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Viviane Gonçalves Freitas

Fortalecer mulheres na Câmara é apenas o início da luta por igualdade

Eleitas devem ter como meta sociedade cidadã, sem as amarras de preconceitos de gênero, raça e classe

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Viviane Gonçalves Freitas

Professora de Ciência Política (UFMG). Integrante da pesquisa Gênero e Raça nas Eleições de 2022 (parceria Observatório Nacional da Mulher na Política da Câmara dos Deputados e Instituto de Ciência Política da UnB)

Com a conclusão dos trabalhos de apuração das urnas, o perfil da Câmara dos Deputados dos próximos quatro anos continuará sendo, majoritariamente, de homens, brancos e com capital político e econômico significativo.

Apesar de ter havido 35% de mulheres candidatas em 2022, a bancada feminina da 57ª Legislatura (2023-2027) representará apenas 18% da casa, um aumento de 17,7% em comparação ao cenário atual.

Uma diferença importante é que, a partir de 2023, 14% das deputadas serão mulheres pretas, que, somadas às pardas, totalizam 32% de negras.

Bancada feminina da Câmara dos Deputados vai à mesa da presidência para impedir a votação do projeto, apoiado por Eduardo Cunha, que cria a Comissão das Mulheres, em 2016 - Folhapress

Durante o pleito deste ano, postulantes negros e negras à Câmara Federal perfizeram 49,5% das candidaturas, convertendo-se em apenas 26% dos eleitos.

Essa diferença entre as múltiplas candidaturas e quem, de fato, consegue uma cadeira pode ser explicada a partir de diversos fatores, como aposta do próprio partido, visibilidade social e recursos financeiros.

Na eleição de 2018, dos 513 parlamentares eleitos, o percentual de mulheres foi de 15%. Segundo dados do IBGE, a parcela feminina equivale a 51% da população.

Sua baixa representação no legislativo federal coloca o Brasil no 146º lugar entre 193 países do ranking da União Interparlamentar (UIP). Já em relação a negros e negras, o percentual sobe para 56% no país contra 27% na legislatura que se encerra em 2023.

Entre as eleitas, estão nomes há muito conhecidos no cenário político e outros que despontaram em seus estados de origem, ganhando projeção nacional.

Na lista das conhecidas, está Benedita da Silva (PT-RJ), ex-governadora e atual deputada federal, que começou sua atuação política junto a movimentos sociais de bairros e favelas, e, nesta eleição, integra a iniciativa Quilombo nos Parlamentos, da Coalização Negra por Direitos, cujo objetivo é reduzir o déficit de representatividade negra nos legislativos federal e estaduais/distrital.

Por São Paulo, maior colégio eleitoral do Brasil, estão Marina Silva (Rede-SP), mulher negra da Amazônia Legal, ex-senadora e ex-ministra do Meio Ambiente, com papel fundamental nas discussões sobre essa agenda, e Erika Hilton (PSOL-SP), eleita deputada estadual em 2018, torna-se agora a primeira travesti preta a ocupar uma cadeira na Câmara dos Deputados, nona mais votada do estado, com projetos voltados para a população LGBTQIA+ e negra.

De Minas, chega Duda Salabert (PDT-MG), professora e vereadora em Belo Horizonte, onde, em 2020, se tornou a vereadora mais votada da história na cidade.

Primeira mulher trans a exercer o cargo na capital mineira, foi vítima de diversos episódios de violência política de gênero durante o mandato, que se intensificaram durante a campanha deste ano. Também do segundo maior colégio eleitoral do país, Célia Xakriabá (PSOL-MG), professora e ativista, consagra-se como a primeira indígena do estado a chegar à Câmara dos Deputados.

Se a conquista da cadeira pode parecer uma vitória, é bom que se ressalte que é apenas o início da caminhada. A nova bancada feminina precisará lidar com a violência política de gênero, na pele e na mobilização, para que instrumentos normativos possam, de fato, coibir tais ações.

Além disso, há o fator de que muitas das deputadas eleitas têm perfil mais conservador, e será necessário compreender que essa bancada se constitui de diferentes mulheres, como também a sociedade brasileira.

Para se alcançar uma democracia que verdadeiramente contemple a todas, suas iniciativas precisam ter como parâmetro o entendimento de que essa pluralidade deve incluir o respeito à laicidade do Estado, a defesa da equiparação salarial, a proteção dos direitos já conquistados.

Esse é um ponto de partida fundamental para que novos horizontes se abram em prol de uma sociedade genuinamente cidadã, sem as amarras das desigualdades de gênero, raça e classe.

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