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O que a Folha pensa Rússia

G7 em transição

Encontro no Japão atestou mudança no cenário global que Lula demorou a entender

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Luiz Inácio Lula da Silva (PT), ao lado de Joe Biden, presidente dos EUA, durante reunião do G7 - Ludovic Marin/AFP

Da segunda metade dos anos 1990 até meados da década passada, a Rússia desfilava como ator assíduo nos encontros da elite mundial, e a China recebia chancelas de democracias ricas para participar com isonomia dos negócios globais.

As preocupações com a segurança internacional concentravam-se nas ameaças terroristas, e mal passavam de uma franja ruidosa os movimentos extremistas e neopopulistas nas nações democráticas.

Esse cenário mudou. O expansionismo russo abriu um cisma entre o Kremlin e as democracias do hemisfério norte, que agora tentam apartar a China da vanguarda tecnológica enquanto enfrentam robustas forças políticas domésticas hostis aos princípios liberais.

Voltou a reclamar atenção o estrago planetário que nações armadas até os dentes com ogivas e mísseis nucleares poderiam provocar.

Nesse contexto deve ser entendido o encontro de cúpula do G7 (EUA, Alemanha, Reino Unido, França, Itália, Japão e Canadá), ocorrido neste fim de semana em Hiroshima, que teve o Brasil entre os convidados extraordinários.

A invasão russa da Ucrânia e as preocupações com a saliência econômica e geoestratégica chinesa ressaltam-se no extenso documento final divulgado pelo grupo.

No primeiro caso, a mensagem foi a de que as potências democráticas apoiarão a Ucrânia o quanto for necessário. No segundo, alertas sobre movimentações de Pequim no Mar do Sul da China, o clamor por uma solução pacífica em Taiwan e a orientação para reduzir a dependência econômica do gigante asiático completaram o recado.

Se o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se viu deslocado dos eixos das conversas na cidade japonesa, foi por não ter compreendido essa transformação geopolítica a tempo de evitar dizer e fazer as bobagens que cometeu na campanha e no início do governo.

A retórica presidencial, ao por exemplo descrever a agressão russa como violação territorial da Ucrânia, pareceu desta vez mais ajustada. É essa qualificação que a Carta de 1988 inspira quando elenca a autodeterminação dos povos e a não intervenção como bases das relações internacionais do Brasil.

As trapalhadas do passado, no entanto, dificultam o credenciamento brasileiro como um ator importante no encaminhamento da paz. A bem da verdade, uma mediação brasileira de uma guerra que se passa no leste da Europa seria improvável em qualquer hipótese.

Até pela sua dilatada distância geográfica e política do teatro das operações, o Brasil pode dar-se ao luxo de errar sem maiores consequências nesse caso. O mais importante é o governo Lula aproveitar o episódio para livrar-se de concepções diplomáticas ultrapassadas.

editoriais@grupofolha.com.br

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