Descrição de chapéu Eleições 2022

Em meio a insultos, DEM perde Rodrigo Maia e Rodrigo Garcia, vice de Doria que vai para o PSDB

Filiação do vice-governador de São Paulo nesta sexta dificulta candidatura de Alckmin

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São Paulo

O vice-governador de São Paulo, Rodrigo Garcia, 47, deixou o DEM e assinou sua ficha de filiação ao PSDB nesta sexta-feira (14), em um evento presencial num hotel da zona sul da capital, com a presença dos principais líderes do PSDB.

A ida de Garcia ao partido —movimento costurado pelo governador João Doria (PSDB), que pretende lançar o vice à sua sucessão no ano que vem e ser candidato a presidente— é um revés para Geraldo Alckmin, que também almeja disputar o Governo de São Paulo pelo PSDB. O ex-governador não compareceu.

Bruno Araújo, Rodrigo Garcia e João Doria em evento de filiação de Garcia, vice-governador de SP, ao PSDB - Zanone Fraissat/Folhapress

Segundo aliados de Alckmin, ele conversa com outros partidos, como PSD, PSB, Podemos e PSL, que têm interesse em lançá-lo candidato ao Palácio dos Bandeirantes e estuda se deve deixar ou não o PSDB.

Outra consequência imediata da migração foi a crítica pública do presidente do DEM, ACM Neto, a Doria. A filiação, tuitou ACM nesta sexta, "é fruto de uma inexplicável imposição estabelecida pelo governador de São Paulo, João Doria, cuja inabilidade política tem lhe rendido altíssima rejeição e afastado seus aliados".

ACM afirmou à coluna Painel que "o DEM não tem nenhuma disposição de discutir 2022 com João Doria".

O DEM vive uma crise com as desfiliações também do prefeito do Rio, Eduardo Paes (que vai para o PSD), e do deputado Rodrigo Maia (RJ) —que solicitou a desfiliação, nesta sexta, ao Tribunal Superior Eleitoral.

Maia chamou ACM de oportunista após a crítica do presidente do DEM a Doria. Os dois romperam desde que o DEM recuou no apoio a Baleia Rossi (MDB-SP), candidato de Maia à presidência da Câmara, e se alinhou a Arthur Lira (PP-AL), candidato de Jair Bolsonaro.

O ex-presidente da Câmara disse ainda, pelo Instargram, que ACM Neto se aliou aos bolsonaristas, que não tem caráter e que só lhe resta ser candidato a vice de Bolsonaro.

Doria respondeu em entrevista à imprensa que "não era hora de ressentimentos, mas de compreensão".

"​Garcia não recebeu nenhuma imposição de nenhuma ordem, de nenhuma espécie para ingressar no PSDB. Exatamente pela nossa capacidade agregadora ele veio para o PSDB somar forças", disse.

O governador ressaltou que o vice não fez críticas ao DEM e disse manter o respeito por ACM Neto e perdoá-lo.

"Compreendo a reação do presidente nacional do DEM, o perdoo por essa posição, mas nós aqui, e tenho certeza que ele também, muito em breve, compreenderá o valor da união, da soma e da agregação para encontrarmos o melhor caminho para o Brasil. Divididos, não chegaremos a nenhuma posição que dignifique nossos partidos."

O ato reuniu cerca de cem pessoas e, devido à pandemia, teve participação de tucanos também pela plataforma Zoom. As cadeiras foram colocadas de modo espaçado e os presentes usavam máscara —ainda assim, houve rodinhas de conversa, com cumprimentos e abraços entre políticos. ​

O evento de filiação do vice-governador Rodrigo Garcia ao PSDB - Zanone Fraissat/Folhapress

Em seu discurso, Garcia relembrou sua biografia e agradeceu Alckmin, momento em que foi aplaudido.

"Eu queria fazer um registro especial ao Geraldo Alckmin, que foi alguém importante para as oportunidades que eu tive. [...] Ter gratidão é um exercício bom de simplicidade e humildade, muito obrigado, Geraldo."

Ao deixar o DEM após 27 anos, ele afirmou ter respondido a uma convocação do PSDB e se disse político por acreditar "na política como instrumento de transformação".

"Não estou sentido que estou fazendo uma mudança, mas uma migração. PSDB e DEM estiveram juntos a vida inteira. [...] Essa migração se torna muito natural. [...] Não estou mudando de lado, de território na política", disse Garcia.

O vice-governador afirmou ainda que, no PSDB, continuará combatendo o negacionismo e o populismo e exaltou a vacina como a principal realização do governo.

