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Nelson Barbosa

Os temores infundados da Folha

Atual direção do BNDES não defende o volume de subsídio do passado

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Nelson Barbosa

Diretor de planejamento do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), é ex-ministro da Fazenda e do Planejamento (2015-2016); doutor em economia pela New School for Social Research

A Folha publicou o editorial "Subsídios temerários" (10/3), criticando o teor de minha entrevista à própria Folha ("BNDES propõe novo título que poderá valer para pessoa física e volta de subsídios", 5/3). As críticas refletem temores infundados. Vamos por partes.

Sobre os empréstimos da União ao BNDES, sim, entre 2008-14 o Tesouro Nacional repassou cerca de 9,5% do PIB ao banco, mas a Folha esqueceu de completar a história: entre 2015-22, o BNDES pagou de volta a maior parte desses empréstimos.

Em valores nominais, entre 2008-22 houve empréstimos de R$ 441 bilhões da União ao BNDES e pagamentos de R$ 688 bilhões do BNDES à União. Com base no fluxo de caixa anual, o Tesouro Nacional obteve uma taxa interna de retorno de 6,7% ao ano, contra uma inflação média de 5,8% no período.

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Sede do BNDES, no Rio de Janeiro - Lucas Tavares - 18.jul.2017/Folhapress

A Folha prossegue dizendo que a diferença entre a taxa de captação ao Tesouro e empréstimo ao BNDES chegou a 7% ao ano, o que seria alto. O jornal está correto, mas o autor do texto esqueceu de mencionar que a atual direção do banco não defende o volume de subsídio do passado.

Para corrigir o lapso do editorialista, repito o que disse na entrevista: o BNDES sugere que o governo possa aplicar um redutor sobre as taxas de captação do Tesouro, para repasse em empréstimos a atividades e púbicos específicos, em um valor limitado.

Quanto e quais atividades? O que for determinado pelo Congresso Nacional, no âmbito das discussões orçamentárias, como já acontece, por exemplo, nos subsídios ao agronegócio e à própria Folha, via desoneração da folha de pagamentos do setor de comunicação.

O economista Nelson Barbosa, diretor de Planejamento do BNDES; banco prepara maior pacote de mudanças em cinco anos - Pedro Ladeira/Folhapress - Folhapress

Outra crítica do jornal é que a atuação do BNDES entre 2008-14 não gerou benefícios para a sociedade, o que é uma opinião controversa. O debate entre economistas está longe de ser conclusivo sobre o tema e faltou ao editorialista citar o outro lado da questão. Menciono apenas dois fatos.

Primeiro, a taxa de investimento do Brasil flutuou entre 20% e 21% entre 2010-14, período de forte atuação do BNDES, criticado pela Folha. Em 2022, pós retração do BNDES, a taxa de investimento foi de aproximadamente 19% do PIB. O encolhimento do BNDES explica parte desta queda.

Segundo e ligado ao ponto anterior, a expansão do mercado de capitais no financiamento de infraestrutura ocorreu em paralelo à redução do total financiado. Em números, o valor caiu de 1,4% do PIB, em 2014, para 1% do PIB, em 2021. Os números de 2022 ainda não foram divulgados, mas valores até setembro indicam o mesmo padrão: o aumento da captação via debêntures não compensou a grande retração do BNDES.

A Folha também indica ser contra criar Letras de Crédito para o Desenvolvimento (LCD), isentas de Imposto de Renda, para captação pelo BNDES e outros bancos de desenvolvimento. Neste ponto lembro que o benefício já existe para o agronegócio (LCA), o setor imobiliário (LCI) e a infraestrutura (debêntures incentivadas). A proposta do BNDES apenas alinha condições de captação de recursos para o desenvolvimento de longo prazo, podendo ser aperfeiçoada pelo Congresso Nacional.

Por fim, a Folha parece abominar a palavra subsídio, esquecendo de dizer que isto faz parte de políticas públicas no mundo inteiro, vide a recente proposta franco-alemã de aumentar incentivos fiscais para o desenvolvimento verde na União Europeia, em resposta aos benefícios já anunciados pelo governo dos EUA no mesmo sentido.

Precisamos voltar a discutir incentivos fiscais e financeiros ao desenvolvimento produtivo e social, com transparência e análise de impacto, sem os espantalhos ideológicos que fizeram tão mal ao Brasil durante os governos Temer e Bolsonaro.

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