Gleisi critica aumento de emendas e diz que Congresso pode engolir o governo

Líderes da Câmara e Senado querem subir o controle do Orçamento em emendas para cerca de R$ 50 bilhões

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Brasília

A presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, disse neste sábado (9) que tentará impedir o aumento das emendas parlamentares em articulação pela cúpula do Congresso.

"Isso é uma barbaridade. É uma transferência da execução orçamentária do Executivo para o Congresso Nacional, logo o Congresso Nacional que está discutindo que não quer tanto poder para o STF e aí está se apoderando da execução. E também um calendário de execução de emendas."

Gleisi chamou a jogada da cúpula do Legislativo como uma "assanha de aumentar emendas parlamentares". Ela participou de encontro nacional do partido, em Brasília.

A deputada federal Gleisi Hoffmann no encontro do PT neste sábado (9), em Brasília - Divulgação PT

Um artigo incluído na LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2024 amplia ainda mais o poder do Congresso sobre o Orçamento do ano que vem. Se aprovado, pode elevar o montante total das emendas para um valor recorde, próximo a R$ 50 bilhões.

"Eu acho que tem que ter bom senso nisso. Eu sou absolutamente contra. Acho que o Congresso participa bastante. Já tem bastante emenda", disse Gleisi. "Vamos tentar [derrubar isso]. Não sei se vamos conseguir, porque ali tem interesse próprio da Casa", completou.

As emendas são uma forma com que deputados e senadores conseguem enviar dinheiro para obras e projetos em suas bases eleitorais e, com isso, ampliar o capital político. Como mostrou a Folha, a prioridade do Congresso é atender seus redutos eleitorais, e não as de maior demanda do país.

Há três tipos de emenda: as individuais (que todo deputado e senador têm direito), as de bancada (parlamentares de cada estado definem prioridades para a região) e as de comissão (definida por integrantes dos colegiados do Congresso).

Ao carimbar esse dinheiro para emendas, o governo poderá perder verba para o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) e para o Ministério da Saúde. O PAC é a principal vitrine de Lula na área de infraestrutura.

Gleisi também confirmou que não tem planos de assumir cargo em ministério. "Eu tenho compromisso com ele [Lula], com o PT, com nossa direção, de ficar no PT até 2025, que é o mandato que nós acertamos. Tem as eleições agora, tem os desafios, temos que deixar o partido muito organizado para encarar 2026", afirmou neste sábado.

No mesmo evento, a presidente do PT chegou a citar o risco de o apoio a Lula cair caso o cenário econômico se deteriore, o que se refletiria no comportamento dos parlamentares. "Se cair a popularidade do presidente, vocês não tenham dúvida do que o Congresso vai fazer. Fizeram com a Dilma", afirmou. "Se baixar a popularidade do presidente, esse Congresso engole a gente", disse.

O Datafolha mostrou nos últimos dias que, na reta final de seu primeiro ano de mandato, o Lula manteve sua avaliação estável. O petista fecha 2023 com 38% de aprovação dos brasileiros, enquanto 30% consideram seu trabalho regular, e o mesmo número, ruim ou péssimo.

O evento do PT em Brasília, que começou na sexta (8), teve várias discussões sobre a melhoria na comunicação do partido com o eleitorado.

A preocupação, externada diante da proximidade do calendário de disputas municipais, foi citada por ministros do governo e integrantes do partido. O próprio presidente Lula quer que o partido ajuste o discurso para aproximar evangélicos, agronegócio e outros setores que abraçaram o bolsonarismo.

O ministro Fernando Haddad (Fazenda) também apontou a necessidade de ajustes na comunicação, considerando que já houve um trabalho de expansão de gastos públicos necessário para resgatar programas que beneficiam diretamente a população.

Para o chefe da equipe econômica, um dos exemplos é o investimento público em rodovias federais neste ano –que, segundo ele, superam o valor desembolsado em todos os quatro anos da gestão Bolsonaro.

