Descrição de chapéu Folhajus TSE Meta

Post que implica Bolsonaro no 8/1 é recuperado e enviado ao STF

Ministério Público afirma que juntou relatório e vídeo em inquérito; Facebook não tinha enviado material

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São Paulo

A PGR (Procuradoria-Geral da República) encaminhou ao STF (Supremo Tribunal Federal) relatório e vídeo postado e apagado do perfil de Jair Bolsonaro (PL) no Facebook e que, segundo os investigadores, é fundamental para apresentar denúncia contra o ex-presidente por incitação aos atos do 8 de janeiro.

Em nota nesta sexta-feira (15), a PGR informou que juntou relatório de perícia, as imagens e as informações relativas à postagem nos autos do inquérito 4921, que apura a incitação a atos antidemocráticos.

Postado por Bolsonaro em 10 de janeiro, o vídeo em questão foi produzido por um terceiro e mostrava um homem identificado como Dr. Felipe Gimenez, que atacava a segurança das urnas eletrônicas. A publicação trazia ainda as frases "Lula não foi eleito pelo povo. Ele foi escolhido e eleito pelo STF e TSE [Tribunal Superior Eleitoral]".

Print da tela do perfil de Facebook do presidente Jair Bolsonaro. No vídeo, um homem apresenta teorias da conspiração contra a segurança das urnas eletrônicas.
Bolsonaro publica vídeo com fake news sobre eleições e depois apaga - Reprodução

Apesar de o vídeo ser posterior aos ataques de 8 de janeiro, ele foi utilizado no pedido da PGR para que Bolsonaro fosse incluído no inquérito que apura a instigação e autoria intelectual dos ataques golpistas que resultaram na depredação da sede dos três Poderes, em Brasília.

Em resposta ao Supremo, a Meta, dona do Facebook, havia informado não ter mais em seus servidores o conteúdo solicitado.

Em depoimento à Polícia Federal em abril, o próprio Bolsonaro não teria negado a publicação, mas sim alegou ter publicado o vídeo por engano, sob efeito de medicamentos. As justificativas foram dadas no âmbito do inquérito que mira os autores intelectuais dos ataques.

A PGR informou que a recuperação do vídeo vai viabilizar "a continuidade da persecução penal contra o ex-presidente Jair Messias Bolsonaro, bem como permitir apurar a responsabilidade da empresa Meta em relação à não preservação do conteúdo".

O relatório entregue ao Supremo diz que foi possível recuperar o vídeo a partir da plataforma Metamemo.

O site, que não tem relação com a dona do Facebook, havia capturado o post de modo automatizado enquanto ele ainda estava na conta de Bolsonaro e armazenou seu conteúdo junto a outras informações sobre a publicação.

O Metamemo se apresenta como um sistema criado para "coletar, armazenar, processar e visualizar as memórias de um perfil" nas principais redes sociais da internet, para uso por ativistas, jornalistas e pesquisadores. O projeto diz ter armazenado mais de 100 mil conteúdos produzidos por Bolsonaro e seus filhos desde fevereiro de 2022.

O uso de registros externos à Meta depende de validação de perícia para que eles sejam considerados como prova pelo Judiciário, segundo especialistas ouvidos pela Folha, porque é importante garantir a integridade do material.

Por isso, dizem eles, uma resposta enviada pela dona do Facebook seria a prova mais robusta de que o perfil de Bolsonaro de fato postou o conteúdo alvo de investigação.

O relatório da PGR diz que "há elementos suficientes para concluir que o vídeo salvo no arquivo" do Metamemo apresenta teor idêntico ao material compartilhado pelo ex-presidente em 10 de janeiro.

Nele, são citadas ainda reportagens da imprensa repercutindo o caso com reproduções do post apagado por Bolsonaro.

Marta Saad, advogada e professora de direito processual penal da USP, afirma que um ponto importante em relação a provas digitais é demonstrar que não houve adulteração. "Elas precisam de registros documentais que atestem que aquilo é alguma coisa confiável, íntegra, autêntica", diz.

José Antonio Milagre, perito especialista em crimes cibernéticos, diz que, durante uma eventual ação, esse tipo de prova pode ser alvo de questionamento pelas partes. Neste caso, o juiz pode nomear perito para análise técnica, o que pode envolver, por exemplo, um exame sobre a plataforma utilizada para fazer essa coleta.

Raquel Saraiva, advogada e presidente do Instituto de Pesquisa em Direito e Tecnologia do Recife, explica que um ponto mais delicado, para além da preservação do vídeo em si, é a comprovação de que a conta do ex-presidente foi quem fez a postagem.

Carlos Affonso Souza, advogado e diretor do ITS (Instituto de Tecnologia e Sociedade), avalia que o post capturado pela Metamemo pode vir a ser usado como um indício de prova e destaca que há ainda outros elementos, como a repercussão na imprensa e a própria reverberação na rede social a partir da publicação. "No caso específico do vídeo do Bolsonaro, me parece que os indícios de provas são abundantes", diz.

Nesta sexta, a PGR pediu ainda que fosse aberta uma petição específica para "providências cabíveis", em relação à conduta do ex-presidente e da própria Meta.

Uma controvérsia no caso é quanto à ordem de Moraes para que Meta fornecesse os dados em 48 horas, sob pena de multa no valor de R$ 100 mil por dia de descumprimento, que foi emitida no último dia 5 de dezembro, um dia depois de a PGR reiterar a solicitação do material.

Segundo os autos do processo, o material relativo à postagem já havia sido solicitado em janeiro pela PGR, quando Moraes determinou a preservação do conteúdo para posterior entrega. Em julho, a Procuradoria já tinha reforçado o pedido, desembocando em uma nova decisão de Moraes no início de agosto.

Em 17 de agosto, a Meta informou que não tinha sido intimada da decisão de janeiro e que não possuía mais o conteúdo em seus servidores. A informação foi repetida em 4 de dezembro.

Na decisão de 5 de dezembro, Moraes não toca no assunto, por exemplo, para rebater a empresa.

Ao mencionar a resposta da plataforma, o ministro se limita a afirmar: "Em resposta, a empresa Meta Platforms,INC. apresentou a petição eDoc. 2378", sem adentrar nos argumentos apresentados por ela.

Nesse ponto, os entrevistados avaliam que, confirmada a falta de intimação da ordem de preservação, não cabe multa no caso de a empresa afirmar não possuir mais o conteúdo.

Segundo a lei brasileira, não há uma obrigação para que as redes sociais guardem o conteúdo postado, salvo se houver uma ordem de preservação.

"Se é uma ordem de cumprimento impossível, me parece que essa sanção não é devida", diz Carlos Affonso.

Para Raquel Saraiva, a empresa "não tem como fazer prova de que não recebeu a intimação, mas o gabinete do ministro ou quem estava responsável por isso deve fazer prova de que, de fato, a Meta recebeu essa intimação".

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