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Magno Karl

A 'taxa das blusinhas' deve ser sancionada? NÃO

Prejuízo ao consumidor; enquanto isso, elite segue com isenção de até US$ 1.000 para compras no exterior

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Magno Karl

Cientista político, é diretor-executivo do Livres

A taxação de compras internacionais abaixo de US$ 50, conhecida como "taxa das blusinhas" e defendida pelo governo federal e setores da indústria, é um exemplo clássico de políticas públicas equivocadas para reanimar os empresários nacionais às custas dos seus clientes. Viciada em favores políticos, parte do nosso setor privado parece ter desistido de buscar a competitividade. No lugar de exigir aperfeiçoamento institucional e fiscal do país, contenta-se com migalhas.

É preocupante. A escolha por alívios imediatos ocorre em detrimento da preparação do país para o futuro. Se a tarifa contempla quem faz barulho, a legislação vira um obstáculo a ser transposto. Essa engenharia político-empresarial desincentiva empreendedores que geram valor para seus clientes e incentiva aqueles que se conectam com o poder. O nosso fracasso é remediado com as gordas transferências do rentismo.

Montagem dos logotipos de redes chinesas de comércio online - Edgar Su e Dado Ruvic/Reuters

Quando a política não entrega reformas institucionais que permitam florescer o empreendedorismo e a criatividade, ela cria problemas para oferecer soluções ilusórias. Recorrentes renovações de programas de incentivo, isenções setoriais e discursos nacionalistas mascaram o protecionismo aos campeões do lobby. É certo que alguém está ganhando. Mas o brasileiro médio perde, como consumidor e pagador de impostos.

Dados da Organização Mundial do Comércio mostram que o Brasil segue entre os países com tarifas mais elevadas para produtos não agrícolas. Nossa participação nas cadeias de comércio global é ínfima. De maquinários industriais a utilidades domésticas, nosso acesso à tecnologia é limitado, prejudicando produtores e consumidores.

A nova taxação agrava ainda mais esse cenário. O impacto é maior sobre as classes C e D, que dependem do ecommerce para acessar produtos muitas vezes inexistentes no mercado nacional ou oferecidos a preços exorbitantes. Enquanto isso, as classes altas continuam com isenção de até US$ 1.000 para as compras no exterior —mais uma evidência do caráter regressivo e injusto da medida.

A alegação de que a isenção fiscal para compras de baixo valor prejudica a indústria nacional não se sustenta. Nosso problema crônico é a falta de competitividade, um ambiente institucional hostil aos negócios. Políticos vêm e vão, a participação dos setores no PIB sobe e desce, mas os altos custos de produção e conformidade às regulamentações, infraestrutura deficiente e baixa produtividade seguem travando o nosso crescimento. Mais impostos não resolvem esses problemas.

Em vez de taxar as compras online, o Brasil deveria buscar alternativas que promovam a equidade e o acesso ao mercado para todos. Uma proposta seria manter a isenção de US$ 50, mas impor um limite anual de US$ 1.000 por CPF, valor que garantimos aos ricos que viajam internacionalmente. Outra opção é eliminar a distinção entre pessoas físicas e empresas, adotando um limite para compras isentas, minimizando o risco de fraudes e mantendo um equilíbrio entre arrecadação e acessibilidade para consumidores de classes mais baixas.

A taxação de compras online prejudica o consumidor, impede o desenvolvimento real da produção nacional e aprofunda desigualdades. Um retrocesso diante do mundo globalizado. É hora de abandonar as velhas práticas de política industrial e abraçar as oportunidades do mundo moderno. Precisamos de eficiência e competitividade para quem produz, e melhor preço e qualidade para quem consome.

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