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O que a Folha pensa Rússia

Rússia faz eleição com democracia degradada

Mais uma vitória esperada de Putin, por grande margem, é um exemplo de manipulação do sistema para fins autoritários

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Vladimir Putin, presidente da Rússia - Gavriil Grigorov/Sputnik/AFP

A dúvida não é se Vladimir Putin vencerá a eleição russa em curso, mas se vai superar 80% dos votos. Em 2018, ele marcou 76,7%; a atual ocorre em meio a uma guerra, com aumento da repressão sobre a oposição e esforços do governo para ampliar o comparecimento à aprovação do autocrata.

O sufrágio será realizado durante três dias, de sexta (15) a domingo (17), e com a possibilidade de os cidadãos depositarem o voto online, que críticos apontam como passível de monitoramento e pressão por empregadores.

Apesar de ser um jogo de cartas marcadas, o pleito ainda servirá para dar pistas valiosas sobre a popularidade de Putin. Aqui, é preciso distinguir entre diferentes tipos de eleições manipuladas.

Ditadores árabes se especializaram em vitórias hiperbólicas. Em 2002, Saddam Hussein foi aprovado por 100% dos iraquianos. O presidente sírio Hafez al Assad (1971-2000) era mais modesto, nunca superou os 99%. Também em 2002, o presidente Zin El Abidin Ben Ali, da Tunísia, ficou com 99,5%.

É possível que, nesses casos, os votos nem sequer fossem contados, já que os resultados viriam prontos do gabinete presidencial.

Na Rússia, não há fraude tão escancarada. A influência indevida ocorre principalmente por meio de regras eleitorais enviesadas, que beneficiam sobremaneira o autocrata, propaganda oficial maciça, pressão via empregadores próximos ao governo e, em especial, controle sobre a oposição.

Putin elimina na origem qualquer candidato que possa fazer-lhe sombra ou apenas levantar problemas que não quer ver mencionados.

Ademais, a vida do russo médio melhorou substancialmente desde que ele assumiu o poder, em 2000, e foram contornadas sanções econômicas impostas ao país por causa da guerra na Ucrânia.

Ou seja, mesmo sem artimanhas eleitorais, o autocrata provavelmente venceria. Pesquisa do respeitado Instituto Levada de fevereiro indicou que Putin tem 86% de popularidade —ressalvando-se o risco de manifestar desaprovação a um líder de regime autoritário.

De todo modo, a situação do russo é diferente da de Nicolás Maduro, por exemplo. Se o venezuelano organizasse uma eleição limpa, a chance de derrota seria enorme.

Desde que o bolivarianismo foi derrotado nas eleições legislativas de 2015, todos os pleitos são manipulados no país, o que inclui a eleição do próprio Maduro em 2018 e a planejada para julho deste ano, da qual todos os candidatos competitivos da oposição foram excluídos.

A insistência, por vezes patética, de tiranos em simular banhos de votos para tentar legitimar seus governos diz algo sobre o valor do sistema democrático.

editoriais@grupofolha.com.br

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