Bolsonaro demite Marcelo Álvaro Antônio, ministro do Turismo e pivô dos laranjas do PSL

Troca já estava decidida, mas presidente antecipou movimento após briga de ministro com chefe da Secretaria de Governo

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Brasília

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) demitiu nesta quarta-feira (9) o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio. Ele foi informado da decisão pelo próprio presidente, no início da tarde, em audiência no Palácio do Planalto.

Para substituí-lo, Bolsonaro escolheu o presidente da Embratur, Gilson Machado.

O Planalto não divulgou qualquer nota sobre a saída de Álvaro Antônio, que só foi confirmada pelo presidente no final da tarde.

"Ele [Gilson Machado] é um cara muito competente nessa área. O outro [Álvaro Antônio] estava fazendo um bom trabalho também, mas [teve] problema aí", disse Bolsonaro a simpatizantes em frente ao Palácio da Alvorada. A fala do mandatário foi transmitida por um site bolsonarista.

Filho do chefe do Executivo, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) publicou no Twitter uma mensagem parabenizando Machado.

"Desejo boa sorte a Gilson Machado, que vinha fazendo bom trabalho como presidente da Embratur e agora se torna novo ministro do Turismo. Que Deus o ilumine nessa nova jornada", escreveu.

O novo ministro, no entanto, deve assumir a função de forma temporária, até a próxima reforma ministerial, programada para o início do ano que vem.

Como mostrou a Folha no último domingo (6), Bolsonaro já havia definido que haveria mudança no comando da pasta do Turismo.

A ideia do presidente é entregar o ministério para um nome indicado pelo centrão, bloco de partidos de centro e de direita que formam a base aliada do governo no Congresso.

Aliados de Bolsonaro no Legislativo argumentam que após as eleições para as presidências da Câmara e do Senado a correlação de forças políticas será outra e que o presidente precisará fazer acomodações na Esplanada dos Ministérios. Além do Turismo, almejam indicar também o novo presidente da Embratur.

A decisão de demitir Álvaro Antônio foi antecipada, no entanto, após a situação do ex-ministro ter se tornado insustentável nesta terça-feira (8).

Em mensagem no grupo de WhatsApp da equipe ministerial, Álvaro Antônio acusou o general Luiz Eduardo Ramos, ministro da Secretaria de Governo e amigo de Bolsonaro desde os tempos de Exército, de estar negociando sua cadeira no Congresso.

No texto, ao qual a Folha teve acesso, Álvaro Antônio chamou Ramos de "traíra" e disse que o general "de forma covarde" ataca "sem parar" os apoiadores conservadores do presidente.

Ele ainda ressaltou que Ramos deveria ter aprendido que não se abandona um "companheiro de guerra aos inimigos" e que não se pode "atirar na cabeça de um aliado".

Após o episódio, segundo relatos feitos à Folha, Ramos se queixou com Bolsonaro, que concordou que Álvaro Antônio se excedeu.

Pivô do esquema de candidaturas laranjas do PSL em Minas Gerais, caso revelado pela Folha, Álvaro Antônio foi indiciado pela Polícia Federal sob suspeita dos crimes de falsidade ideológica eleitoral, apropriação indébita de recurso eleitoral e associação criminosa —com pena de cinco, seis e três anos de cadeia, respectivamente.

O agora ex-ministro do Turismo também é alvo de denúncia pelo Ministério Público de Minas Gerais.

Uma série de reportagens da Folha desde 2019 mostrou que Álvaro Antônio patrocinou em Minas Gerais um esquema de candidaturas de mulheres que receberam expressivos recursos públicos do PSL, sem sinal de que tenham feito campanha efetiva.

Como os partidos são obrigados a destinar a verba pública na proporção das candidatas que lança, em um mínimo de 30%, essas postulantes de fachada eram usadas para desvio do dinheiro para outros candidatos.

Apesar de figurar entre os 20 candidatos do PSL no país que mais receberam dinheiro público, quatro mulheres de Minas Gerais tiveram desempenho insignificante. Juntas, receberam pouco mais de 2.000 votos.

Dos R$ 279 mil repassados pelo PSL, ao menos R$ 85 mil foram parar oficialmente na conta de quatro empresas de assessores, parentes ou sócios de assessores de Álvaro Antônio.

