Descrição de chapéu
Eleições 2022 machismo

Bolsonaro responde com raiva sobre ter raiva de mulher; Lula tropeça no tema

Debate mostra que os homens que polarizam eleição ainda têm falhas com eleitorado feminino

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

São Paulo

Muitas eleitoras dormiram pensando na reincidência misógina de Jair Bolsonaro (PL), que acusou uma jornalista de dormir pensando nele quando ele topou com uma pergunta que não gostou.

"Você tem alguma paixão em mim", disse o presidente no debate deste domingo (28) a Vera Magalhães, que levantou o tema da desinformação sobre vacinas por ele alimentada. "Você é uma vergonha para o jornalismo brasileiro."

A simpatia das 82 milhões de mulheres aptas a votar neste ano é do que as campanhas mais deveriam correr atrás neste pleito dominado por dois homens que, cada um ao seu modo, encarnam um bolorento papel de cabra-macho no imaginário popular.

Lula, Bolsonaro, Ciro Gomes, Felipe d'Avila, Simone Tebet e Soraya Thronicke durante o debate - Bruno Santos/Folhapress

Tanto Bolsonaro quanto Lula (PT) tiveram momentos ruins quando a paridade de gênero entrou na conversa, mas o presidente foi mais infeliz. Bolsonaro já tem um histórico de falas machistas para desqualificar mulheres que o enfrentam —a deputada que "não merece ser estuprada porque é muito feia", a repórter que queria "dar um furo a qualquer preço". Enfim, a lista é longa.

Em outro momento, Simone Tebet (MDB) disse que lhe faria uma pergunta "bem objetiva": "Por que tanta raiva das mulheres?".

Sua equipe de redução de danos trabalhará dobrado após a reação raivosa de Bolsonaro.

"Chega de vitimismo" e "não fica aqui fazendo joguinho de mimimi" são frases prontas com apelo a quem já se ajoelha ao bolsonarismo, mas subtraem pontos com eleitoras ainda indecisas sobre que número digitar nas urnas. E aí não há Michelle que consiga salvar a imagem do marido grosseirão que, veja bem, no fundo tem coração de manteiga.

Os embates com a jornalista e a senadora já haviam garantido protagonismo à questão feminina no primeiro confronto entre presidenciáveis. Bolsonaro escolheu Ciro Gomes (PDT) para responder uma pergunta, ignorando as duas candidatas na roda. Queria ter "um papo sobre mulher", já que "defesa da mulher é uma obrigação nossa".

O pedetista rebateu lembrando que o presidente chamou sua caçula de "fraquejada" após quatro filhos homens. Bolsonaro disse que já havia se desculpado por isso e, "no tocante à questão da mulher", resgatou uma declaração desastrosa que Ciro deu na campanha de 2002 —disse que Patrícia Pillar, sua então esposa, tinha o papel de dormir com ele.

Eram tempos em que tiradas machistas ainda eram atenuadas sob o rótulo de "gafe", como aliás fez a própria Folha em reportagem na época. Demorou para o machismo ser chamado pelo nome.

Marta Suplicy chamou ao duelar com Paulo Maluf pela Prefeitura de São Paulo, em 2000. "A senhora fica quietinha e para de dar palpite", lhe disse o oponente, também num debate.

A discussão de gênero foi ganhando relevo, e ataques que ultrapassam a rivalidade eleitoral e resvalam para a misoginia viraram um campo minado que as campanhas tentam a todo custo desarmar.

Ciro, por exemplo, referiu-se à própria fala como "uma infelicidade de alguém criado em ambiente machista" e disse que aprendeu a lição. Bolsonaro poderia dizer o mesmo?

Lula também está longe de ser um aluno exemplar. Questionado se assumiria o compromisso de preencher metade de sua Esplanada com ministras mulheres, disse que indicaria "as pessoas que têm capacidade".

Preferiu sair-se com esse argumento queridinho da turma da meritocracia, que parte da falsa premissa que todos nascem em pé de igualdade para disputar a mesma vaga.

Uma mulher não vai votar em outra apenas pela camaradagem de gênero. Todo eleitor é um carrossel identitário, e é natural que pese posições que vão da social à religiosa para decidir seu voto.

Tebet e Soraya Thronicke (União Brasil) dificilmente se cacifarão eleitoralmente após o bate-boca com seus adversários homens, mas foram essenciais para pôr em evidência a pauta feminina.

Não só. Partiram das duas mulheres na disputa alguns dos ataques mais incisivos contra o candidato que, segundo a emedebista, "tem raiva" de 52,5% do eleitorado.

Uma desafiadora Tebet disse não temer Bolsonaro, e a ex-bolsonarista Thronicke lamentou aqueles que são "tchutchuca com os homens, mas vêm pra cima da gente como tigrão".

Se a intenção de Bolsonaro era acenar para mulheres, os principais jornais do país colocaram na manchete sua disposição em atacá-las. E, enquanto o debate transcorria, a pergunta "o que é feminista" subiu 800% nas buscas do Google. "Misoginia" teve uma alta de 2.650%. Quem procura, acha.

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Tópicos relacionados

Leia tudo sobre o tema e siga:

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.