Queixas sobre urnas devem ser feitas ao presidente da mesa, não em aplicativo

Vídeo da deputada Carla Zambelli volta a circular

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São Paulo

É enganoso que os eleitores brasileiros poderão registrar denúncias no aplicativo Pardal, do TSE (Tribunal Superior Eleitoral), caso haja problemas na hora da votação nas eleições. O vídeo que contém desinformação mostra a deputada federal Carla Zambelli apresentando uma orientação conjunta do TSE e do Ministério da Segurança Pública sobre o tema. Como verificado pelo Projeto Comprova, o conteúdo, que circula agora no Kwai, é, na verdade, de 2018.

A Justiça Eleitoral informou que o aplicativo Pardal não receberá ocorrências desse tipo em 2022. Segundo o órgão, a ferramenta receberá denúncias apenas de ilícitos eleitorais, como as práticas de propaganda eleitoral irregular, compra de votos, abuso de poder econômico e político, dentre outros.

Nestas eleições, conforme informações do tribunal, eleitores que queiram registrar queixa de problemas na hora do voto devem falar diretamente com o presidente da mesa receptora de votos –composta por seis mesários nomeados por um juiz eleitoral e onde fica instalada a urna eletrônica. Em seguida, o juiz deve ser contatado e a ocorrência deve ser registrada em ata.

Fotografia colorida mostra sala de votação nas eleições. Há dois mesários sentados utilizando máscara facial e uma mulher indo à cabine da urna eletrônica para votar.
Eleitores que queiram registrar queixa de problemas na hora do voto devem falar com o presidente da mesa - Rivaldo Gomes - 29.nov.20/Folhapress

O Comprova classifica como enganoso todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação

O Comprova investiga conteúdos que têm maior alcance nas redes sociais. Até 30 de setembro, o vídeo verificado teve 303,7 mil visualizações; 38,1 mil curtidas; 2,2 mil comentários e 20,7 mil compartilhamentos.

O que diz o autor

A reportagem entrou em contato com o autor da postagem por meio de mensagem direta no aplicativo Kwai, mas não obteve retorno até o fechamento desta verificação.

Como verificamos

Para apurar as informações do vídeo, o Comprova consultou o documento citado por Zambelli disponível no site do TSE, além de outros materiais do tribunal sobre as urnas eletrônicas (1 e 2).

No processo de verificação, buscamos a postagem original do vídeo. No entanto, em meio a tantas publicações da candidata, não encontramos o conteúdo. Solicitamos a gravação para a assessoria de imprensa da deputada, que não retornou.

A verificação reuniu informações sobre o aplicativo Pardal e entrou em contato com a assessoria do TSE e com a pessoa responsável pela publicação do vídeo.

Documento é de 2018

No vídeo, a deputada faz referência a um documento com orientações sobre como proceder em eventuais problemas no momento do voto. O papel mostrado na filmagem é de 16 de outubro de 2018, cujo título é "Orientação Conjunta N° 01/2018 TSE/MSP", e foi assinado pela então presidente do TSE, ministra Rosa Weber, e pelo então ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann.

À época, o TSE e o MSP (Ministério da Segurança Pública) expediram orientações para o segundo turno daquele pleito "com o objetivo de uniformizar o atendimento, o registro e o encaminhamento de queixas relativas a um eventual mau funcionamento das urnas eletrônicas e padronizar o tratamento de ocorrências apresentadas às polícias, além de evitar a desinformação no dia da eleição".

Dentre as medidas citadas estavam a orientação para que o eleitor comunicasse ao mesário ou presidente da mesa da seção qualquer problema no ato do voto; procedimentos para que o presidente da mesa registrasse a ocorrência em ata e meio digital (aplicativo Pardal), sendo obrigatório o registro no mesmo aplicativo; e comunicação do ocorrido ao juiz eleitoral da região, a quem caberia decidir sobre providências a serem adotadas.

Dois dias depois, um segundo documento foi emitido em conjunto pelos órgãos supracitados. A "Orientação Conjunta N° 02/2018 TSE/MSP" alterou trechos da recomendação inicial, retirando a obrigatoriedade de que mesários e presidente de seções registrassem a ocorrência no aplicativo Pardal, mas possibilitando que o próprio eleitor fizesse o procedimento, caso desejasse.

A alteração aconteceu sob a justificativa de ser necessário "evitar a formação de filas durante a votação" e a "inexistência de acesso à internet em seções e os custos de transmissão de dados a serem suportados pelos mesários".

