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Samuel Hanan

O setor público brasileiro não cabe mais no PIB

É urgente enfrentar o gigantismo da máquina pública cara e ineficiente

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Samuel Hanan

Engenheiro com especialização nas áreas de macroeconomia, administração de empresas e finanças, é empresário e ex-vice-governador do Amazonas (1999-2002); autor de “Brasil, um País à Deriva” e "Caminhos para um País Sem Rumo" (ed. Valer)

Um dos principais desafios do novo governo será reduzir a carga tributária, em especial sobre consumo e emprego, que sacrifica a população e não contribui para o desenvolvimento. Essa tarefa pode exigir mais de um mandato, tamanha sua proporção atual, porém é fundamental ser iniciada pelo governo Lula se, de fato, o Brasil quer se tornar um país mais justo e menos desigual.

A verdade é que o setor público brasileiro não cabe mais no PIB. Essa realidade é resultado de uma série de erros acumulados ao longo das últimas décadas, fruto de visões administrativas equivocadas, centradas na sanha arrecadatória, benefícios concedidos até mesmo em contrariedade à Constituição Federal, falta de planejamento a longo prazo e viabilizadas diante da omissão de setores importantes da sociedade.

Somando-se a arrecadação efetiva (33,7% a 33,9% do PIB) aos gastos tributários da União, principalmente renúncias (de 4,5% a 4,7%), aos gastos tributários da estados e municípios, na forma de renúncias fiscais (0,8% a 1%), e às perdas com sonegação (2,5% a 3%), chegamos a um patamar entre 41,5% e 42,6% do PIB.
Trata-se de um número absurdo, que supera em muito a relação carga tributária/PIB registrada em países desenvolvidos como Estados Unidos (de 25,3% a 27%), Canadá (31%), Austrália (27,5%) e Suíça (26,9%) —e até mesmo em países emergentes como China (20,1%), México (23,6%) e Coreia do Sul (26,8%).

Mais grave é que o Brasil, com uma das 12 maiores cargas tributárias do mundo, devolve à população serviços públicos ruins, classificados na 30ª posição entre as nações, e o acúmulo de déficits do setor público, problema crônico nacional, já elevou as dívidas brasileiras para o astronômico número de R$ 7,3 trilhões a R$ 7,5 trilhões e à consequente cobrança de juros de R$ 1 trilhão por ano.

Mesmo em um cenário otimista —com redução da Selic de 13,75% para 9% ou 10% ao ano—, o Brasil pagaria juros de R$ 657 bilhões a R$ 750 bilhões por ano, montante superior a cinco orçamentos anuais do SUS ou suficiente para custear por quatro anos as despesas com o programa de transferência de renda.

A revisão do setor público, com a redução do seu déficit a 2% do PIB, no máximo, certamente implicaria inflação mais comportada e em redução da taxa Selic para 8% ou 9% ao ano. Consequentemente, com a dívida pública de R$ 7,3 bilhões a R$ 7,5 bilhões, os juros anuais seriam reduzidos dos atuais R$ 900 bilhões ou até R$ 1 trilhão para menos de R$ 600 bilhões —economia substancial para uma nação que reclama a falta de recursos para investimento em setores essenciais.

É urgente enfrentar o gigantismo da máquina pública ineficiente, cara e cheia de privilégios, pois a arrecadação, que representa 33,9% do PIB, consome cerca de 35%, sendo 13% com salários do funcionalismo, de 7,5% a 9% com juros sobre dívidas, outros 3% com o déficit do Regime Geral da Previdência (INSS) e mais 1,1% com o déficit da Previdência de servidores públicos do Executivo, Legislativo e Judiciário. Com tal distorção, os custos da máquina, dos programas sociais, dos serviços contratados e dos investimentos públicos são suportados pela sobra de arrecadação, de 7% a 9,8% do PIB, mais o déficit público de 4% a 4,2% do PIB, caracterizando-se, portanto, sério entrave ao desenvolvimento nacional (uma espécie de cachorro correndo atrás do próprio rabo).

O Brasil somente conseguirá equilibrar as contas e voltar a crescer se atacar as causas do gigantismo do setor público, cortar despesas, reduzir privilégios e renúncias fiscais, combater efetivamente a corrupção entre os agentes públicos e corrigir as enormes desigualdades regionais e sociais atuando sobre a raiz desse problema. O tamanho do desperdício ultrapassa de 9% a 10% do PIB, ou seja, R$ 900 bilhões a R$ 1 trilhão por ano. De nada adiantará tomar medidas pontuais e espasmódicas se não forem buscadas soluções para suas origens: gigantismo da máquina, corrupção e renúncias fiscais ilegítimas.

Sem isso, a nação continuará patinando no esforço em busca do desenvolvimento e seguirá penalizando a população mais pobre.

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