​Doria, que busca ser candidato ao Planalto por meio de prévias no PSDB, afirmou que é preciso "respeitar a experiência, mas inovar com os mais jovens", em referência direta a Garcia e velada a Alckmin.

"Respeitar os que têm cabelos brancos, experiência, vivência. [...] Pessoas com mais idade não devem ser descartadas e muito menos desrespeitadas. Devem ser convidadas a dialogar, a participar, a oferecer suas experiências, mas com a presença dos mais jovens, como você, Rodrigo", disse.

"Sem demérito e nenhum desrespeito ao DEM. [...] Mas viva a inovação, transformação, viva a inovação, viva Rodrigo no nosso PSDB", completou.

Doria, que defende um modelo de prévias com o mesmo peso de votos a todos os filiados, o que lhe favorece, agradeceu os militantes do partido e deu esse recado ao falar de democracia. "Todo voto é um voto. Não há privilégio do mais sabido, do mais rico, do mais poderoso, de quem tem a biografia maior do que outro que não tem. Todos são iguais perante a democracia."

Adversários internos, como o governador Eduardo Leite, defendem peso federativo aos votos, já que São Paulo tem mais filiados.

Doria afirmou ainda que todos os tucanos que foram governadores "fizeram o melhor". "A todos que foram governadores desse estado do PSDB, nosso reconhecimento e nossa homenagem", completou.

Em dado momento, afirmou: "É assim que continuarão a fazer os tucanos, juntos, solidários, coletivos, sem individualismo, sem arrogância, sem estresse".

Ele também criticou o governo federal em relação à pandemia e exaltou a vacina. "Para defender a vida, a existência, nós enfrentamos o que for e quem for", disse.

Questionado sobre disputar prévias contra Alckmin e concorrer ao governo, Garcia respondeu a jornalistas que "em ano par se discute eleição". "Vou me submeter às regras que o partido determinar para as candidaturas de 2022, que ainda não estão colocadas", completou.

Doria defendeu a realização de prévias no PSDB, mas focou seus comentários no nível nacional e não falou especificamente em prévias estaduais. Ele defendeu a realização da votação em outubro, e Araújo confirmou que a eleição interna tende a ocorrer neste ano.

Estavam presentes na cerimônia, além de Doria, o presidente do PSDB, Bruno Araújo; o tesoureiro do PSDB, Cesar Gontijo; o ex-senador José Aníbal (SP); o presidente da Assembleia de SP; Carlão Pignatari; o prefeito de São Bernardo do Campo, Orlando Morando; deputados federais e estaduais e os presidentes do PSDB estadual, Marco Vinholi, e municipal, Fernando Alfredo.

O prefeito de São Paulo, Bruno Covas (PSDB), que está afastado do cargo para tratamento de câncer, não compareceu, mas recebeu a visita de Garcia no hospital na quinta-feira (13) e assinou sua ficha de filiação.

"O momento do Brasil demanda de todos nós espírito público, unidade, agregação. Somar e não dividir. Não deixar nenhum interesse pessoal sobrepujar o interesse coletivo. Receber em nossos quadros o vice-governador Rodrigo Garcia sinaliza exatamente isso. [...] Foi aliado do meu avô, foi aliado de Geraldo Alckmin, foi aliado de Serra. [...] Nada mais natural do que se juntar a nós nessa caminhada", afirmou Covas em discurso enviado ao evento.

Vinholi afirmou que o PSDB fez uma convocação a Garcia e ressaltou a renovação e a união do partido —espécie de resposta velada ao racha com Alckmin. "O Rodrigo entra no PSDB pela porta da frente", disse Alfredo.

Participaram ainda políticos do PSL, Solidariedade, MDB e PP. Em isolamento, os senadores paulistas José Serra e Mara Gabrilli e o ex-senador Aloysio Nunes enviaram representantes ao evento.

Aníbal e Covas fizeram críticas ao governo Bolsonaro em suas falas. O prefeito afirmou que o presidente "vem desdenhando da vida e da saúde dos brasileiros". O ato teve mais de 20 discursos de tucanos.

Para demonstrar que Garcia é bem-vindo no PSDB, houve uma reunião, na quarta (12), entre o vice e dirigentes regionais do partido da capital e, na quinta, um jantar com a cúpula tucana do estado.

“Diante de uma crise de quadros no país, a chegada de Garcia é uma grande aquisição. É raro alguém que tenha a experiência no Executivo em distintas pastas e a qualidade política que ele tem”, afirmou Araújo à Folha. ​Seu discurso foi repleto de elogios a Garcia e Doria.

De acordo com tucanos próximos a Alckmin, o ex-governador ficou sentido com o apoio de Covas a Garcia. O prefeito era tido como o fiel da balança na disputa interna entre o vice e o ex-governador.

