Wajngarten nega omissão e mentira e diz não ter recebido pedido para encerrar contratos

O secretário omitiu informações sobre empresa da qual é sócio da Comissão de Ética Pública

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Brasília

O chefe da Secom (Secretaria de Comunicação) de Jair Bolsonaro, Fabio Wanjgarten, afirmou que, ao assumir o cargo público, não houve pedido para que ele encerrasse contratos de sua companhia com empresas que prestam serviços ao governo federal e que o faria caso tivesse sido demandado. 
 
A declaração foi dada em entrevista à revista Veja. "Se isso tivesse sido pedido, eu teria feito", afirmou. 

A Folha revelou que Wajngarten é sócio, com 95% das cotas, da FW Comunicação, que faz pesquisas de mídia e recebe dinheiro de TVs (como Record e Band) e agências contratadas pela própria Secom, ministérios e estatais do governo Jair Bolsonaro.

A legislação que trata do tema proíbe integrantes da cúpula do governo de manter negócios com pessoas físicas ou jurídicas que possam ser afetadas por suas decisões. Entre as penalidades previstas está a demissão do agente público. A prática também pode configurar ato de improbidade administrativa, se demonstrado o benefício indevido.

"Tudo foi comunicado quando da nomeação aos órgãos de controle da Presidência da República. Não há conflito de interesses", disse.

O secretário, no entanto, omitiu da Comissão de Ética Pública a informação de que a companhia recebe, por meio de uma empresa da qual é sócio, dinheiro de emissoras de TV e de agências de publicidade contratadas pela própria secretaria, ministérios e estatais. 

Ao longo de um questionário de oito páginas, assinado por ele em 14 de maio e obtido pela Folha, ele não informou à comissão o ramo de atuação das companhias dele e de familiares, bem como os negócios mantidos por elas antes e no momento em que ocupou a função pública.

Documento traz assinalados a opção "não" para as seguintes perguntas: "exerceu atividade econômicas ou profissionais, públicas ou privadas, nos 12 meses anteriores à ocupação do cargo, em área ou matéria afins às atribuições públicas, que possam gerar conflito de interesses" e "nos 12 meses anteriores à posse no cargo, recebeu suporte financeiro de entidades privadas que desenvolvem atividade em área ou matéria afins às atribuições públicas, ou firmou acordos ou contratos com estas para recebimentos futuros, que possam gerar conflito de interesses"
Trecho de documento preenchido por Fabio Wajngarten e encaminhado à Comissão de Ética Pública da Presidência - Reprodução

A lei de conflito de interesses (12.813/2013) obriga os integrantes do alto escalão do governo a detalharem dados patrimoniais e societários, assim como as empreitadas empresariais e profissionais deles próprios e de seus familiares até o terceiro grau.

O objetivo é o de prevenir eventuais irregularidades. É vedado aos agentes públicos manter negócios com pessoas físicas ou jurídicas que possam ser afetadas por suas decisões.

"Se surgirem novas demandas do presidente da República, elas serão cumpridas imediatamente", disse. O secretário negou novamente haver conflito de interesses. "Os contratos dos dois lados foram assinados muito antes da minha chegada. Nenhum desses contratos teve reajuste de preços ou majoração de valor. Esse é o coração de quão mentirosa é a acusação", disse. 

Wajngarten negou que tenha cometido irregularidade em não declarar que, nos 12 meses anteriores, ele ou parentes seus exercessem atividades em áreas relacionadas às suas atribuições na secretaria, situação que suscitaria conflito de interesses.

"Não houve nem omissão nem mentira como disseram. Minha empresa não tem negócios com o governo. Essa confusão toda decorre de junção de interesses comerciais e políticos", disse. 

À Veja o secretário afirmou que considera que as revelações surgiram porque ele é inovador e ameaça o status quo. "Não tenho provas, mas desconfio que a origem de tudo vem daí", disse. "Agora que a Polícia Federal vai investigar o caso, os fatos serão devidamente esclarecidos." 

Ele manteve a condição de sócio majoritário da empresa e os contratos vigentes mesmo após assumir o cargo, em abril do ano passado. A mãe, Clara, tem os outros 5% de participação.

