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Mulheres representam 9% dos chefes de ministérios no Brasil em quase 40 anos

42 ministras chegaram ao alto escalão desde o governo Sarney; MEC teve apenas homens

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Rio de Janeiro

Desde a redemocratização do Brasil, em 1985, 42 mulheres assumiram o comando de ministérios no governo federal. No mesmo período, homens que atingiram o mesmo cargo somaram quase dez vezes mais: 444, o equivalente a 91,4% do total.

O MEC (Ministério da Educação), por exemplo, nunca teve uma mulher à frente nesses quase 40 anos. Tanto o da Fazenda (ou Economia, como foi chamado em dois governos) quanto o da Saúde viram apenas uma cada um: Zélia Cardoso de Mello e Nísia Trindade.

Os dados foram compilados por Laura Angélica Silva, doutora em administração pública e governo pela FGV (Fundação Getulio Vargas), e publicados no fim do ano passado no portal do Instituto República.org, voltado à gestão de pessoas no setor público.

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Zélia Cardoso de Mello, acompanhada dos assessores, Antonio Kandir (à esquerda) e Ibrahim Eris (à direita), anuncia o Plano Collor - Jorge Araújo - 16.mar.1990/Folhapress

A pesquisadora coletou no portal da Presidência da República registros de quem foi nomeado e exonerado. Depois, confirmou as informações no Diário Oficial. Quem ocupou pastas interinamente ficou de fora do levantamento.

Ao todo, mulheres ocuparam ministérios 57 vezes, enquanto homens, 603 —8,6% e 91,4% respectivamente. Esse dado considera que uma mesma pessoa pode ter ocupado o posto mais de uma vez, a exemplo de Marina Silva (Rede), inclusive em diferentes pastas, como Dilma Rousseff (PT) e Marta Suplicy (PT).

José Sarney (MDB), Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Michel Temer (MDB) tiveram uma ministra durante seus governos —no segundo mandato de FHC, não houve nenhuma ministra.

Fernando Collor (à época no PRN) nomeou duas, Itamar Franco, três, e Jair Bolsonaro (PL), quatro.

O primeiro mandato de Dilma reuniu 12 ministras, o maior número da série —Ideli Salvatti comandou três diferentes pastas à época.

Em seguida, vem a atual gestão de Lula (PT), que chegou a 11. Com a saída de Ana Moser do Ministério do Esporte e de Daniela Carneiro de Turismo, em 2023, o total caiu para nove.

Na avaliação de especialistas, a falta de representação feminina na política é o principal motivo para a baixa presença de mulheres nas pastas. A formação de ministérios envolve negociações partidárias, processo em que elas são minoria.

"Algumas pastas têm orçamento tão alto que se respeita mais a dinâmica financeira do que a de execução de políticas públicas", afirma a autora do levantamento.

"A mobilização do orçamento é mais importante do que pensar se vai ter diversidade ou implementar políticas de forma coerente, porque pesquisas apontam que mulheres são mais preocupadas com determinados aspectos."

Segundo o trabalho de Laura, desde 1985, as pastas do Meio Ambiente e de Políticas para Mulheres tiveram mulheres no comando seis vezes, o maior número entre as demais. Em seguida, vem a de Assistência Social, com quatro vezes.

A área se tornou mais disputada por ganhar destaque após o primeiro mandato de Lula, de acordo com Ana Diniz, coordenadora do núcleo de estudos de diversidade e inclusão no Trabalho do Insper. Nos últimos três governos, foi chefiada por homens. A pasta passou por mudanças de nome, como no governo Bolsonaro, quando foi criado o Ministério da Cidadania.

O levantamento mostra ainda que, em primeiros mandatos, mulheres ficam por mais tempo no cargo do que os homens, enquanto, em segundos mandatos, eles são favorecidos.

Para Ana Diniz, isso está relacionado à maior influência que os governos sofrem dos eleitores no início do governo.

"Se a gente tem mais presença de mulheres nesses cargos, é porque existe pressão social para que haja representatividade. O efeito dessa pressão no segundo governo é menor porque as alianças se articulam de forma distinta."

Mesmo sendo minoria, mulheres podem ter um melhor desempenho como líderes do que os homens, conforme levantamento do Insper publicado em 2023.

O estudo, que compilou resultados de diferentes pesquisas sobre lideranças femininas em cargos de prefeituras a chefia de Estado, identificou que elas tendem a investir até 7% mais em saúde e educação, reduzir em até 24% a mortalidade infantil e ter até 35% menos chances de estarem envolvidas em casos de corrupção quando ocupam cargos de alto escalão.

Outra pesquisa, publicada em 2022 pela USP, mostrou que cidades lideradas por prefeitas alcançaram melhor desempenho no combate à Covid-19. Nelas, houve menos mortes e hospitalizações por 100 mil habitantes, além de uma melhor aplicação de medidas preventivas, na comparação com os municípios comandados por homens.

Clara Marinho, conselheira da República.org, diz que mulheres podem ter melhor desempenho por levarem à política novas perspectivas sobre desafios da gestão pública, inclusive relacionados à própria vivência. O mesmo vale para ampliar a presença de pessoas negras e indígenas entre as lideranças.

Mulheres geralmente são as principais responsáveis pelo cuidado com familiares, por exemplo, e, por isso, têm um acesso maior a serviços de saúde e de educação. "Isso traz uma ampliação da eficiência da política pública, porque eu permito que ela se torne mais permeável a diferentes visões."

A conselheira afirma que o acesso de mulheres a áreas decisórias também deve ser democratizado, seja por incentivos a candidaturas femininas nas eleições ou em concursos para o setor público.

Esses movimentos, acrescenta Clara, permitem que elas criem uma trajetória na gestão pública e, com isso, possam se preparar para assumir um cargo de alto escalão.

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