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Bolsonaro muda discurso sobre fundão eleitoral e sinaliza apoio a R$ 4 bi, mas não explica operação

Presidente diz a apoiadores que deve vetar 'excesso' e cita crime de responsabilidade

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Brasília

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) afirmou nesta segunda-feira (26) que deve vetar apenas um "extra" de R$ 2 bilhões do fundão eleitoral, sinalizou aceitar uma quantia próxima de R$ 4 bilhões, mas não explicou como pretende realizar a operação.

Em conversa com apoiadores em frente ao Palácio da Alvorada, um grupo de simpatizantes parabenizou o mandatário pelo anúncio do veto ao fundo de R$ 5,7 bilhões. O montante —aprovado pelo Congresso Nacional— deve ser destinado para o financiamento de campanhas eleitorais no ano que vem.

"Deixar claro uma coisa. Vai ser vetado o excesso do que a lei garante. A lei [...] quase R$ 4 bilhões o fundo, o extra de R$ 2 bilhões vai ser vetado. Se eu vetar o que está na lei, eu estou incurso em crime de responsabilidade. Espero não apanhar do pessoal aí como sempre", disse Bolsonaro, em conversa com apoiadores.

Na semana passada, em rede social, Bolsonaro escreveu: "Defendemos, acima de tudo, a harmonia entre os Poderes, bem como a sua autonomia. É partindo deste princípio que jogamos, desde o início, dentro das quatro linhas da Constituição Federal. Dito isso, em respeito ao povo brasileiro, vetarei o aumento do fundão eleitoral", afirmou.

Antes, em entrevista à rádio Itatiaia, Bolsonaro indicou uma correção pela inflação —o montante aprovado pelo Congresso é quase o triplo do anterior. "Diz na lei [de criação do fundo] que a cada eleição o valor tem que ser corrigido levando-se em conta a inflação. E eu tenho que cumprir a lei."

No final de 2019, poucas horas depois de sinalizar que vetaria o fundo eleitoral de R$ 2 bilhões para 2020, Bolsonaro recuou e acabou dando aval, argumentando que, do contrário, poderia ser alvo de um processo de impeachment.

Apesar da fala desta segunda-feira a apoiadores, não está claro como Bolsonaro poderia vetar apenas R$ 2 bilhões do que foi votado pelo Legislativo.

A previsão orçamentária foi incluída na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e estabelece que, para o pleito de 2022, o valor do fundão deve ser de ao menos R$ 5,7 bilhões.

Dessa forma, de acordo com técnicos ouvidos pela Folha, o presidente tem a opção de vetar integralmente o montante ou sancioná-lo.

Eventual veto de Bolsonaro ao fundão eleitoral tem potencial de provocar desgaste na relação do presidente com o centrão, que é a base de sustentação do governo no Congresso.

Nos últimos dias, porém, Bolsonaro selou uma aproximação ainda maior com o centrão ao anunciar a escolhda do senador Ciro Nogueira (PP-PI), um dos líderes do bloco, para comandar a Casa Civil.

O presidente se reuniria nesta segunda com Ciro Nogueira para oficializar a mudança, mas o encontro foi adiado sob a justificativa de atraso no voo em que o senador retornaria ao Brasil.

Contrários ao veto, congressistas afirmaram à equipe econômica que o valor de R$ 5,7 bilhões seria financiado com emendas de bancada —recursos reservados no Orçamento para que o grupo de deputados e senadores de cada estado decida em qual obra ou projeto o dinheiro será aplicado.

Segundo técnicos do Congresso que analisaram o texto aprovado, apenas cerca de R$ 4,9 bilhões desse total sairia das emendas de bancada. Apesar de esse dinheiro ser destinado a critério das bancadas, geralmente os recursos são investidos em melhorias para a população nos estados.
Diante da resistência ao fundão de R$ 5,7 bilhões, uma proposta em discussão por integrantes da Câmara é reduzir as despesas da Justiça Eleitoral, que tem um orçamento de quase R$ 10 bilhões por ano. Isso abriria espaço no Orçamento para ampliar a verba das campanhas.
No entanto, a maior fatia do gasto da Justiça Eleitoral é com servidores. Além disso, quase R$ 1 bilhão desse total se refere ao fundo partidário.
O fundo partidário transfere todos os anos recursos para a manutenção e operação dos partidos políticos. Em anos eleitorais, além do dinheiro do fundo partidário, as siglas recebem o fundo eleitoral para bancar as campanhas.
Bolsonaro tem algumas alternativas para cumprir sua promessa de vetar o fundão.

