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Helena B. Nader

Um exemplo para as mulheres na ciência

Que o centenário de Johanna Döbereiner inspire busca por equidade de gênero

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Helena B. Nader

Presidente da Academia Brasileira de Ciências e professora emérita da Escola Paulista de Medicina da Unifesp

Johanna Döbereiner, que comemoraria 100 anos neste 2024 (1924-2000), fez história na agricultura do Brasil e do mundo. E também na ciência. Em 50 anos de carreira, liderou pesquisas no que iria se tornar a Embrapa Agrobiologia, orientou pesquisadores e foi indicada ao Nobel de Química. Em uma de suas descobertas, permitiu ao país economizar até US$ 2 bilhões por ano na produção agrícola. Era uma das poucas mulheres em um ambiente tomado por homens —o que não lhe custou poucos desafios.

Neste mês que marca o Dia das Mulheres e Meninas na Ciência (11 de fevereiro), relembro a história de Johanna como um convite para refletirmos sobre o incentivo e reconhecimento dado às mulheres na sociedade. Embora dados recentes apontem avanços, uma análise do cenário brasileiro mostra que ainda temos um longo caminho a percorrer na busca pela equidade de gênero.

A cientista Johanna Döbereiner em seu laboratório, no Rio de Janeiro (RJ) - Alexandre Campbell - 15.mai.1995/Folhapress - Alexandre Campbell/Folhapress

Recentemente, o Brasil passou da 94ª posição, em 2022, para a 57ª, em 2023, no ranking dos países com melhor paridade neste quesito, segundo o relatório Global Gender Gap, do Fórum Econômico Mundial. A amostra inclui 146 países. Ao observar os indicadores, contudo, percebemos que há muito ainda a melhorar, sobretudo na participação econômica e política das mulheres.

Ao mesmo tempo em que somam 51,5% da população, mulheres são apenas 17,7% das deputadas e 18% das senadoras. Também são apenas 5% no topo de empresas de capital aberto, segundo o Ibovespa. No trabalho, a remuneração também é desigual: mulheres recebem 78% do que ganham os homens, aponta o IBGE.

Isso mostra que ainda estamos muito aquém do ideal em termos de equidade —e de oportunidades. O mesmo ocorre na ciência. Embora mulheres já sejam a maioria na pós-graduação, menos da metade ocupam posições mais altas, como a docência. Em ciências agrárias, por exemplo, área de Johanna, mulheres já são 51% dos doutores. Apesar disso, representam apenas 25% dos docentes permanentes nas universidades. Uma situação que se repete em diversas outras áreas e se agrava quando observados dados de raça, segundo o Gemaa/Uerj, com apoio do Instituto Serrapilheira.

Recentemente, tivemos boas notícias, como um aumento de premiadas no Nobel. Ainda assim, não se pode deixar de notar o abismo entre gêneros na história do prêmio.

Nesse sentido, cabe destacar o papel desempenhado por diferentes setores na busca por equidade.
Na Academia Brasileira de Ciências, em 2021, o número de mulheres eleitas como membros titulares superou pela primeira vez o de homens. No último ano, 60% eram mulheres. Em meio a essa mudança, o total de mulheres titulares saltou de 15,6% para 21,7% em cinco anos. Um avanço, mas há muito a fazer.

Johanna foi a primeira vice-presidente mulher da ABC. Para mim, deveria ter sido também a primeira presidente. Sua história precisa ser ensinada como exemplo de que não há profissão de homens ou de mulheres. Precisamos de engenheiras, matemáticas, historiadoras, agrônomas. Meninas precisam saber, desde a pré-escola, que podem ocupar o lugar que quiserem. E a sociedade precisa incentivar isso.

No centenário de Johanna, como a primeira presidente da ABC após 105 anos, faço um convite à reflexão: o que mais podemos fazer, como sociedade, para acelerar a redução dessas desigualdades?

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