"Não tem conversa. Não tem comparação. Agora nossa disputa é de comunicação, mas tem uma dimensão ideológica que a gente precisa compreender. Tem uma parte da população que não está aberta a ouvir e está muito colada ao debate negacionista", discursou o ministro.

O ministro Alexandre Padilha (Relações Institucionais) afirmou que, em algumas cidades, o partido vai enfrentar "o suco do bolsonarismo". "É o cara do ódio, da rede social. O cara da intolerância religiosa, do machismo, da agressão, da violência. Nós temos que derrotar essa política eleitoralmente, para mostrar que eles não se criam mais no Brasil", disse.

O ministro Silvio de Almeida, dos Direitos Humanos, vê como relevante a conquista das prefeituras para a defesa de bandeiras históricas e defende um discurso que dê esperança aos trabalhadores brasileiros –que, para ele, vivem uma rotina sem otimismo e são facilmente capturados por discursos radicais.

"A gente precisa oferecer esperança para as pessoas. E isso significa que vamos ter que mudar a condução da nossa vida política, institucional, nossa forma de nos organizarmos e pensar no Brasil que a gente pode e merece ter", afirmou.

Procurado, o ministro Paulo Pimenta (Comunicação Social) afirmou à Folha que não há ilusão de que no primeiro ano de governo iria "colher estratégia de comunicação".

"O primeiro ano foi para reconstruir. Estava tudo destruído. Não tinha contrato, transparência, planejamento", disse.

A secretária de Finanças do PT, Gleide Andrade, disse que a conferência reuniu 5.300 participantes –a expectativa inicial era de 2 mil pessoas.

O objetivo foi reunir em Brasília os pré-candidatos a prefeitos, vereadores, vices, coordenadores de campanha e dirigentes partidários para tratar do cenário político e de como os representantes locais podem defender o governo nas cidades.


Entenda as emendas parlamentares e seu uso

O que são emendas?
Emenda é a forma que deputados e senadores conseguem enviar dinheiro para obras e projetos em suas bases eleitorais e, com isso, ampliar o capital político

Quais os tipos de emendas?
Hoje existem três tipos: as individuais (que todo deputado e senador têm direito), as de bancada (parlamentares de cada estado definem prioridades para a região) e as de comissão (definida por integrantes dos colegiados do Congresso)

Veja a cronologia das emendas parlamentares

Antes de 2015

  • A execução das emendas parlamentares era uma decisão política do governo, que poderia ignorar a destinação apresentada pelos congressistas.

2015

  • A emenda constitucional 86/2015 estabeleceu a execução obrigatória das emendas individuais, o chamado orçamento impositivo, com algumas regras.

2019

  • O Congresso ampliou o orçamento impositivo ao aprovar a emenda constitucional 100, que tornou obrigatórias também as emendas de bancadas estaduais
  • O Congresso emplacou um valor expressivo para as emendas feitas pelo relator-geral do Orçamento, R$ 30 bilhões para o ano seguinte
  • Jair Bolsonaro vetou a medida e o Congresso só não derrubou o veto mediante acordo que manteve R$ 20 bilhões nas mãos do relator-geral
  • Bolsonaro também deu uma autonomia completa para a cúpula do Congresso decidir para onde todo esse montante seria destinado

2020

  • Com o acordo de 2019, feito por Bolsonaro para manter uma base de apoio no Congresso, o valor destinado às emendas deu um salto e chegou a R$ 44 bilhões.

2022

  • O STF (Supremo Tribunal Federal) declarou inconstitucional a emenda de relator. A verba foi rebatizada e transferida ao orçamento dos ministérios, mas o governo Lula driblou a decisão e manteve o uso político dos recursos —há, em 2023, R$ 9,8 bilhões reservados para esse tipo de negociação

2023

  • Cada deputado teve R$ 32 milhões em emendas individuais (senadores, R$ 59 milhões), valores que têm execução obrigatória e que em alguns casos podem mais que dobrar em decorrência das emendas de bancadas e das "emendas extras"
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