Ele exercia o mandato de deputado federal em 2018 e comandava o PSL de Minas, responsável por definir os candidatos no estado e o recurso público que cada um receberia.

A PF chegou a fazer busca em gráficas e na sede do PSL de Minas, não tendo encontrado na contabilidade e demais documentos das empresas provas de que elas de fato gastaram o dinheiro no material de campanha que declararam ter usado.

Várias candidatas do partido e uma deputada eleita, Alê Silva (PSL-MG), testemunharam às autoridades confirmando a existência do esquema.

Mais de um ano após o indiciamento pela PF e a denúncia pelo Ministério Público, a Justiça ainda não definiu se transforma Álvaro Antônio em réu.

Bolsonaro sempre se recusou a demiti-lo por causa do escândalo dos laranjas do PSL. No início, o presidente dizia que não comentaria o caso "porque esse é um assunto que deve estar restrito ao próprio ministro".

Após a prisão de três aliados de Álvaro Antônio, ainda em 2019, Bolsonaro disse durante uma viagem ao Japão que o ministro seria mantido no cargo até conversarem na volta ao Brasil.

"Por enquanto não tem nada, uma vez tendo, como conversado com [Sergio] Moro [então ministro da Justiça] lá atrás, qualquer coisa mais robusta contra uma ação irregular de um ministro, as providências vão ser tomadas da nossa parte."

Depois do retorno ao Brasil, o porta-voz da Presidência afirmou: "Ele [presidente] demonstrou o reconhecimento ao trabalho que vem sendo desenvolvido pelo ministro. Ele aguarda as investigações da Polícia Federal para, após analisá-las, tomar as decisões que sejam necessárias, de manutenção ou não manutenção".

Em outubro de 2019, o ministro foi indiciado pela Polícia Federal e denunciado pelo Ministério Público mineiro sob acusação de envolvimento no caso dos laranjas. A investigação concluiu que Álvaro Antônio comandou o esquema. Bolsonaro ainda assim manteve o aliado no cargo.

O caso dos laranjas saiu do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais e está atualmente no STF (Supremo Tribunal Federal), sob a alçada do ministro Gilmar Mendes, que analisa pedido da defesa para anulação de toda a operação.

O argumento principal é o de que Álvaro Antônio foi investigado de forma ilegal pelas autoridades mineiras, já que tem foro especial.

Em fevereiro de 2019, Álvaro Antônio já havia recorrido ao STF para tentar barrar as investigações de Minas Gerais.

Na ocasião, Luiz Fux, hoje presidente da corte, negou o pedido afirmando que a jurisprudência do Supremo diz que supostos crimes eleitorais cometidos por candidatos à reeleição, como era o caso de Álvaro Antônio, não devem ser investigados na corte.

Marcelo Álvaro Antônio sempre negou as acusações e, em diversas manifestações, acusou adversários internos da legenda e a Folha de promover uma perseguição político-partidária contra ele.

Ele afirma que a distribuição do fundo partidário do PSL de Minas Gerais cumpriu rigorosamente o que determina a lei e que confia na Justiça.

A repercussão do caso do laranjal do PSL resultou na demissão do coordenador da campanha de Bolsonaro, Gustavo Bebianno, do cargo de ministro da Secretaria-Geral da Presidência. Ele presidiu o PSL nacionalmente em 2018.

Na época da divulgação do caso, ele entrou em discussão pública com Bolsonaro e um de seus filhos, o vereador Carlos Bolsonaro, segundo quem o então ministro havia mentido ao dizer que conversara com Bolsonaro três vezes na véspera, negando a turbulência política causada pelas denúncias das candidaturas laranjas. Bebianno morreu em março deste ano, vítima de infarto.

Nas eleições municipais deste ano, mais de um terço dos candidatos que o PSL lançou para disputar uma vaga na Câmara de Vereadores de Belo Horizonte divulgou uma nota em que afirma que o partido está se envolvendo, mais uma vez, "em escândalo de repasse de verbas públicas".

O motivo da revolta de 24 candidatos é o repasse, pela sigla, de R$ 690 mil do fundo eleitoral para a candidata a vereadora Janaina Cardoso (PSL), ex-esposa de Álvaro Antônio, que, apesar de não ser mais formalmente presidente do diretório mineiro da sigla, mantêm o controle político.

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