Caso dos hackers atrasa apuração sobre WhatsApp na eleição, dizem investigadores

Operação que prendeu suspeitos de hackear autoridades avançou mais rápido e teve reforço de pessoal

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Eduardo Militão
Brasília | UOL

A apuração da Polícia Federal e do Ministério Público sobre uso ilegal de WhatsApp nas eleições de 2018 patina, segundo relatos dos próprios investigadores.

Na investigação sobre as campanhas do presidente Jair Bolsonaro (PSL) e do ex-candidato Fernando Haddad (PT), nenhuma busca ou quebra de sigilo foi solicitada pelas autoridades ou autorizada pela Justiça num inquérito eleitoral aberto há mais de oito meses.

Como comparação, na Operação Spoofing, que prendeu no último dia 23 quatro suspeitos de hackear autoridades, em menos de dois meses a PF conseguiu ordens judiciais para quebrar sigilos de comunicações e, com elas, fazer buscas e prisões.

Celulares usados em empresa para enviar mensagens de WhatsApp em massa
Celulares usados em empresa para enviar mensagens de WhatsApp em massa - Reprodução

Sob condição de anonimato, investigadores disseram ao UOL que o ritmo das apurações em relação à propaganda irregular nas eleições é mesmo "muito lento".

Na Spoofing, a análise da invasão de celulares de integrantes da Lava Jato e do ministro da Justiça, Sergio Moro, entre outros, contou com reforço de pessoal. Peritos de fora de Brasília foram chamados na operação e trabalharam numa sala especial.

Um dos investigadores consultados pelo UOL entende essa velocidade como a esperada para o caso das eleições.

Até agora, nenhum pedido formal de informações a aplicativos de mensagens trouxe algum dado relevante para descobrir quem movimentou —e a que preço— uma indústria de envio de boatos por WhatsApp, Telegram, Facebook, Instagram e Twitter.

Para um investigador ouvido pela reportagem, somente as quebras de sigilo e buscas vão trazer informações para identificar os autores dos disparos de mensagens, um possível crime cibernético e eleitoral.

Usar verba de empresas para fazer campanha negativa contra candidatos é proibido pela legislação.

Folha revelou em outubro do ano passado que empresários impulsionaram disparos por WhatsApp contra o PT durante a campanha eleitoral. A reportagem à época mostrava que a iniciativa incluía o uso de bases vendidas por agências de estratégia digital.

Em junho deste ano, reportagem da Folha mostrou que, segundo o empresário espanhol Luis Novoa, dono da Enviawhatsapps, empresas brasileiras compraram seu software para fazer disparos em massa de mensagens a favor de Bolsonaro no WhatsApp.

O PT pediu em 2018 buscas em empresas que fazem disparos em massa, mas policiais e promotores não fizeram nenhum pedido até o momento. À época, a Justiça negou a apreensão de documentos.

Um dos investigados é o proprietário das lojas Havan, Luciano Hang, empresário e apoiador de Bolsonaro. Ele nega irregularidades.

Nos últimos três meses, a PF tomou o depoimento do empresário. Hang disse à polícia que não pagou disparos em massa e afirmou que nem sequer sabe o que seria "impulsionamento de zap", contou o advogado Fábio Roberto de Souza.

Paralelamente à investigação, o Congresso instalou a CPI mista das fake news para apurar o uso das notícias falsas nas eleições. Parlamentares estudam usar a estrutura da comissão de inquérito para interrogar os presos na Operação Spoofing.

O senador Humberto Costa (PT-PE) deve integrar a comissão e afirma que o financiamento empresarial do impulsionamento de mensagens será apurado.

Para o petista, a lentidão da polícia se deve ao risco de resultar em um pedido de anulação da chapa que elegeu Bolsonaro. "Há uma pressão para que essa investigação não avance", avaliou.

O presidente da Associação dos Delegados da PF, Edivandir Paiva, disse que a investigação da invasão de celulares andou rápido porque foi priorizada. Ele entende que a Spoofing foi tratada assim por se tratar de um caso "gravíssimo", e não pelo fato de Moro ser um dos personagens.

Paiva usou grandes operações anticorrupção como exemplo. "A Lava Jato, a Zelotes, a Acrônimo têm uma alocação maior de recursos."

"Com 10.500 policiais e um terço do efetivo vago, você só consegue fazer alguma coisa priorizando, escolhendo o que é mais importante. Não dá para negar que essa investigação é importante", diz Paiva.

O presidente da associação dos delegados afirmou ainda que não é possível comprovar "com tanta facilidade" o pagamento por impulsionamento de notícias falsas nas eleições.

"De qualquer maneira, tem que ver com o chefe da investigação o que ocorreu, mas a gente só vai saber isso quando o inquérito for relatado [concluído]."

O delegado entende que a investigação sobre as fake news também tem sua importância. "Agora, só falamos em tese. Esse assunto das invasões é um dos inquéritos mais importantes porque os fatos são gravíssimos. O outro [fake news] também é importante, mas tem que ver por que não há nenhum pedido [de buscas e quebras de sigilo], tem que avaliar a investigação em si para saber."

Fontes da Polícia Federal ouvidas pelo UOL dizem que maioria das investigações criminais sobre fake news nas eleições está arquivada ou prestes a ser jogada na lixeira.

Afirmaram que se trata de uma orientação do próprio STF (Supremo Tribunal Federal). Hoje, existiriam "pouquíssimas" apurações sobre o tema na corporação, como o disparo em massa de mensagens noticiado no segundo turno da disputa presidencial.

Procurada, a assessoria da PF diz que não comenta investigações. A assessoria do Ministério Público do Distrito Federal, que acompanha o caso, não prestou esclarecimentos.

A advogada de Bolsonaro, Karina Kufa, não respondeu aos pedidos de contato da reportagem.

O advogado de Haddad, Eugênio Aragão, disse que não se manifestaria.

 
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