha de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) à Presidência tornou-se um desafio de enfrentamento civilizatório. Livros, literaturas, livrarias significam um universo de convivência onde o lúdico e a racionalidade se contrapõem ao que há de pior e mais irracional nos seres humanos.

Em um país que ainda ostenta a vergonhosa marca de ter apenas 12% de alfabetizados proficientes (Inaf, 2018), ou seja, de 214 milhões de brasileiros, temos 188 milhões que não são capazes de compreender integralmente a informação e o conhecimento.

A opção por mais livros significa apontar um Brasil que anseia outro patamar para seu desenvolvimento, promovendo o direito inalienável à leitura, valorizando a educação formal, a cultura ancestral dos povos originários e nossa herança africana, incentivando as novas tecnologias, respeitando e apoiando a ciência, valorizando os formadores e mediadores de leitura que estão nas comunidades, nas escolas, nas bibliotecas e nos centros culturais. Reconhecendo a importância das ideias para a transformação humana.

Substituir armas por livros: mais que um slogan de campanha é uma imperiosa e crucial necessidade a ser enfrentada como política de Estado pelos governos junto à sociedade civil para se tornar permanente e supragovernamental. Uma medida que se torna mais urgente quando a besta-fera da irracionalidade fascista volta a assombrar nosso país e o mundo. Os que buscam calar a inteligência, manipular a falta de conhecimento da população, queimar autores e livros e estimular o ódio por meio de mentiras sabem a importância de destruir o saber e fomentar a ignorância, restringir a imaginação e construir o simbólico distante dos valores democráticos, comunitários e inclusivos.

Sem conhecimento não se muda a sociedade, e o conhecimento vem principalmente das trocas estabelecidas pela leitura. O governo eleito precisa entender sua centralidade no mundo da cultura.

Colocar em prática o tema de campanha, somando a ele outro tão caro a Lula, que encabeça a recente Carta Aberta em Defesa do Livro, da Leitura, da Literatura e das Bibliotecas: "Comida no prato, livro na mão!".

O caminho para essa política já teve seu piloto entre 2006 e 2010, com o Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL), verdadeiro pacto social que uniu as forças do Estado e da sociedade em trabalho conjunto da cultura com a educação. É imperativo recriar a Secretaria do Livro no futuro Ministério da Cultura e qualificar a interlocução com estados, municípios e com o MEC para operacionalizar a lei que institui a Política Nacional de Leitura e Escrita e dar consequência ao compromisso presidencial.

Sem inventar a roda, o roteiro para a ação nessa área já está escrito pela experiência, fruto do acúmulo conceitual e da resiliência dos ativistas e profissionais do livro, das literaturas e das bibliotecas. Foi escrito com luta democrática e inclusiva, tudo o que esperamos para 2023.

TENDÊNCIAS / DEBATES
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