Sendo assim, as novas orientações assinadas por TSE e MSP determinaram que não caberia aos mesários e presidentes de seção, mas ao cartório eleitoral ou servidor sob a responsabilidade do juiz eleitoral "efetuar o registro das atas (referentes às ocorrências trazidas por eleitores), no aplicativo Pardal, selecionando, a opção ‘nova denúncia’ e, em seguida, ‘outros/denúncias’, inclusive inserindo foto da ata lavrada".

Mudança

A reportagem acessou o Pardal no dia 27 de setembro e, atualmente, não aparecem as opções "nova denúncia" e "outros/denúncias". Ao se conectar, o cidadão vê duas opções: "fazer uma denúncia" ou "consultar uma denúncia".

Ao clicar em "fazer uma denúncia", a página é direcionada a outra aba com outras duas opções: "propaganda eleitoral irregular" ou "internet e outras irregularidades eleitorais":

Dada a repercussão da desinformação, a Justiça Eleitoral, na seção Fato ou Boato de seu site, informou que, em 2022, o aplicativo Pardal não recebe relatos de problemas com a urna. Segundo o órgão, essa ferramenta é exclusiva para receber denúncias de ilícitos eleitorais, como propaganda eleitoral irregular de compra de votos, abuso de poder econômico, abuso de poder político, uso da máquina pública para fins eleitorais e uso indevido dos meios de comunicação social.

Como denunciar

O TSE orienta os eleitores a apresentarem eventuais denúncias de defeitos ou mau funcionamento da urna eletrônica diretamente a quem preside a mesa receptora de votos. Em seguida, o juiz responsável pela seção eleitoral deve ser imediatamente contatado, sendo que essa ocorrência deve ser registrada em ata com a descrição do problema apresentado e o encaminhamento que foi dado.

Para garantir a continuidade da votação, a Justiça Eleitoral também prevê mecanismos de contingência a fim de preservar e evitar a perda do voto dos eleitores, sem desconsiderar as necessidades de transparência e segurança que permeiam o processo eleitoral como um todo.

O primeiro procedimento é de desligar e religar a urna eletrônica, ffeita pelo próprio mesário (no caso, o presidente da mesa), à vista dos fiscais presentes. O simples reinício da máquina, de forma análoga ao reinício de outros dispositivos eletrônicos (computadores, telefones celulares), não altera informações já gravadas em cartões de memória. Ou seja, nem os votos já gravados nem a informação de quais eleitores já votaram sofrem alteração.

Caso o problema persista, os procedimentos são: reposicionamento do cartão de memória, substituição do cartão de memória externo e substituição da urna com falha. Se ainda assim os procedimentos de contingência não forem suficientes, só então a votação deverá prosseguir com o uso de cédulas de papel até o encerramento.

Para isso e a fim de permitir eventual auditoria pós-eleições, várias providências devem ser adotadas, como as lacrações tanto da urna defeituosa quanto da urna de contingência e os respectivos envios para a junta eleitoral e equipe designada pelo juiz eleitoral.

Conforme explica o TSE, as urnas eletrônicas são fabricadas levando em consideração um prazo de cerca de dez anos de uso e, por isso, há mais de um modelo a cada eleição. A interface da máquina permanece a mesma, no entanto, internamente, os equipamentos recebem novos dispositivos de segurança ou mais memória interna, entre outras melhorias.

Embora sejam adotados testes preventivos a fim de evitar problemas, a urna eletrônica, assim como qualquer dispositivo eletrônico, pode apresentar falhas.

Dados do tribunal eleitoral mostram que no primeiro turno das eleições de 2014, por exemplo, houve a substituição de 5.275 urnas em todo país, o que representa pouco mais de 1% dos quase 450 mil equipamentos usados.

No segundo turno, foram 3.480 urnas substituídas, menos de 1% do total. Já na eleição seguinte, segundo a Agência Brasil, no primeiro turno, 2,4 mil máquinas foram substituídas e, no segundo, o número subiu para pouco mais de 4,3 mil.

Por que investigamos?

O Comprova investiga conteúdos suspeitos que viralizam nas redes sociais sobre as eleições presidenciais, políticas públicas do governo federal e a pandemia. A poucos dias do primeiro turno das eleições de 2022, são frequentes os conteúdos que tentam colocar em dúvida a segurança das urnas e do pleito. Peças de desinformação como esta verificada, que tentam tumultuar o processo eleitoral, podem influenciar na decisão de eleitores brasileiros. A população deve escolher seus candidatos com base em informações verdadeiras e confiáveis.

A investigação desse conteúdo foi feita por NSC Comunicação, O Povo, Estadão, Plural Curitiba e SBT e publicada em 30 de setembro pelo Projeto Comprova, coalizão que reúne 43 veículos na checagem de conteúdos virais. Foi verificada por Folha de S.Paulo, Nexo, Correio, Metrópoles, O Dia, O popular, A Gazeta e piauí. 

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