Cid recebeu dados de viagens de Lula, e governo admite atraso para desativar email

Planalto cita falta de equipe e diz à CPI do 8/1 que demorou para bloquear acessos após fim do governo Bolsonaro

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Brasília

O tenente-coronel Mauro Cid, um dos principais auxiliares do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), recebeu por email informações do GSI (Gabinete de Segurança Institucional) sobre viagens realizadas pelo presidente Lula (PT) até 15 de março de 2023.

Em documento enviado à CPI do 8 de Janeiro, obtido pela Folha, a Casa Civil reconheceu que demorou para desativar a conta que Cid utilizava quando ainda era o chefe dos ajudantes de ordens de Bolsonaro. O ministério alegou falta de pessoal.

A Casa Civil afirmou que o processo é feito manualmente e que só duas pessoas trabalhavam no setor responsável em janeiro —quando precisou desabilitar mais de mil contas de funcionários que foram exonerados após Bolsonaro deixar a Presidência.

O ex-ajudante de ordens de Bolsonaro Mauro Cid em depoimento à CPI do 8 de janeiro - Pedro Ladeira-11.jul.2023/Folhapress

O recebimento de emails da equipe de Lula por Cid foi revelado pelo site Metrópoles e confirmado pela Folha.

"O procedimento de desabilitação do login foi efetuado com atraso, em 15/03/2023, devido ao acúmulo exponencial de atividades de credenciamento durante a transição para o novo governo, cabendo registrar que, entre os meses de dezembro de 2022 e janeiro de 2023, ocorreram cerca de 1.100 (mil e cem) exonerações e que a equipe responsável pelo credenciamento e descredenciamento era composta, à época, por duas pessoas", disse a pasta.

"Após o desligamento de um servidor, a equipe responsável pelo credenciamento realiza o procedimento de desabilitação do login de rede e, após execução do backup full [completo] da caixa de mensagens, a sua exclusão. Importa destacar que o processo em questão é manual, sujeito à ocorrência de falhas."

As mensagens recebidas por Cid mostram nomes dos responsáveis pela coordenação da segurança de eventos com a presença de Lula. Também apresentam dados sobre atividades da equipe que faz o reconhecimento do local das agendas do petista.

O ex-auxiliar de Bolsonaro recebeu ao menos 11 emails com dados de viagens do presidente em 2023, incluindo trajetos internacionais. Em março, Cid recebeu um ofício com alerta de "urgentíssimo" com informações sobre a ida do presidente à China.

Além de Cid, o militar Osmar Crivelatti recebeu emails com roteiros de viagens de Lula até o mês passado. Ele é ex-ajudante de ordens de Bolsonaro e foi um dos escolhidos para a equipe de assistentes a que o ex-presidente tem direito.

A Casa Civil disse em nota que "a desativação de contas de emails de ex-servidores da Presidência da República está sendo automatizada, para que não dependa mais da ação humana". "Com isso, serão evitadas possíveis inconsistências", declarou.

Em 30 de junho, chegou à caixa de mensagens de Crivelatti um ofício confirmando que Lula teria atividades em Leticia, na Colômbia, em 8 de julho. A mensagem também apresentava dados sobre o planejamento da segurança do petista e contatos da equipe que coordenaria a viagem.

O documento da Casa Civil ainda mostra que há problemas técnicos no governo para preservar os dados de emails de funcionários. A pasta cita que houve um "incidente cibernético" em novembro de 2022 e uma "força-tarefa" para tentar resguardar os dados, mas reconhece que o esforço foi insuficiente.

"Insta destacar que o procedimento de backup existente à época possuía limitações técnicas, impactando no período de retenção das cópias de segurança. Ressalta-se que a Presidência da República, recentemente, concluiu processo licitatório para adquirir solução de backup adequada para o seu Centro de Dados", disse a Casa Civil.

A pasta ainda afirmou à comissão que parte dos emails não é salva nos backups e que o sistema usado pela Presidência nem sequer tem capacidade de garantir a preservação de todas as mensagens.

"Cumpre ressaltar ainda que, as mensagens recebidas/enviadas e apagadas no mesmo dia, não são salvas durante a rotina de backup diário. Acrescenta-se que a solução de correio eletrônico utilizada na Presidência da República não dispõe do licenciamento que garante a retenção de toda mensagem recebida e/ou enviada", afirmou o ministério à CPI.

A caixa de correio de Cid só foi excluída definitivamente em 30 de maio, após backup feito pelo gabinete da Diretoria de Tecnologia da Casa Civil. O setor também entregou à CPI parte dos e-mails que tinham sido excluídos pelo ex-ajudante de ordens.

Em nota, o GSI disse que vai instaurar "sindicância para apurar os fatos". "Os militares citados [que teriam enviado os e-mails a ex-assessores de Bolsonaro] foram afastados do trabalho e serão desligados da Presidência", disse a pasta.

Os dados enviados à CPI ainda mostram que Crivelatti utiliza para assessorar Bolsonaro o mesmo e-mail que usava durante a gestão do ex-presidente. Ou seja, no mesmo endereço em que recebe dados sobre viagens de Lula, o militar envia e recebe mensagens sobre a rotina de Bolsonaro.

Em maio, por exemplo, Crivelatti enviou mensagens para organizar uma viagem de Bolsonaro. Em janeiro, ele recebeu no e-mail o boleto de condomínio da casa do ex-presidente no Rio de Janeiro.

Cid foi preso em maio de forma preventiva no âmbito da investigação em torno da falsificação do cartão de vacinação dele, da esposa, da filha mais nova de Bolsonaro, Laura, e do próprio ex-presidente. Ele está detido no Batalhão de Polícia do Exército de Brasília.

O militar ainda é alvo de investigações no STF (Supremo Tribunal Federal) e em outras instâncias, incluindo a que apura o caso das joias enviadas ao ex-mandatário por autoridades da Arábia Saudita.

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