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Moraes chama PEC das decisões monocráticas de irreal e defende delação de Cid pela PF

Magistrado se diz muito feliz com Dino e Gonet, mas afirma que ministro do STF não se mete em indicação

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Brasília

O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), criticou a chamada PEC (proposta de emenda à Constituição) das decisões monocráticas, que limita a atuação individual de magistrados desta e de outras cortes do país.

Em entrevista à Folha, Moraes defendeu a importância das deliberações individuais para o sistema judicial, citando o exemplo hipotético de uma medida provisória que permitisse a crianças a partir de 12 anos comprar fuzis.

"Uma coisa é o relator dar a liminar: suspende imediatamente e coloca para referendar. Mesmo que um ministro peça vista, outro peça vista, nenhuma criança vai comprar a arma. Agora, se passa essa PEC, o relator não pode suspender. Aí o relator coloca imediatamente com o seu voto para derrubar a medida provisória. Um ministro pede vista, 90 dias. Quando devolve, outro ministro pede vista, mais 90 dias. Nesses 180 dias, quantas crianças de 12 anos vão comprar fuzis?", questionou.

O ministro do STF e presidente do TSE, Alexandre de Moraes, em seu gabinete, no TSE - Pedro Ladeira/folhapress

Aprovada em novembro pelo Senado –e atualmente em tramitação na Câmara–, a PEC estabelece prazos para os pedidos de vista nos julgamentos colegiados do Poder Judiciário e determina que decisões individuais não podem suspender leis aprovadas no Congresso e outras casas legislativas e sancionadas pelo Executivo. Para isso ocorrer, apenas com decisão colegiada.

Só o presidente do STF ficaria autorizado a dar decisões sozinho no período do recesso do Judiciário. Ainda assim, seria obrigado a colocar o tema em análise pelo plenário da corte em até 30 dias.

Hoje os ministros podem dar decisões monocráticas sobre qualquer tema e anular por meio de liminares qualquer lei em âmbito federal, estadual ou municipal. A decisão é incluída automaticamente na pauta da próxima sessão virtual, segundo mudança no regimento do Supremo consumada em 2022 sob a presidência da então ministra Rosa Weber.

"Com todo respeito àqueles que defendem, é algo muito irreal. Porque acaba ferindo o próprio poder geral de cautela do juiz. Nós já alteramos o nosso regimento para que toda liminar seja imediatamente referendada pelo plenário. Aí sim, porque é um órgão colegiado. A força do Supremo é a força do conjunto dos seus membros", disse Moraes.

O ministro ressaltou que a PEC não tem relação com o 8 de Janeiro, "porque se prevê a necessidade de uma liminar colegiada para afastar a constitucionalidade ou ainda para afastar atos da presidência das Casas e do presidente da República", mas usou um exemplo daquele episódio para descrever a importância do instituto da liminar no processo judicial.

"No caso de urgência, o relator dá a liminar e aí imediatamente coloca para referendar. Como eu fiz no dia 8 de janeiro, do dia 8 para o dia 9, eu determinei as medidas, e, no dia 9 para o dia 10, o Supremo as referendou. Ora, imagine se não pudesse dar uma liminar, vamos esperar o golpe se concretizar até o plenário. Isso não é Justiça, e eu tenho certeza que o Congresso Nacional vai saber analisar essas questões."

"O que nós queremos todos", acrescentou, "nós e o Congresso, é que o posicionamento do Supremo seja colegiado. Mas não podemos inverter a ordem natural das coisas".

Moraes reiterou seu apoio à delação do tenente-coronel Mauro Cid fechada pela Polícia Federal e relativizou a avaliação do procurador Carlos Frederico Santos –coordenador do Grupo Estratégico de Combate aos Atos Antidemocráticos da PGR (Procuradoria Geral da República) e responsável pelas denúncias do 8/1– de que a peça é fraca.

"A PF realizou a delação, os requisitos legais todos estavam presentes, eu mesmo determinei que o meu juiz instrutor fizesse audiência para saber da voluntariedade do delator em realmente realizar aquela delação, a audiência foi gravada para garantir que ele não estava sendo pressionado, e a partir daí ele vem apresentando as provas, como se faz em toda delação", disse Moraes.

"O doutor Carlos Frederico disse isso num primeiro momento, depois disse que lhe competia procurar provas que corroborassem a delação. A delação é válida, o delator tem a obrigação legal de apontar provas que confirmem a delação, sob pena de não ter efeito nenhum. Se o delator não apontar provas, se não comprovar aquilo que disse, a sua delação não terá efetividade. O Ministério Público já pediu uma série de diligências para reforçar o que vem escrito na delação e acredito que em pouco tempo esse inquérito já esteja concluído."

Questionado se o ruído se deveu ao fato de a delação ter sido fechada pela Polícia Federal e não pelo Ministério Público Federal, Moraes declarou: "Há um problema mais corporativo do que institucional na questão de quem pode realizar colaborações premiadas. Falo isso com muita tranquilidade porque fui membro do Ministério Público, fui promotor de Justiça de São Paulo por mais de dez anos, atuei também na Secretaria de Segurança, então atuei junto às polícias e votei na decisão de Supremo que, por 10 a 1, determinou que a polícia pode realizar [delações]. Então não é exclusividade do Ministério Público a realização da delação".

O magistrado considerou como "muito bom até agora" o trabalho do procurador Carlos Frederico Santos, mas não quis prever se ele será mantido na função após a troca de comando na PGR (sai Augusto Aras, assumirá Paulo Gonet).

"As denúncias foram oferecidas rapidamente, ele fez essa investigação muito bem feita e continua na instrução criminal em relação à atuação da Polícia Militar, vem investigando os financiadores… É uma atuação profissional e competente. Agora, se ele deve ou não ser mantido, aí depende do procurador-geral e eventualmente, se ele for convidado, dele."

A propósito de Gonet, Moraes voltou a elogiar as indicações do procurador para a PGR e de Flávio Dino para o Supremo.

"Acho que são dois agentes públicos lato sensu, de alto gabarito, tanto o professor Paulo Gonet quanto o Flávio Dino, eu os conheço há muito tempo. Tenho uma amizade com o ministro Flávio Dino desde 2005, eu conselheiro do Conselho Nacional de Justiça, o ministro Flávio Dino era juiz assessor do então presidente do CNJ, o ministro [Nelson] Jobim, então de lá ficamos amigos, é uma pessoa extremamente preparada, séria, que transita bem nos mundos jurídico e político, é importante essa experiência no Supremo", disse.

"Da mesma forma o professor Paulo Gonet. Por anos e anos participamos de congressos, fomos colegas em Ministério Público, ele do Federal, eu do Estado de São Paulo, nós dois somos constitucionalistas, escrevemos juntos e aqui no TSE trabalhou comigo esse tempo todo."

Moraes minimizou a influência dele (e do ministro Gilmar Mendes) nas escolhas de Lula: "Eu realmente fiquei muito feliz com as indicações, mas as indicações são do presidente da República. Ministro do Supremo e presidente do TSE não se mete em indicação".

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