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Raquel Lyra afaga Lula, defende Dino e diz sentir machismo na política

Governadora de Pernambuco afirma, em entrevista à Folha, ser a favor de PSDB independente em relação ao governo federal

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Recife

A governadora de Pernambuco, Raquel Lyra (PSDB), defendeu em entrevista à Folha que o PSDB fique independente em relação ao governo federal, ou seja, que não vá para a oposição a Lula (PT).

A tucana afirmou que o primeiro ano do terceiro mandato de Lula deu "apontamento para políticas públicas fundamentais".

Raquel disse que é cedo para falar sobre a possibilidade de se aliar ao presidente para 2026 e que não tem intenção de sair do PSDB atualmente.

Também afirmou que sente o machismo constantemente durante a atuação política como governadora. "Penso que quem fala, faz, age dessa forma, muitas vezes nem é de maneira consciente. Mas o mais importante de tudo agora é que consigo falar sobre isso. Por muito tempo, não consegui."

A governadora elogiou a indicação de Flávio Dino (PSB) para o STF (Supremo Tribunal Federal). "Ele tem uma trajetória anterior que o credencia a ocupar qualquer tipo de cargo."

Raquel Lyra com roupa branca e preta sentada em uma cadeira no gabinete da governadora no Palácio do Campo das Princesas
A governadora de Pernambuco, Raquel Lyra (PSDB), durante entrevista à Folha no Palácio do Campo das Princesas - Hesíodo Góes/Governo de Pernambuco

Como a sra. avalia o primeiro ano do seu governo?
É o ano mais desafiador de todos, porque é de mudança e arrumação de casa. Pegamos um governo devedor e quitamos mais de R$ 1,6 bilhão em débitos, na virada do ano. Passamos o ano inteiro buscando recursos, realinhando metas, prioridades e redefinindo as estratégias para a partir do ano que vem iniciar um processo de aceleração.

O governo teve embates com a Assembleia Legislativa, sofreu derrotas em votações, e a relação com o presidente da Casa, Álvaro Porto, não é a mesma do começo do ano. A que a sra. atribui esses embates com o Legislativo?
Fazer mudança implica também uma nova forma de fazer política, de lidar com os Poderes. A gente faz política de um jeito diferente. Temos um princípio da independência dos Poderes. A gente tem um diálogo permanente, não só comigo pessoalmente, com o presidente da Casa, mas sobretudo do nosso governo com o Poder Legislativo, na busca de aprofundar os debates.

A sra. considera acertada a decisão da Assembleia de antecipar a eleição que reelegeu o presidente da Casa para 2025/26?
Essa é uma decisão dos deputados, e a gente tem que respeitar essas decisões porque eles têm autonomia. O presidente foi reeleito de maneira legítima. Nada interfere na forma com que a gente vai lidar com a Assembleia.

Sobre a questão partidária, a sra. pretende sair do PSDB?
Não tenho nenhum direcionamento nesse sentido. A gente tem uma discussão interna dentro do PSDB. Acabou de ser eleito o novo presidente do partido [Marconi Perillo]. Em relação ao posicionamento nacional do partido, defendo que o PSDB se posicione pela independência [em relação ao governo Lula], porque é um momento em que a gente precisa de muita cautela no Brasil.

A sra. já recebeu algum convite de outro partido para se filiar?
É natural que possam existir convites, até antes, durante, depois [da eleição], mas não vou disputar eleição no ano que vem, não tenho nenhum tipo de pressa. O meu entendimento primeiro de tudo é fazer uma construção interna para defender aquilo que acredito dentro do partido que me ajudou a estar aqui.

A sra. recusou esses convites ou não respondeu?
Se estou aqui [no PSDB], é porque não fui para nenhum outro. Agradeci, mas estou aqui.

Qual a sua avaliação do governo Lula e, na sua visão, quais são os principais problemas do governo federal?
O governo federal tem desafios importantes a serem superados. Do ponto de vista nacional, tem a necessidade de votação da Reforma Tributária. Primeiro ano é sempre ano de arrumação da casa. Acho que ele tem projetos importantes já que a gente pode celebrar. Teve o Bolsa Família, o Minha Casa Minha Vida, um espaço fiscal para investimento em rodovias. Acho que a gente já tem apontamento para políticas públicas fundamentais.

Existe um desafio na política também, de poder aprovar os projetos que são colocados. Ele [Lula] está em processo de negociação, todo mundo assiste a isso. E eu espero que ele possa alcançar a estabilidade necessária.

O líder do governo na Assembleia, Izaías Régis, disse que há chances de uma aliança futura da sra. com o presidente Lula. Há possibilidade?
Está cedo para a gente falar sobre isso. Não sou candidata agora. O que posso dizer até aqui é que a gente tem construído uma relação consistente com o governo federal.

Diante dessa relação que tem tido com o presidente Lula, a sra. teme que o PL se afaste da base aliada do governo estadual?
Construir alianças é fundamental para a gente poder garantir governança, e o PL faz parte disso.

