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Governo Lula forças armadas

Discurso sem freios e contrapesos marca Lula no terceiro mandato

Presidente torce conceitos democráticos ao gosto da adequação à crise do momento

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São Paulo

O presidente Lula (PT) voltou a encarnar o personagem irascível e palanqueiro que marca sua terceira passagem pelo Palácio do Planalto.

Tal como uma democracia imperfeita, o petista falha em aplicar os freios à sua retórica, ciente da ausência de contrapesos eficazes a ela.

Enquanto a oposição no Brasil se resumir ao bolsonarismo igualmente histriônico, poderá jogar livremente essa partida em nome de uma polarização que por ora só o favorece.

Ladeados pelas esposas Valeska e Janja, Lula e Zanin se cumprimentam na posse do ex-advogado do presidente no STF
Ladeados pelas esposas Valeska e Janja, Lula e Zanin se cumprimentam na posse do ex-advogado do presidente no STF - Pedro Ladeira - 3.ago.2023/Folhapress

Nesta mesma terça (5), Lula conseguiu distorcer conceitos democráticos ao defender voto sigiloso no STF (Supremo Tribunal Federal) e comprar uma briga fútil e historicamente incorreta com os militares acerca da paternidade do 7 de Setembro.

O presidente tentou diluir o absurdo de sua fala sobre os votos no Supremo, corte cuja função precípua é a defesa transparente do ditame constitucional, lembrando dos casos recentes de ameaças contra os ministros do tribunal.

Muito bem, ameaças há e inclusive existe um mastodôntico inquérito que as apuras, e várias outras coisas para horror de muitos legalistas, em nome da integridade dos ministros. Alexandre de Moraes não precisa de Lula para se proteger, isso é certo.

O que o presidente fez foi pegar carona nessa questão para sugerir uma forma de blindagem para seu primeiro indicado à corte, seu ex-advogado Cristiano Zanin, que virou a Geni da esquerda por proferir votos de cunho conservador logo de saída no posto.

Noves fora o fato de que essa esquerda parece ter esquecido como votaram os indicados de Lula e Dilma Rousseff (PT) em casos como o mensalão e petrolão, talvez pelo momento de bonança para o petista na corte, parece um movimento inócuo.

Coisa de quem está sem freios, como as seguidas cascas de bananas alcançadas do outro lado da calçada pelo presidente demonstram.

O presidente já se enrolou com os Estados Unidos, com a Guerra da Ucrânia, com o papel do Congresso, com o Banco Central e até com o peso do ministro da Justiça. A protelada reforma ministerial para agradar o centrão, na esperança de votos que deve ser delimitada a pautas econômicas de interesse geral, transmutou o toma lá, dá cá em exercício democrático puritano.

Nada contra a realidade. Como a briga pelas vice-presidências da Caixa exemplifica, é essa a dinâmica da vida pública brasileira. Quem bateu de frente com isso enquanto fazia um governo desastroso, desde a redemocratização, acabou encontrando um impeachment no caminho.

Mesmo Jair Bolsonaro (PL), cuja eleição foi calcada nesse discurso de independência, teve de se render ao centrão quando a corda democrática que esticou chegou perto do rompimento em 2021. Com Lula, escaldado por dois governos em que teve de acomodar forças exógenas e pelo desastre de Dilma, não haveria de ser diferente.

Para sua sorte prática e azar institucional, assim como ocorria com o antecessor, essa logorreia tem pouquíssimos contrapesos. À boca miúda, ministros do governo se queixam do voluntarismo presidencial e acham os e as culpadas de sempre, mas no frigir dos ovos se calam. Ninguém ousa desafiar Lula abertamente.

Na esquerda mais sectária, que em sua docilidade ante o líder pouco difere do bolsonarismo, tudo será perdoado. Até porque Lula segue com sua toada de agradar o nicho, como fez na questão do 7 de Setembro.

Nada explica, além da vontade de agradar uma base que considera qualquer pessoa de farda um golpista pronto para agir, o ataque gratuito do presidente ao dizer que os militares sequestraram os festejos da Independência para si. O caráter cívico-militar da data sempre esteve presente nos desfiles Brasil afora, há décadas aliás, nada anormal numa República fundada à base da espada.

Dando o benefício da dúvida ao presidente, talvez ele estivesse falando do bolsonarismo, que sim abduziu símbolos nacionais oficiais, como a bandeira nacional, e extraoficiais, como a camisa da seleção de futebol. Mas aqui incorre numa dupla falta: chama todo militar de bolsonarista.

Ainda que o ex-presidente tenha tido a maioria d os votos na caserna, e teve, e que a simbiose de setores fardados com os delírios golpistas de Bolsonaro tenha causado dano quase impossível de reparar na imagem das Forças, parece um erro de Lula alienar os militares num momento em que se busca pacificar o ambiente.

Novamente, aqui é um caso de falta de freios que, ao lado da fragilidade do sistema de contrapesos em torno do presidente, politicamente define o governo Lula 3.

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