Descrição de chapéu Eleições 2022

Bolsonaro deputado chamou Lula de querido e honesto, mas rompeu em seguida

Presidente passou a criticar petista em decorrência da reforma da Previdência aprovada em 2003

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Brasília

Não é verdade a afirmação feita por Luiz Inácio Lula da Silva (PT) neste domingo (16) de que todos os discursos do então deputado federal Jair Bolsonaro (PL) eram simpáticos ao seu governo, embora a negativa do presidente da República tenha omitido os elogios que ele fez antes de o petista assumir o poder, em 2003.

No primeiro debate do segundo turno das eleições, promovido por Folha, UOL, Band e TV Cultura, Lula disse ter ficado sabendo que todos os discursos de Bolsonaro quando era deputado —ou seja, de 1991 a 2018— foram elogiosos ao seu governo (2003 a 2010).

Bolsonaro respondeu apenas que não ia "rebater isso aí" e que fazia ao menos dois discursos por semana "mostrando as mentiras e inverdades" da gestão Lula.

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O presidente Jair Bolsonaro (PL) apoia a mão no ombro do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no primeiro debate do 2º turno, na TV Bandeirantes - Marlene Bergamo/Folhapress

Pesquisa nas notas taquigráficas da Câmara dos Deputados mostra que em mais de 200 ocasiões, entre 1994 e 2018, Bolsonaro promoveu alguma fala em plenário mencionando Lula.

Todos os discursos que Bolsonaro fez antes da posse do petista foram elogiosos a Lula, em contraposição à oposição que fazia ao então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

Bolsonaro, por exemplo, disse que votaria em Lula em eventual segundo turno que o petista disputasse contra o candidato de FHC, José Serra (PSDB).

"Embora eu pertença a partido da base de apoio do governo, o PPB [hoje PP], raramente voto favoravelmente às propostas governamentais e jamais apoiaria o candidato oficial. Digo mais, num segundo turno disputado entre José Serra e Lula, não voto em José Serra. Prefiro uma pessoa honesta, ainda que sem muita cultura, como dizem ser o caso de Lula, a uma pessoa muito culta, porém mal-intencionada", afirmou Bolsonaro, em discurso feito em maio de 2002.

As notas taquigráficas da Câmara mostram que nos anos FHC o então deputado Bolsonaro usava todas suas falas no plenário da Câmara —feitas, em geral, no período de curtos discursos que antecedem as votações— para defender interesses corporativos dos militares, praticamente sua única bandeira naquela época.

A primeira menção feita por Bolsonaro sobre Lula, de acordo com as notas disponibilizadas pelo site da Câmara, foi em 1994, ocasião em que estava sendo implantado o Plano Real. A medida colocou fim ao cenário de hiperinflação no Brasil e catapultou FHC ao Palácio do Planalto, derrotando Lula.

"E os companheiros do PT —não tenho nada contra o Lula, muito pelo contrário— já podem, no meu entender, enfiar a viola no saco porque esse plano é para eleger o senhor FHC", discursou Bolsonaro em 30 de março daquele ano.

"Voto no senhor Paulo Maluf caso venha a ser candidato, infelizmente parece que não será. Mas sem Paulo Maluf no segundo turno, sou Lula. Em oposição logicamente ao FHC. Lula, apesar de ter pouco conhecimento administrativo, tem caráter", continuou o então deputado.

Em junho de 1994, voltou a reafirmar o apoio a Lula, dizendo que o país não aguentava mais "tanta roubalheira e corrupção".

Com Lula já eleito, Bolsonaro voltou aos microfones do plenário da Câmara para dizer que esperava que "o nosso querido Luiz Inácio Lula da Silva, futuro presidente da República", tivesse o "devido carinho" para escolher um ministro da Defesa à altura das tradições do Exército.

Após a posse de Lula, os registros da Câmara mostram que pouco a pouco Bolsonaro passou a adotar uma fala mais crítica, embora aqui e ali ressaltasse que não iria fazer oposição ao governo.

A apresentação da reforma da Previdência pelo governo Lula, que atingiu militares, bastou para que o hoje presidente passasse, em suas falas, a se referir ao PT e a Lula em termos similares ao que usa atualmente.

Além de empurrar de vez Bolsonaro para o lado oposto ao de Lula, a reforma levou o PT a expulsar quadros que se recusaram a votar favoravelmente a ela, entre eles Babá (PA), classificado como um dos radicais do PT. Ele foi elogiado por Bolsonaro na Câmara justamente por manter a posição contrária à reforma.

"Com tanta esperança, o povo brasileiro elegeu Lula para presidente, mas em tão curto espaço de tempo o governo mostra sua verdadeira face, a da traição", disse Bolsonaro em março de 2003.

Diferentemente de Babá e seus outros colegas, que ocupavam grande espaço na imprensa devido à crise interna que causaram no partido do presidente, Bolsonaro e suas críticas tiveram pouca repercussão tendo em vista que ele, na época, era um parlamentar de baixíssima expressão política.

Bolsonaro só começou a se projetar politicamente quando já havia completado 20 anos como deputado federal. Ele surfou a onda do chamado kit gay, na primeira gestão de Dilma Rousseff (2010-2014), conseguindo obter a sua maior votação como deputado federal em 2014.

O kit gay foi uma fake news bancada por parlamentares e grupos religiosos segundo a qual o governo do PT estaria distribuindo a crianças do ensino fundamental material pornográfico.

Na verdade, o material direcionado a professores e alunos do ensino médio integrava o programa Escola Sem Homofobia, do Ministério da Educação, e tinha o objetivo de, por meio de conteúdos sobre sexualidade, combater o preconceito na educação.

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