Diplomata que voltou da Arábia com ministro de Bolsonaro diz ter carregado apenas artigos pessoais

Futuro embaixador em Cuba, Christian Vargas afirma que não portava estojo com relógio e abotoaduras de luxo cujo ingresso no Brasil é investigado pela Receita

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Brasília

O diplomata Christian Vargas, terceiro integrante da comitiva do ministério de Minas e Energia que viajou à Arábia Saudita em outubro de 2021, afirma ter retornado ao Brasil carregando apenas artigos pessoais e que, ao desembarcar no aeroporto de Guarulhos (SP), não portava itens oferecidos como presentes oficiais ao governo Jair Bolsonaro (PL).

"Minhas funções eram estritamente de assessoramento político-diplomático e não incluíam aspectos logísticos e de protocolo, como troca de presentes, que ficavam a cargo do Ajudante de Ordens do Ministro [Bento Albuquerque, titular da pasta sob Bolsonaro]", disse Vargas, em nota enviada à Folha.

"Devo dizer que ninguém me solicitou, em nenhum momento, que transportasse qualquer pacote ou bagagem alheia. E, se isso tivesse ocorrido, eu evidentemente teria me negado a fazê-lo. Ingressei em território brasileiro, pelo Aeroporto Internacional de Guarulhos, somente com minha bagagem e meus pertences pessoais e, ao passar pelo controle da Receita Federal, não foi detectada qualquer irregularidade", concluiu o diplomata.

Outro estojo com joias enviado ao Brasil pelo governo da Arábia Saudita em outubro de 2021
Outro estojo com joias enviado ao Brasil pelo governo da Arábia Saudita em outubro de 2021 - Reprodução

Vargas, atualmente indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para chefiar a embaixada brasileira em Havana (Cuba), acompanhou o então ministro Albuquerque (Minas Energia) a Riade, por ocupar à época o cargo de chefe da assessoria internacional da pasta.

Albuquerque, Vargas e o militar Marcos André dos Santos Soeiro participaram na Arábia Saudita do lançamento da iniciativa Oriente Médio Verde. O próprio Bolsonaro fora convidado para a reunião, mas enviou Albuquerque como seu representante.

No retorno ao Brasil, ao passarem pela aduana no aeroporto de Guarulhos, Soeiro foi selecionado pela Receita para fiscalização e teve apreendido um conjunto de joias avaliado em R$ 16,5 milhões. Os artigos seriam um presente do governo da Arábia Saudita para a então primeira-dama Michelle Bolsonaro.

Um outro pacote de artigos de luxo que estava com a delegação entrou no país sem ser interceptado pela Receita. Ele incluía relógio, caneta, abotoaduras, anel e um tipo de rosário, todos da marca suíça de diamantes Chopard. Um recibo mostra que os itens foram entregues ao Palácio do Planalto no final de 2022, cerca de um ano após o ingresso no país.

No sábado (4), Albuquerque disse em entrevista à Folha que os presentes foram separados em duas malas e divididos entre os demais integrantes da comitiva. O ex-ministro também afirmou que passou pela alfândega portando apenas artigos pessoais e que o estojo contendo relógio, caneta, abotoaduras e rosário ingressou no país pelas mãos dos assessores que o acompanhavam.

Ele não citou os nomes de Soeiro —que teve a bagagem fiscalizada pela Receita— e Vargas, embora os dois fossem os únicos integrantes da delegação encabeçada por Albuquerque.

A Folha procurou novamente o ex-ministro para saber se ele mantinha a versão dada no sábado, diante da afirmação de Vargas que não ingressou no país com o segundo conjunto presentes, mas ele não quis comentar.

A Receita vai apurar as circunstâncias da entrada no Brasil desse segundo conjunto de joias enviado pelos sauditas por intermédio da missão chefiada por Albuquerque.

Em nota divulgada na segunda-feira (6), a Receita afirmou que "tomará as providências cabíveis no âmbito de suas competências para esclarecimento e cumprimento da legislação aduaneira, sem prejuízo de análise e esclarecimento a respeito da destinação do bem".

A CGU (Controladoria-Geral da União) também vai investigar a questão. Em nota divulgada nesta terça (7), o órgão informou que abriu uma investigação preliminar sumária sobre o caso.

A decisão "foi tomada em razão das autoridades supostamente envolvidas no caso, da possível participação de servidores públicos de mais de um órgão federal e, por consequência, da complexidade da apuração", apontou o órgão.

Esse tipo de investigação tem caráter preparatório e não punitivo. Ele pode resultar em arquivamento, instauração de um processo administrativo ou a celebração de um termo de ajustamento de conduta em casos considerados menos ofensivos.

Bens adquiridos no exterior que tenham valor superior a US$ 1.000 (pouco mais de R$ 5.000) precisam ser declarados à Receita na entrada no Brasil. Quando ultrapassam esse valor, eles estão sujeitos à cobrança do imposto de importação, que é de 50% sobre o excedente.

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