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José Luis Gordon e Alexandre Abreu

O BNDES no centro da neoindustrialização

Brasil deve se posicionar diante do acirramento da competição internacional

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José Luis Gordon

Diretor de desenvolvimento produtivo, inovação e comércio exterior do BNDES e vice-presidente da ABDE (Associação Brasileira de Desenvolvimento); ex-presidente da Embrapii (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial)

Alexandre Abreu

Diretor financeiro e de crédito digital para MPMEs (micro, pequenas e médias empresas) do BNDES; ex-presidente do Banco do Brasil

As grandes potências mundiais só alcançaram o desenvolvimento por meio da industrialização. São países que desafiaram suas vantagens comparativas existentes, em vez de aceitá-las, conforme diz o professor sul-coreano Ha-Joon Chang. Em contraste, a desindustrialização que acomete o Brasil coloca o país em uma rota de distanciamento da fronteira econômica, social, ambiental e tecnológica.

Ao contrário de outros países, a desindustrialização do Brasil é precoce. Não ocorreu com o ganho de participação de um setor de serviços de alto valor agregado e, não à toa, conectado à indústria moderna remanescente. No Brasil, os setores que lideram a economia pelo lado da oferta em variáveis como PIB, emprego e exportações são, na sua maioria, de baixa intensidade tecnológica.

Sede do Banco Nacional de Desenvolvimento Social (BNDES), no centro do Rio de Janeiro - Rafael Andrade/Folhapress - 1578

Por isso, recebemos a missão do presidente Lula de reconstruir uma política industrial tecnológica, verde e inclusiva. Nossa defesa por esse resgate do fomento à indústria no país não é uma jabuticaba brasileira.

Embora pouco divulgado no Brasil, Jake Sullivan, conselheiro de Segurança Nacional dos EUA, proferiu um contundente discurso sobre políticas industriais. Ao falar sobre a Ásia, ele salienta que "a República Popular da China continuou a subsidiar em larga escala [para] setores industriais tradicionais, como aço, bem como indústrias-chave do futuro, como energia limpa, infraestrutura digital e biotecnologias avançadas".

Em oposição ao modelo chinês, Sullivan fala do modelo norte-americano, vigente até o governo Biden, no qual "em nome de uma eficiência de mercado supersimplificada, cadeias de suprimentos inteiras de bens estratégicos —juntamente com as indústrias e os empregos que os sustentavam— foram transferidas para o exterior. E a suposição de que uma liberalização comercial profunda ajudaria a América a exportar bens, não empregos e capacidade, foi uma promessa feita, mas não cumprida".

O discurso de Sullivan não serviu apenas como uma confissão de que o país nunca deixou de realizar políticas industriais, mas também como um aviso de que os EUA vão ampliar esforços e investimentos públicos, identificando setores específicos fundamentais para o crescimento econômico, estratégicos do ponto de vista da segurança e do bem-estar nacional. O governo Biden já anunciou três iniciativas que devem atingir US$ 1,8 trilhão. A União Europeia também anunciou que deve investir 400 bilhões de euros em apoio a fabricação de semicondutores, fundos para novas tecnologias e transformação digital.

Diante do cenário de acirramento da competição internacional, há o risco de ficarmos ainda mais para trás e perdermos oportunidades geradas nesse contexto. A solidez fiscal e as reformas estruturantes, como a tributária, são centrais. Porém, é ingenuidade supor que elas sejam capazes de, por si sós, levar o país a uma nova rota de crescimento sustentável.

A política industrial em construção visa um processo de neoindustrialização a partir de missões estruturais que transformem a indústria e atendam às novas e às antigas demandas sociais, ambientais e climáticas do país. É certo que não dispomos da mesma margem fiscal que as economias avançadas, mas assim como já fazemos para a agricultura, podemos avançar num fomento focado e transparente para a indústria.

Nesse sentido, o BNDES já disponibilizou R$ 4 bilhões de crédito a uma nova taxa de juros em dólar que visa baratear os recursos para as indústrias exportadoras. A indústria produtora de máquinas, equipamentos e implementos agrícolas também se beneficiou com mais R$ 4 bilhões anunciados na mesma taxa em dólar para produtores rurais exportadores. Vale dizer que esses R$ 8 bilhões são novos valores colocados no mercado sem qualquer forma de subsídio, ancorados em captações internacionais do BNDES junto a organismos internacionais. O BNDES ainda teve o complemento de R$ 6,5 bilhões de novos recursos do Plano Safra neste primeiro semestre, valor que conta com subsídios explícitos aprovados pelo Congresso Nacional.

O BNDES, assim como ocorre em outros países, deve atuar complementando o mercado e executando políticas para a modernização da nossa indústria. Eventuais benefícios ou subsídios, também praticados em outros países, podem ser apresentados e debatidos de forma transparente com a sociedade e contarão com a avaliação de sua efetividade. Sob a liderança do presidente Lula, a política industrial será central no novo BNDES.

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