Pode cancelar os R$ 5,7 bilhões e enviar uma proposta de alteração da LDO com um valor menor. Ele também pode, depois do veto, encaminhar ao Congresso uma Lei Orçamentária com uma quantia intermediária.

A verba para o fundão chancelada pelos congressistas representa quase o triplo do que foi usado no pleito municipal de 2020 (R$ 2 bilhões) e nas eleições gerais de 2018 (R$ 1,7 bilhão).

Na semana passada, o mandatário anunciou que vetaria o dispositivo. O Congresso tem a prerrogativa de derrubar a decisão do presidente.

"Neste caso [do fundão de R$ 5,7 bilhões], como houve uma extrapolação, extrapolou o valor —foi muito acima do que ocorreu por ocasião das eleições de 2018, extrapolou— então eu tenho a liberdade de vetar e vamos vetar", disse Bolsonaro na semana passada, em entrevista à rádio Itatiaia.

Agora, o presidente tem sobre sua mesa a tarefa de decidir se corrobora o discurso público dele e de aliados e veta o fundo inflado ou se engaveta essa retórica e atende ao desejo da maioria dos congressistas.

Nesta segunda, a ministra Rosa Weber, do STF (Supremo Tribunal Federal), deu dez dias para que o Congresso se manifeste sobre o trecho da LDO que autoriza o aumento do fundo eleitoral. A decisão ocorre após um grupo de parlamentares do Novo, Cidadania, PSB e PDT ingressarem com um mandado de segurança na corte para tentar impedir a ampliação dos recursos.

Eles solicitam informações do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), e argumentam que a votação do reajuste não seguiu o que determina a lei.

O fundo eleitoral inflado foi aprovado de forma acelerada pelo Congresso, em meio às discussões da LDO. O relatório do projeto da lei orçamentária foi apresentado na madrugada de 15 de julho, aprovado em comissão do Legislativo pela manhã e, depois, à tarde no plenário do Congresso.

Na conversa com apoiadores nesta segunda, Bolsonaro voltou a lançar suspeitas sobre as eleições de 2022. Sem apresentar qualquer prova para embasar sua declaração, ele disse que "está na cara que querem fraudar" o pleito.

"[A gente] não consegue entender por que os caras são contra uma maneira de você terminar as eleições e ninguém reclamar. Está na cara que querem fraudar... de novo. Geralmente quem tá no poder é que faz artimanhas, eu estou fazendo justamente o contrário", disse.

Bolsonaro tem feito recorrentes afirmações falsas sobre as eleições no Brasil, com acusações infundadas de que pleitos passados foram fraudados e que ele só será derrotado em 2022 caso haja irregularidade semelhante —pesquisas recentes apontam o favoritismo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

A principal estratégia do presidente é questionar a segurança das urnas eletrônicas, sistema usado desde 1996 e considerado eficiente e confiável por autoridades e especialistas no país.

O próprio Bolsonaro foi eleito para o Legislativo usando o sistema em diferentes ocasiões, assim como venceu o pleito para o Palácio do Planalto em 2018 da mesma forma.

Bolsonaro defende a adoção do voto impresso —segundo ele, auditável. Tramita no Congresso uma proposta nesse sentido, mas a ideia conta com oposição de uma coalizão de partidos, alguns deles da própria base de Bolsonaro.

Nesta segunda, ele trocou o termo auditável por voto democrático. "Democrático? Falar democrático que é melhor", disse.

Num cenário em que aliados de Bolsonaro são alvo de investigação sobre a existência de organização voltada para atacar as instituições democráticas do país, o presidente disse ainda que entende manifestações —incluindo as que pedem a volta AI-5— como parte do direito de liberdade de opinião.

"Eu não estou reclamando, porque entendo com liberdade de opinião. Você quer levantar um cartaz na rua pedindo aí pena de morte? Faça o que você bem entender. Isso é liberdade de expressão, está na Constituição. Eu respeito isso, outros não respeitam", afirmou.

"O cara levanta uma placa [do] artigo 142 [da Constituição, que trata sobre as Forças Armadas] e ele é processado por causa disso? Então vamos retirar o artigo 142 da Constituição. O cara levanta uma placa do AI-5. AI é na Constituição anterior, não existe mais AI", afirmou, referindo-se ao ato institucional que inaugurou o período de maior repressão na ditadura militar.

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