Suplicy tenta furar fila de CPIs, e Alesp tem gritos e empurra-empurra; veja vídeo

Deputado petista chega à sala de protocolo e afirma ter preferência na fila segundo o Estatuto do Idoso

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São Paulo

O protocolo de CPIs (comissões parlamentares de inquérito) na Assembleia Legislativa de São Paulo teve confusão entre deputados, empurra-empurra e gritos de ordem na manhã desta sexta-feira (24), após uma fila que durou mais de três dias.

O deputado Eduardo Suplicy (PT), 81, chegou ao local do protocolo portando o Estatuto do Idoso em mãos e argumentou que tinha preferência na fila, o que imediatamente gerou protesto dos deputados da direita, que ocupavam as primeiras posições.

O deputado Eduardo Suplicy (PT) pede prioridade na fila da CPI com base no estatuto do idoso - Carolina Linhares/Folhapress

A corrida pelas CPIs, que já virou tradição na Alesp, acontece porque as comissões são instaladas na ordem em que são protocoladas, e só cinco podem funcionar ao mesmo tempo. Na prática, cabem de 15 a 20 CPIs em uma legislatura de quatro anos.

Parlamentares e assessores se aglomeravam na porta da sala do protocolo, que abriu às 9h desta sexta, disputando gritos de ordem.

Os deputados da direita argumentavam que a fila, com senhas distribuídas, deveria ser seguida, enquanto Suplicy e colegas do PT diziam que o Estatuto do Idoso é lei federal e deve prevalecer.

Deputados aliados ao governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) e ao presidente da Casa, André do Prado (PL), ficaram com a liderança ao iniciarem a fila na terça-feira (21), antes mesmo que a Mesa Diretora definisse como e onde seria feito o protocolo.

A oposição de esquerda afirma que os deputados da base tiveram informação privilegiada e, por isso, chegaram antes. Nos bastidores, houve uma tática do PL para dominar a fila, e a configuração das primeiras cinco CPIs foi combinada previamente.

O PT e o PSOL chegaram a colocar funcionários nas últimas posições da fila, mas desistiram por considerar a situação absurda. A federação liderada pelo PT entrou na Justiça para anular a fila, acusando os deputados da direita de darem um golpe.

O PT tinha a intenção de protocolar uma CPI sobre o tiroteio em Paraisópolis ocorrido durante uma agenda de campanha de Tarcísio —uma pessoa foi morta. Já os deputados da base protocolaram CPIs de temas diversos, justamente para blindar o governo.

"Traz a senha 13 para o Suplicy", ironizou um deputado, em referência ao número do PT. "Aqui em São Paulo não tem 13, tem a senha 12 e depois a 14", respondeu um assessor. Com ironia, os servidores da direita gritavam "não vai ter golpe" e "democracia".

O ato da Mesa Diretora a respeito do protocolo das CPIs afirma que "será observada e respeitada, rigorosamente, a ordem de chegada, e a ninguém se concederá preferência ou tratamento prioritário, seja em razão da função que ocupe ou do cargo que exerça, seja por qualquer outra condição ou particularidade".

"Deputado em exercício tem que respeitar a ordem", gritou o líder de governo, Jorge Wilson (Republicanos).

Suplicy passou a ler em voz alta o Estatuto do Idoso, apoiado pelo vice-líder do PT, Luiz Carlos Marcolino. A deputada Ediane Maria (PSOL) segurava um cartaz escrito "do que o Tarcísio tem medo".

A polícia precisou intervir para esvaziar o corredor e apartar discussões entre funcionários de gabinetes diversos. No fim, os deputados do PT deixaram o local e a ordem da fila foi seguida —Thiago Auricchio (PL) foi o primeiro a protocolar uma CPI, seguido do bolsonarista Gil Diniz (PL).

Auricchio quer uma CPI para investigar os problemas de fornecimento de energia da empresa Enel, principalmente no ABC paulista. Já Gil quer uma comissão sobre procedimentos médicos prescritos para pacientes trans menores de idade.

Além de Auricchio e Gil, também discutiram com Suplicy os deputados Delegado Olim (PP), Lucas Bove (PL) e o vice-presidente da Casa, Gilmaci Santos (Republicanos). Eles saudaram Suplicy como senador e disseram respeitar a história do deputado petista, que foi o mais votado da Casa, mas que não abriam mão da fila.

Ediane (PSOL), Marcolino (PT) e Suplicy (PT) protestam durante o protocolo de CPIs na Alesp
Ediane (PSOL), Marcolino (PT) e Suplicy (PT) protestam durante o protocolo de CPIs na Alesp - Carolina Linhares/Folhapress

Suplicy chegou a levar um exemplar do Estatuto do Idoso para entregar a André no Prado na sala da presidência, mas ele não estava presente. Por fim, o deputado protocolou a CPI de Paraisópolis após todos os que estavam na fila —o PT não tem esperanças de que a comissão seja instalada antes do fim da legislatura.

Questionado pela Folha sobre qual era o tema da sua CPI, Olim, aliado de Tarcísio, precisou consultar um papel para se lembrar com exatidão: "descarte de lixo contaminante". "Considero importante", emendou.

Pouco antes da chegada de Suplicy, os deputados da base comemoravam em frente ao protocolo o sucesso da estratégia de antecipar a fila, o que inviabilizou as CPIs de esquerda. Entre risadas e abraços, o clima era de festa.

