AGU exonera de cargo de direção servidor que participou de reunião ministerial de Bolsonaro

Documentos mostram que advogado foi convocado para falar sobre ações vedadas a agentes públicos nas eleições, tema que acabou não sendo abordado

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Brasília

A AGU (Advocacia-Geral da União) exonerou nesta sexta-feira (16) de cargo de coordenador na Diretoria de Gestão e Cálculo da Procuradoria-Geral Federal do órgão o servidor que participou da reunião ministerial de Jair Bolsonaro (PL) de 5 de julho de 2022, ocasião em que foram feitas manifestações de teor golpista.

O órgão disse ainda que abriu uma "instrução preliminar, de natureza investigativa, para verificar se houve transgressão disciplinar" por parte do servidor.

Fachada do prédio da Advocacia-Geral da União, em Brasília - Rafa Neddermeyer-6.nov.2023/Agência Brasil

Adler Anaximandro Alves, que na época era secretário-geral de Consultoria da AGU, foi um dos integrantes da reunião, em que estava presente também o titular, Bruno Bianco —que deixou a AGU e hoje está na iniciativa privada.

No encontro, Bolsonaro e auxiliares discutem claramente cenários golpistas.

"Eu vou entrar em campo usando o meu Exército, meus 23 ministros (...) Nós não podemos esperar chegar 23, olhar para trás e falar: o que que nós não fizemos para o Brasil chegar à situação de hoje em dia?", afirmou Bolsonaro nessa reunião, segundo a transcrição feita pela PF.

O vídeo, segundo o inquérito, estava armazenado em um computador apreendido com Mauro Cid, então chefe da ajudância de ordens de Bolsonaro e hoje colaborador das investigações.

Adler não se pronuncia na reunião, apenas Bianco.

"A Advocacia-Geral da União (AGU) informa que abriu instrução preliminar, de natureza investigativa, para verificar se houve transgressão disciplinar na participação do procurador federal Adler Anaximandro de Cruz e Alves, então secretário-geral de Consultoria da AGU, na reunião ministerial do dia 05/07/22 em que foram mantidas discussões de teor golpista", disse o órgão, em nota.

A finalidade do procedimento, afirma, é reunir em até 60 dias "os elementos necessários à formação do juízo de convicção da autoridade competente para a instauração de eventual procedimento disciplinar".

Adler afirmou que ele próprio pediu a exoneração para poder elucidar melhor os fatos e apresentou à Folha documentos mostrando que ele foi convocado ao Palácio do Planalto no dia anterior da reunião para discutir a Cartilha da AGU que orienta agentes públicos sobre condutas vedadas durante o período eleitoral.

"Diante do fato da reunião ministerial do dia 5 de julho ter seguido pauta diversa e alongado para além do previsto, a apresentação da cartilha da AGU para qual eu estava destacado não foi realizada", afirma.

Os documentos apresentados por ele são cópias dos emails institucionais de convocação para reunião na Presidência para tratar do tema das vedações eleitorais, no dia 4 de julho —em que está escrito que haveria uma apresentação do tema a Bolsonaro, posteriormente—, e para a reunião ministerial do dia 5.

Adler afirma ainda que atuou em cumprimento do dever legal, que a AGU foi o primeiro órgão público federal a formalizar uma equipe de transição, coordenada por ele, e que "na gestão anterior a AGU sempre primou pelo respeito aos Poderes constituídos e às instituições democráticas brasileiras".

"Destaco, por fim, em especial pelo fato de ter uma trajetória profissional de mais de 20 anos como membro efetivo da AGU, tendo exercido funções estratégicas em todos os governos desde 2003, que assuntos delicados e complexos sempre foram e serão tratados em reuniões de alta cúpula, não cabendo aos membros da AGU fazer publicamente qualquer valoração pessoal sobre os assuntos profissionais que lhes são apresentados, haja vista o sigilo profissional".

A Polícia Federal deflagrou no último dia 8 a Operação Tempus Veritatis para apurar organização criminosa que teria atuado na tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado democrático de Direito. Bolsonaro é um dos alvos.

Ocorrida em um contexto de forte ofensiva do ex-presidente contra a lisura das urnas eletrônicas, a reunião da cúpula do governo contou com a presença, entre outros, do então chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), Augusto Heleno, do então ministro da Justiça, Anderson Torres, e do então ministro da Defesa, Paulo Sergio Nogueira.

"A descrição da reunião de 5 de julho de 2022, nitidamente, revela o arranjo de dinâmica golpista, no âmbito da alta cúpula do governo, manifestando-se todos os investigados que dela tomaram parte no sentido de validar e amplificar a massiva desinformação e as narrativas fraudulentas sobre as eleições e a Justiça eleitoral", escreveu Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), em sua decisão.

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