Fabio Wajngarten, chefe da Secom, e Jair Bolsonaro durante cerimônia no Palácio da Alvorada, em Brasília - Ueslei Marcelino/Reuters - 19.nov.2019

A Secom é a responsável pela distribuição da verba de propaganda do Planalto e também por ditar as regras para as contas dos demais órgãos federais. No ano passado, gastou R$ 197 milhões em campanhas.

O presidente Jair Bolsonaro saiu em defesa de seu secretário. Em 16 de janeiro, por exemplo, ele afirmou a jornalistas que Wajngarten permanece no cargo. "Se foi ilegal, a gente vê lá na frente. Mas, pelo que vi até agora, está tudo legal, vai continuar. Excelente profissional. Se fosse um porcaria, igual alguns que tem por aí, ninguém estaria criticando ele", disse.

No final de janeiro, o Ministério Público Federal em Brasília pediu à Polícia Federal a abertura de inquérito criminal para investigar o caso revelado pela Folha. Wajngarten, que não tem foro especial no Supremo Tribunal Federal, também é alvo de processo administrativo no TCU (Tribunal de Contas da União).

Na entrevista, o secretário também defendeu a publicação que a Secom fez atacando a cineasta Petra Costa, diretora de "Democracia em Vertigem", documentário indicado ao Oscar. 

"O problema, na verdade, é uma cineasta declarar fora do Brasil um monte de mentiras. É papel da comunicação do governo proteger e promover o Brasil", disse ele, que afirma na entrevista que não assistiu ao documentário.

ENTENDA O CASO

Qual a polêmica envolvendo o secretário de Comunicação, Fabio Wajngarten? 
Como mostrou a Folha, Wajngarten recebe, por meio de uma empresa da qual é sócio, dinheiro de emissoras de TV e de agências de publicidade contratadas pela própria secretaria, ministérios e estatais do governo Jair Bolsonaro. 

Desde que assumiu o cargo, o secretário teve pelo menos 67 reuniões com representantes de clientes e ex-clientes de sua empresa. Parte desses encontros exigiu viagens, e 20 foram custeadas com dinheiro público. Além disso, a agência Artplan, cliente da firma de Wajngarten, teve aumento de 36% nas verbas repassadas pela Secom desde que ele assumiu a secretaria.

Wajngarten acumula a direção da empresa com a chefia da Secretaria? 
Formalmente, não. Dias antes de assumir o posto no governo, ele se afastou da direção da FW, mudou o contrato social e nomeou para gerenciá-la, em seu lugar, Fabio Liberman, seu amigo de infância. Porém manteve-se como sócio, com 95% das cotas.

O que Wajngarten afirmou à Comissão de Ética Pública da Presidência quando ingressou no governo? 
Em documento enviado em maio de 2019, o secretário negou que, nos 12 meses anteriores, ele ou parentes seus exercessem atividades em áreas relacionadas às suas atribuições na secretaria, situação que suscitaria conflito de interesses. Também disse que nem ele nem seus parentes firmaram acordos ou contratos com empresas que desenvolvem atividades em área ligada às suas funções na Secom. 

Por que essas informações são contraditórias?
A FW, da qual Wajngarten é acionista majoritário, tinha contratos havia alguns anos com Record, Band e agências que recebem recursos do governo e da própria Secom. Quando ele assumiu o cargo, a firma tinha contratos em vigor com essas empresas e ele tinha o direito a receber, como sócio, dividendos durante o exercício da função pública. Além disso, sua mulher é sócia de duas empresas do setor de publicidade, entre elas uma agência, e sua mãe é sócia da FW (ela tem 5% das cotas).

Por que o caso levanta questionamentos? 
A lei de conflito de interesses (12.813/2013) obriga os integrantes do alto escalão do governo a detalharem dados patrimoniais e societários, assim como suas empreitadas empresariais e profissionais e a de seus familiares até o terceiro grau. É vedado aos agentes públicos manter negócios com pessoas físicas ou jurídicas que possam ser afetadas por suas decisões. Quem pratica tais atos está sujeito à demissão e a responder processo por improbidade administrativa.

O que diz Wajngarten? 
Ele negou que haja conflito de interesses ou ilegalidades na sua atuação e disse que não está na Secom para fazer negócios. Em nota, a secretaria disse que não houve omissão de informações à Comissão de Ética Pública e que Wajngarten “cumpriu rigorosamente o que a legislação determina".

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