Durante a semana, porém, houve muita reclamação de servidores que faziam revezamento no local. Quem saísse para ir ao banheiro, comer ou fumar poderia perder o lugar. Como mostrou a Folha, havia conferência de senhas sem aviso prévio, e quem não estivesse na fila tinha a senha cancelada.

Organizados em cadeiras ao longo de um corredor ao lado do plenário, no subsolo da Assembleia, os servidores passam o tempo no celular, trabalhando em notebooks ou até lendo livros.

Os partidos organizam seus assessores por turnos. Quem passou a madrugada na fila teve pizza e refrigerante no jantar.

Deputados aliados a Tarcísio comemoram a liderança na fila das CPIs na Alesp
Deputados aliados a Tarcísio comemoram a liderança na fila das CPIs na Alesp - Carolina Linhares/Folhapress

Os líderes partidários chegaram a tentar um consenso em reunião para acabar com a fila, mas não houve entendimento. A bancada de esquerda queria ter direito a ao menos uma CPI por semestre.

Em discurso no plenário na quarta (22), o deputado Donato (PT) chamou a fila de golpe e disse se tratar de "um jeito quinta série" de cercear a oposição. "A Assembleia começa mal", completou, em crítica a André —que o PT ajudou a eleger presidente no último dia 15.

"É papel do deputado fazer fiscalização, e nossas propostas [de CPI] são todas de interesse da sociedade", disse Marcolino na ocasião.


Veja a lista das primeiras CPIs protocoladas

  1. Enel - Thiago Auricchio (PL)
  2. Golpes com pix e clonagem de cartões - Itamar Borges (MDB)
  3. Tratamento hormonal para adolescentes trans - Gil Diniz (PL)
  4. Prevenção de deslizamento em encostas - Fabiana Barroso (PL)
  5. Epidemia do crack - Paulo Correa Jr (PSD)
  6. Lojas Americanas - Vinicius Camarinha (PSDB)
  7. Pedofilia - Paulo Mansur (PL)
  8. Santas Casas - Bruno Zambelli (PL)
  9. Empresas de comunicação - Carla Morando (PSDB)
  10. Tratamento dado aos moradores de rua e soluções a respeito do seu crescente número - Vitão do Cachorrão (Republicanos)
  11. Vazamento dos dados cadastrais de consumidores - Dr. Eduardo Nóbrega (Podemos)
  12. Descarte de lixo contaminante - Delegado Olim (PP)
  13. Questões impactantes do meio ambiente - Rafael Saraiva (União Brasil)
  14. Pirâmides financeiras - Altair Moraes (Republicanos)
  15. Lixões - Barros Munhoz (PSDB)
  16. Contaminações ambientais - Danilo Balas (PL)
  17. Descumprimento dos direitos dos usuários do transporte aéreo - Letícia Aguiar (PL)
  18. Invasões de terras - Danilo Balas (PL)
  19. Crime de usura contra a economia popular - Rafael Saraiva (União Brasil)
  20. Tiroteio ocorrido durante ato da campanha de Tarcísio - Reis (PT)

O protocolo das CPIs geralmente ocorre após o início da legislatura –os novos deputados tomaram posse no último dia 15. Mas uma decisão do presidente anterior, Carlão Pignatari (PSDB), fechou o protocolo de matérias entre o dia 15 e o dia 23, reabrindo em 24.

Nesse período, o novo presidente, André, iria definir como seria feito o protocolo de CPIs —se o procedimento seria físico ou digital, como esperava a oposição, já que alguns documentos passaram a ser protocolados eletronicamente na última legislatura.

Na quarta, um ato determinou o protocolo físico a partir de sexta. Deputados da base admitem que a fila física seria mais fácil de controlar do que o procedimento digital.

Como mostrou a Folha, a fila da CPI já virou uma tradição na Assembleia. Na última edição, em 2019, servidores tucanos passaram 63 horas acampados para blindar o governador João Doria (PSDB) e empurrar para o fim da fila a CPI da Dersa, proposta pelo PT.

PSDB e aliados protocolaram 11 CPIs, jogando as de oposição no mínimo para o ano seguinte. Os temas variavam entre venda irregular de animais, fake news, táxi aéreo e outros.

Já em 2015, o PT conseguiu driblar o PSDB na fila: um servidor dormiu no plenário, escondido da polícia da Casa, e amanheceu no protocolo, pela parte de dentro, ocupando o primeiro lugar. Mas a presidência da Alesp considerou que a fila só valia do plenário para fora, e o protocolo de CPIs do PT foi anulado.

São necessárias 32 assinaturas de deputados para protocolar uma CPI. As investigações do Legislativo paulista têm prazo de 120 dias e podem ser prorrogadas uma vez, por 60 dias, somando um período máximo de seis meses de duração.

O mero protocolo das CPIs, no entanto, não garante seu funcionamento. Isso depende de o presidente da Casa criar a comissão, dos partidos definirem seus membros, do membro mais velho convocar a primeira reunião, dos membros elegerem presidente e relator e de que haja quórum para as demais reuniões. Todas essas etapas costumam enfrentar obstrução da base ou da oposição a depender do tema da CPI.

Fila para abertura de protocolo nas CPIs da Alesp - Danilo Verpa - 22.mar.2023/Folhapress
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