PF mira Bolsonaro, Valdemar, ex-ministros e militares em operação sobre tentativa de golpe

São alvos Heleno, Braga Netto e Anderson Torres, todos ex-ministros do ex-presidente da República

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Brasília

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), ex-assessores e aliados, incluindo militares de alta patente, foram alvo nesta quinta-feira (8) de uma operação da Polícia Federal que investiga uma tentativa de golpe de Estado para mantê-lo no poder após a derrota nas eleições para Lula (PT).

A operação é um dos principais reveses para Bolsonaro no cerco judicial que enfrenta desde que deixou a Presidência, em dezembro de 2022.

Policiais vestidos de uniforme preto caminham por estacionamento de prédio com malas e malotes
Policiais federais saem da casa do general Heleno após operação de busca e apreensão - Pedro Ladeira/Folhapress

O ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), escreveu em sua decisão que está "comprovada a materialidade" dos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado democrático de Direito e de tentativa de golpe de Estado. Além disso, Bolsonaro fica impedido de sair do país e de manter contato com aliados como Valdemar Costa Neto, presidente de seu partido.

O procurador-geral da República, Paulo Gonet, concordou com a maior parte das medidas solicitadas pela Polícia Federal para a operação desta quinta-feira. Gonet, porém, não viu a necessidade de impedir Valdemar de se comunicar com outros investigados e a proibição de viajar para fora do Brasil. O presidente do PL, porém, acabou preso por posse ilegal de arma.

Bolsonaro estava em sua em Angra dos Reis (RJ), onde a PF apreendeu o celular de um de seus assessores, Tercio Arnaud Thomaz. Houve ainda a determinação para que o ex-mandatário entregasse seu passaporte —o documento estava na sede do PL, em Brasília, e foi entregue aos policiais.

Entre os atingidos pelas medidas de busca e apreensão estão os ex-ministros Augusto Heleno, Braga Netto, Anderson Torres e Paulo Sérgio Nogueira. Heleno, Braga Netto e Paulo Sérgio são generais. Outros militares também foram alvo da operação

Foram presos os ex-assessores de Bolsonaro Marcelo Câmara e Filipe Martins. Militar, Câmara já era investigado no caso da fraude ao cartão de vacinação do ex-presidente. Já Martins foi assessor para Assuntos Internacionais da Presidência da República.

Também foram alvo de mandado de prisão os militares Rafael Martins e Bernardo Romão Correa Neto.

Na sua decisão, Moraes afirma que Bolsonaro teve acesso e pediu modificações em uma minuta do golpe que lhe teria sido apresentada por Filipe Martins. "Os elementos informativos colhidos revelaram que Jair Bolsonaro recebeu uma minuta de decreto apresentado por Filipe Martins [então seu assessor] e Amauri Feres Saad para executar um golpe de Estado, detalhando supostas interferências do Poder Judiciário no Poder Executivo."

Bolsonaro já foi condenado pelo TSE por ataques e mentiras sobre o sistema eleitoral e é alvo de diferentes outras investigações no STF. Ele está inelegível até 2030.

A operação da PF desta quinta recebeu o nome de Tempus Veritatis. O objetivo é apurar organização criminosa que teria atuado na tentativa de golpe de Estado e abolição do Estado democrático de Direito.

As informações que embasaram a operação foram coletadas nas investigações no âmbito do inquérito das milícias digitais, que corre no STF, e na delação de Mauro Cid.

As mensagens analisadas pela PF apontam, segundo Moraes, que em novembro de 2022 Bolsonaro abandonou a ideia de aceitar a derrota nas urnas para "analisar a possibilidade de 'virada de jogo', como defendido por alguns militares, empresários e integrantes de seu governo".

Durante a busca e apreensão na sede do PL, os policiais encontraram, no gabinete de Bolsonaro, um documento não assinado com justificativa para a decretação de estado de sítio no país.

"Afinal, diante de todo o exposto, e para assegurar a necessária restauração do Estado Democrático de Direito no Brasil, jogando de forma incondicional dentro das quatro linhas, com base em disposições expressas da Constituição Federal de 1988, declaro o estado de Sítio (sic) e, como ato contínuo, decreto operação de garantia da lei e da ordem", diz o texto.

