Comissão aprova fundão eleitoral dobrado e emendas turbinadas, ampliando poder na eleição de 2024

Projeto de Orçamento tira poder da articulação política de Lula; proposta precisa ser votada pelo plenário do Congresso

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Brasília

O Congresso Nacional avançou na aprovação do projeto que amplia o fundão eleitoral e as emendas parlamentares em 2024. Isso expande o poder dos partidos políticos, dos deputados e dos senadores em ano de eleição municipal, além de fortalecer os presidentes da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).

A verba turbinada está prevista no Orçamento do próximo ano, cujo texto foi aprovado pela CMO (Comissão Mista de Orçamento) na noite desta quinta (21). Agora, o texto seguirá para análise em sessão conjunta do Congresso, marcada para essa sexta-feira (22).

Após uma disputa entre a Câmara e o Senado, o valor do fundo que financia as campanhas eleitorais foi fixado em quase R$ 5 bilhões, o que é praticamente o dobro do último pleito municipal, em 2020.

Até 2015, as grandes empresas, como bancos e empreiteiras, eram as principais responsáveis pelo financiamento dos candidatos. Naquele ano, o STF (Supremo Tribunal Federal) proibiu a doação empresarial sob o argumento de que o poder econômico desequilibrava o jogo democrático.

Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado, o presidente Lula (PT), e Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara - Ueslei Marcelino/REUTERS

A partir das eleições de 2018, foi então criado o fundo eleitoral, que usa dinheiro público para bancar as atividades de campanha dos candidatos.

Os presidentes de partidos e a cúpula da Câmara articularam para repetir o valor do fundão da eleição de 2022, que também foi de aproximadamente R$ 5 bilhões. Mas no ano passado, a corrida era para a Presidência da República, governos estaduais e cargos de deputado estadual, federal e senador.

Na avaliação de senadores, não haveria justificativa plausível para distribuir a candidatos a prefeitos e vereadores —que percorrem apenas seus municípios— o mesmo montante usado em uma corrida para presidente, governadores, senadores e deputados federais.

O relator do Orçamento de 2024 é o deputado Luiz Carlos Motta (SP), que é do PL e é próximo do presidente da sigla, Valdemar Costa Neto. O partido de Jair Bolsonaro tem a meta de conquistar mais de 1.000 prefeituras no próximo ano e terá direito à maior fatia do fundão.

O Senado, porém, evitou um embate direto com a Câmara na votação desta quinta em relação ao valor para financiamento de campanha —a eleição municipal tem mais peso para os deputados. Pacheco tentou articular um valor intermediário, próximo de R$ 3 bilhões, mas não houve apoio no Congresso.

A principal discussão na votação foi em torno da expansão das emendas parlamentares, aqueles recursos que deputados e senadores enviam para obras e projetos em seus redutos eleitorais e, com isso, colhem capital político.

O projeto aprovado prevê o patamar recorde de R$ 53 bilhões para emendas em 2024. Atualmente, no primeiro ano desse governo Lula (PT), foram reservados R$ 46,3 bilhões para atender aos parlamentares. O aumento nesse tipo de verba dá mais poder às cúpulas da Câmara e do Senado, que usam as emendas para conquistar mais influência entre os parlamentares.

Além disso, há um cronograma para o Palácio do Planalto fazer alguns desses repasses. Essa medida é vista como uma forma de tirar poder da articulação política do Executivo.

"Na verdade, os investimentos do governo vão ser inferiores às emendas parlamentares", disse o deputado Lindbergh Farias (PT-RJ). "Os senhores tiraram R$ 17 bilhões do Executivo na mão grande", afirmou.

O petista se referia ao corte que foi feito no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e de outros projetos dos ministérios do governo Lula para que o Congresso conseguisse expandir as emendas. "O governo deveria ter mandado no Orçamento essas emendas e não mandou. Então a comissão teve que decidir de onde ia tirar", respondeu Motta.

O líder do governo na Comissão Mista de Orçamento, deputado Carlos Zarattini (PT-SP), disse que o acordo costurado foi necessário para balancear as agendas de Lula e do Legislativo.

"É muito contraditório. A gente enfrenta dificuldades enormes. O governo tem um foco. O Parlamento tem outros focos que, muitas vezes, têm que ser equilibrados. É isso que estamos fazendo, avançamos naquilo que é essencial", declarou Zarattini.

Existem três tipos de emendas: as individuais (que todo deputado e senador têm direito), as de bancada (parlamentares de cada estado definem prioridades para a região), as de comissão (definida por integrantes dos colegiados do Congresso).

Líderes do Congresso admitem que as emendas de comissão vão funcionar como as extintas emendas de relator, que eram a principal moeda de troca nas negociações do governo Bolsonaro e do Legislativo. O mecanismo das emendas de relator, porém, foi derrubado pelo STF no fim do ano passado.

Em 2022, as emendas de comissão representaram apenas R$ 330 milhões. Para 2024, o Congresso prevê R$ 16,6 bilhões.

De olho nessa verba, partidos políticos travaram um embate nessa quinta em relação à divisão desse dinheiro entre as comissões da Câmara e do Senado. Isso atrasou a votação do Orçamento.

"Não temos a mínima condição de apoiar qualquer projeto com R$ 800 mil", reclamou o senador Carlos Viana (Podemos-MG), que preside a comissão de Ciência e Tecnologia do Senado. Ele citou que a Comissão de Desenvolvimento Regional terá R$ 4,5 bilhões e a CCJ, de Constituição e Justiça, R$ 800 milhões –essa última é comandada por Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), um dos campeões do envio de emendas no Congresso.

Auxiliares de Lula estão preocupados com as medidas aprovadas pelo Congresso, que reduzem ainda mais o poder do presidente nas negociações políticas com deputados e senadores.

Uma delas trata de impor a Lula um cronograma para que o governo libere o dinheiro de emendas para as obras e municípios escolhidos pelos parlamentares.

Isso reduzir a margem de manobra para acordos em momentos decisivos no plenário da Câmara e do Senado.

Hoje não existe uma previsão de quando a emenda será autorizada e, historicamente, os governos usam isso como moeda de troca em negociações com o Congresso. É comum haver um grande volume desses repasses às vésperas de votações de interesse do Palácio do Planalto.

Outra mudança aprovada no Orçamento enfraquece o ministro-chefe da Secretaria de Relações Institucionais, Alexandre Padilha (PT), que cuida da articulação política.

O Congresso quer encurtar o caminho para o governo liberar algumas emendas parlamentares. Por isso, há a previsão de que os parlamentares informem diretamente a cada ministério qual será o projeto ou obra financiado com o dinheiro da emenda.

Atualmente, Padilha foi empoderado por Lula, que determinou que essa comunicação fosse concentrada na Secretaria de Relações Institucionais. O ministro então se encarrega de repassar os pedidos a cada pasta.

A demora nos repasses das emendas foi recorrente ao longo desse ano entre os líderes do centrão e outros partidos do Congresso.

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