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Helena Branco

Carta aberta de uma jovem ao governador paulista

Por qual razão vetar a melhor política de garantia de dignidade menstrual?

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Helena Branco

Estudante de políticas públicas e relações internacionais, é supervisora de advocacy na Girl Up Brasil

O último dia 9 de fevereiro me lembrou 10 de março de 2022, quando fui a Brasília desafiar o veto presidencial a um projeto de lei sobre dignidade menstrual. Naquela tarde, nosso grupo de meninas de 15 a 20 anos transitava entre os parlamentares, uma cena incomum (se não inédita) na história da República.

Hoje, é ao senhor governador, Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), que me dirijo por conta de ato semelhante ao do então presidente Jair Bolsonaro.

Governador Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP)v veta projeto de lei que previa distribuição de absorventes em escolas, presídios e entre população vulnerável - Gabriel Cabral/Folhapress

Por que vetar, na integralidade, a melhor política de garantia de dignidade menstrual que poderíamos ter no estado de São Paulo, o projeto de lei 1.117/2019?

O senhor alega ser suficiente o programa Dignidade Íntima e a isenção do ICMS para produtos menstruais, ambos já vigentes no estado. Discordamos: um problema tão multifacetado quanto a pobreza menstrual requer abordagens plurais.

Além disso, não é verdade que atinja apenas meninas em idade escolar ou que só diga respeito à distribuição de produtos menstruais. Também é falso o pioneirismo paulista na pauta, apregoado pelo senhor. Faço parte do movimento Livre Para Menstruar que, de junho de 2020 a janeiro de 2021, atuou pela aprovação de leis sobre a temática em outros seis estados da Federação. O programa Dignidade Íntima data de junho de 2021.

Nós, ativistas e especialistas, entendemos que o veto impede a universalização de um direito. O programa Dignidade Íntima atende apenas um público específico, ao passo que o PL vetado garantia a distribuição e educação menstrual para detentas, mulheres em situação de rua ou que vivem em abrigos, além de fomentar a pesquisa, fundamental para a construção de soluções efetivas.

Se a distribuição gratuita de preservativos hoje é política consolidada e consenso na sociedade, por que seria diferente com a distribuição de absorventes em escolas e aparelhos de saúde? Uma resposta clara está no nome do projeto vetado: "Menstruação Sem Tabu". Apesar de ser um processo natural e biológico, menstruar ainda é tabu. Mas, entre os que já compreenderam a importância desse debate, destaco a ONU, que reconheceu, em 2014, que dignidade menstrual é uma questão de saúde pública e direitos humanos.

Direitos, entretanto, precisam ser assegurados por políticas públicas eficientes. Catorze anos antes do meu nascimento, a Constituição de 1988 celebrou a universalização de direitos. Sei que está nas mãos da minha geração ser fiel a esse legado. Se, para muitos, legislações nesse sentido podem parecer bobagem, o mesmo não se pode dizer das 213 mil meninas que frequentam escolas sem banheiros em condições de uso, dado que nos faz dar conta da característica multifacetada do problema.

Nós, ativistas e especialistas, entendemos o avanço da pauta como manifestação do corpo vivo e vibrante da democracia. E esperamos que o estado de São Paulo seja referência na universalização da dignidade menstrual.

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