Garcia fez referência à ficha assinada por Covas em sua fala. "Eu não diria que era isso que faltava, mas era isso que eu esperava. Para, não só com o pé direito, mas com corpo e alma, ser o mais novo tucano de São Paulo e do Brasil", disse.

Aliados de Alckmin defendem que o partido realize, então, prévias entre ele e Garcia. A mais de um ano antes da eleição, o cenário, contudo, é incerto. Doria já admitiu, por exemplo, concorrer à reeleição.

O governador marcou 3% de intenções de votos na pesquisa Datafolha divulgada na quarta-feira —atrás de Lula (PT, com 41%); Bolsonaro (sem partido, com 23%); Sergio Moro (sem partido, com 7%); Ciro Gomes (PDT, com 6%) e Luciano Huck (sem partido, com 4%).

"Pesquisa com essa antecedência não desanima, pelo contrário", disse Doria a jornalistas no evento.

O principal plano de Doria ainda é deixar o governo até abril para concorrer ao Planalto. Garcia assumiria e concorreria à reeleição em 2022. Caso não seja candidato a presidente nem a reeleição, Doria pode abrir caminho para que Garcia assuma o Palácio dos Bandeirantes ainda em 2022 ou pode completar o mandato e lança-lo à sucessão.

De qualquer forma, a filiação de Garcia é vista entre os tucanos como uma forma de Doria barrar a candidatura de Alckmin para viabilizar seu projeto de poder. O governador sugere que Alckmin seja candidato a senador, mas José Serra (SP) pretende concorrer à reeleição.

Para Doria, considerando sua potencial candidatura nacional, é importante manter em São Paulo um palanque que lhe seja fiel, como seria a candidatura de Garcia. As relações entre Alckmin e Doria estão estremecidas, e portanto há dúvida da disposição do ex-governador em fazer campanha em São Paulo para que o atual chegue ao Planalto.

Entre aliados do ex-governador, essa movimentação é descrita como uma precipitação e uma traição –considerando que Alckmin lançou Doria na vida pública e teve Garcia como secretário por dois mandatos. Críticos de Doria dizem que, mais uma vez, sua inabilidade política deixou feridas no partido.

No entanto, também há entre tucanos a opinião de que Alckmin não deveria pleitear mais uma vez o cargo que já ocupou por quatro mandatos e que é preciso buscar renovação.

As expectativas estão voltadas para a decisão do ex-governador. Parte dos aliados defende que ele não deixe o partido do qual é fundador e afirmam ser difícil encerrar um casamento de mais de 30 anos. Além disso, ponderam que sua eventual candidatura em outra sigla teria que enfrentar Garcia, que terá o apoio da máquina da administração.

Outros tucanos, também ouvidos pela reportagem de forma reservada, pregam uma reação de Alckmin e consideram que houve desconsideração não só com sua história, mas com seu potencial eleitoral, dado que ele aparece bem em pesquisas no estado.

Alckmin mantém conversas com uma série de partidos, como mostrou a Folha. Uma opção é aderir ao PSD, de Gilberto Kassab, ou ao PSB, de Márcio França, que foi seu vice, e repetir a chapa. O DEM também demonstrou interesse em filiar o ex-governador.

A ala estadual do partido em São Paulo mantém o apoio a Doria e Garcia, apesar da expectativa frustrada de que o atual governador apoiasse seu vice em uma candidatura ao Bandeirantes lançada pelo DEM.

Desde 2002, o DEM (antigo PFL) compõe a coligação vitoriosa do PSDB ao Governo de São Paulo. A aliança nacional entre os dois partidos vem desde 1994.

Como o presidente do DEM em São Paulo, deputado federal Alexandre Leite, já disse à Folha, Garcia, ao migrar, faz “um sacrifício que merece respeito”. “Garcia está indo cumprir uma missão para o DEM e pessoalmente para o Doria, resolver um problema de composição do Doria, que, se não for resolvido, vai prejudicar o DEM”, afirmou.

Já no nível nacional, houve ruptura. A manifestação de ACM Neto pelo Twitter foi dura.

"A postura desagregadora do governador de São Paulo amplia o seu isolamento político, e reforça a percepção do seu despreparo para liderar um projeto nacional. [...] Não é hora de dividir, mas de agregar. O Democratas defende a união de forças, e que se deixem os interesses pessoais de lado", escreveu.

"Certos de que o PSDB possui lideranças e quadros nacionais que são capazes de colocar os objetivos comuns e os sonhos para o futuro do Brasil à frente de projetos pessoais, o Democratas espera preservar a longa história de parcerias construída com o partido", completou.

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