A sra. gostou da indicação do ministro da Justiça, Flávio Dino, para o STF?
O ministro Flávio Dino tem uma trajetória anterior que o credencia a ocupar qualquer tipo de cargo, inclusive de ministro do Supremo. Espero que, escolhido, ele possa ter a temperança que teve ao longo de quando pude, de perto, trabalhar junto com ele, para poder assumir um papel importante lá, substituindo uma ministra [Rosa Weber] que conseguiu prestar muito serviço ao Brasil. E que ele, se for escolhido, possa fazê-lo também.

A sra. acha que o TSE puniu com justiça o ex-presidente Jair Bolsonaro ao declarar a inelegibilidade?
Não me cabe fazer qualquer tipo de comentário sobre isso. Decisão judicial sempre aprendi que se cumpre.

O seu grupo político pretende definir quando o candidato à Prefeitura do Recife?
A gente tem trabalhado para que haja candidaturas competitivas e que representem, de fato, o desejo de mudança que o estado inteiro de Pernambuco quer e precisa. Aliados que possam nos ajudar a chegar na vida dos invisíveis. Eleição de 2024 se fala em 2024.

Como avalia a gestão do prefeito do Recife, João Campos?
Na verdade, a avaliação se faz pela população. A gente precisa garantir que investimentos existam no município do Recife e tem buscado trabalhar para fazer com que isso seja realidade.

No ano passado, o seu marido faleceu no dia do primeiro turno das eleições. A sra. pensou em desistir da candidatura ao governo após aquele momento?
Olhando para trás agora, eu me recordo muito pouco. Tenho lapsos de memória daqueles momentos. Não consigo nem fazer uma retrospectiva sobre os dias que foram entre o primeiro e o segundo turno, do segundo turno para a transição e chegar ao governo. Busco forças nos meus filhos, na família e em pessoas que nem sei o nome mas dizem que estão nos apoiando.

Como é que tem sido ser mãe e governadora?
Precisa ser mulher para entender o que a gente passa todos os dias. Fazer política é ainda mais difícil. A gente sofre assédio moral todos os dias. Violência política todos os dias. Existe um machismo estrutural. Até penso que quem fala, faz, age dessa forma, muitas vezes nem é de maneira consciente. Mas o mais importante de tudo agora é que eu consigo falar sobre isso. Por muito tempo, não consegui.

Quanto ao machismo, em quais momentos sentiu isso durante o período no governo?
Em vez de individualmente, a gente pode falar de maneira genérica que isso acontece todo dia, que não é incomum, de haver certa dificuldade de as pessoas entenderem, de maneira geral, que hoje uma mulher ocupa a liderança do governo.

Então, [acontece] quando a gente fala de assédio moral, quando a gente fala de adjetivos que não usam para homens e muito fortemente usam para mulheres, quando falam de que existe ansiedade, que existe incapacidade de diálogo, quando se não dialoga aquilo que se quer ouvir, por exemplo.

Tem alguma perspectiva sobre a promessa de estadualizar o metrô do Recife, atualmente sob comando do governo federal?
A gente tem discutido, semanalmente, com o BNDES, sobre concessão do metrô com o governo federal.

Acredita que sai em 2024 a solução?
Tem que sair. Primeiro, tem que colocar dinheiro agora já na CBTU e para poder recompletar vagões, melhorar a infraestrutura, inclusive dos terminais. E, ao lado disso, a gente poder ir modelando o governo federal e tomar a decisão daquilo que será a solução para o metrô junto com a gente.

A sra. acha que o atraso do governo em dois meses para apresentar o plano de segurança pública contribuiu para o aumento das mortes violentas no estado?
O que contribuiu fortemente para esse cenário foi um desinvestimento em segurança pública muito forte ao longo dos outros anos. Precisamos da reestruturação do sistema penitenciário, negligenciado e condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.

O STF acabou emitindo uma decisão pelo ministro [Edson] Fachin de que um dia no presídio do Complexo do Curado fosse equivalente a dois dias. E, com isso, houve uma soltura de presos de diversos perfis criminológicos por conta de falta de ação do Governo de Pernambuco ao longo dos anos, com obras paralisadas, com dinheiro em caixa dos presídios.

A gente vai contratar mais de 4.000 homens e mulheres para Corpo de Bombeiros e polícias Militar, Civil e Científica, além de fortalecer a inteligência policial, a prevenção social. Temos R$ 1 bilhão de investimentos em segurança pública garantidos para os próximos anos.

Opositores dizem que, agora que a sra. está governando, tem que resolver o problema. Como a sra. retruca essas críticas?
Não tenho que retrucar ninguém, tenho que dar resposta para o povo. A gente pegou um estado sem recursos para investir, mas não ficou aqui reclamando nem chorando, a gente foi trabalhar.


RAIO-X | RAQUEL TEIXEIRA LYRA LUCENA, 45

Governadora de Pernambuco, é formada em direito pela UFPE (Universidade Federal de Pernambuco). Exerceu a função de delegada da Polícia Federal e é procuradora do estado de Pernambuco. Foi deputada estadual entre 2011 e 2016 pelo PSB. Também exerceu a função de secretária de Criança e Juventude de Pernambuco entre 2011 e 2012, no governo Eduardo Campos. Em 2016, filiou-se ao PSDB e foi eleita prefeita de Caruaru, tendo sido reeleita em 2020. É filha do ex-governador João Lyra Neto (PSDB), que governou o estado em 2014 pelo PSB, após a renúncia de Eduardo Campos

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