O documento é similar a um encontrado no celular de Cid ainda em 2023.

Em nota divulgada na noite de quinta, a defesa de Bolsonaro afirma que o texto encontrado estava originalmente no aparelho de Cid apreendido ainda no ano passado, e que os advogados do ex-presidente tiveram acesso aos arquivos por eles serem elementos da investigação.

Bolsonaro, segundo a defesa, desconhecia o conteúdo das minutas encontradas no aparelho de Cid e pediu aos advogados que as encaminhassem para seu aparelho.

"A fim de facilitar a leitura do texto, o ex-presidente fez a impressão em papel do referido arquivo", afirma a defesa de Bolsonaro, em nota. "O fato de só ter tido conhecimento do conteúdo do referido documento através de seu advogado em outubro p.p. [por procuração], somente deixa assente sua distância de qualquer empreitada ilegal", dizem ainda os advogados.

Segundo a PF, as investigações apontam que o grupo investigado se "dividiu em núcleos de atuação para disseminar a ocorrência de fraude nas Eleições Presidenciais de 2022, antes mesmo da realização do pleito, de modo a viabilizar e legitimar uma intervenção militar, em dinâmica de milícia digital".

Os documentos da operação também mostram que Cid e outras pessoas monitoraram a agenda e o deslocamento de Moraes. Segundo a polícia, o objetivo era que o ministro fosse preso assim que ocorresse o golpe de Estado.

Cid também deu orientações em suas conversas sobre onde manifestantes golpistas deveriam fazer os seus atos.

Mensagens obtidas pela Polícia Federal mostram ainda que Braga Netto teria chamado o então comandante do Exército, Marco Antônio Freire Gomes, de "cagão" por não aderir à tentativa de golpe.

Em outras conversas, o general incentiva críticas ao então comandante da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Júnior, a quem se refere como "traidor da pátria". De acordo com a PF, as mensagens foram enviadas por Braga Netto para Ailton Barros, capitão expulso do Exército que estimulava um golpe militar em conversas com Cid.

O plano para reverter a derrota eleitoral e efetuar o golpe foi discutido em mensagens e reuniões em novembro e dezembro de 2022, segundo a PF.

De acordo com os planos dos golpistas, a prisão de Moraes ocorreria no dia 18 de dezembro daquele ano.

A decisão do ministro do STF também relata que a PF está de posse de um vídeo de uma reunião ministerial de Bolsonaro de julho de 2022. Na ocasião, ele e auxiliares discutem cenários golpistas.

Após Bolsonaro levantar a suspeita de que ministros do STF e TSE estivessem ganhando propina para fraudar as eleições, segundo a transcrição, a palavra é dada a Heleno, então ministro do GSI (Gabinete de Segurança Institucional).

"A existência do ilícito Núcleo de inteligência paralela também fica demonstrada nessa reunião, na fala do investigado Augusto Heleno", prossegue Moraes em sua decisão.

Ele então relata que o então chefe do GSI falou ter tido conversa para a infiltração de agentes da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) nas campanhas eleitorais, tendo sido interrompido por Bolsonaro no sentido de que o assunto fosse tratado posteriormente.

Heleno, segundo a transcrição, prossegue, com uma fala golpista: "Não vai ter revisão do VAR. Então, o que tiver que ser feito tem que ser feito antes das eleições. Se tiver que dar soco na mesa é antes das eleições. Se tiver que virar a mesa é antes das eleições.

Uma semana após a posse do presidente Lula (PT), no dia 8 de janeiro de 2023, um grupo de apoiadores de Bolsonaro invadiu e depredou as sedes dos três Poderes, em Brasília.

Milhares desses manifestantes vestidos de verde e amarelo estavam acampados diante do quartel-general do Exército e rumaram naquele dia para a Esplanada dos Ministérios.

Em poucas horas, destruíram o patrimônio público vandalizando áreas internas dos prédios —o Palácio do Planalto, o Congresso Nacional e o STF .

Depois do ocorrido, uma intervenção federal foi instaurada pelo presidente Lula, centenas foram presos, incluindo autoridades, e outros estão sendo investigados. O STF já aceitou a denúncia contra mais de 1.200 acusados, o que os levou à condição de réus.

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