Belém, capital da COP30, tem baixos índices de coleta de esgoto, crise do lixo e ocupação desordenada

Disputa por prefeitura passa por promessas de serviços básicos a moradores de áreas ocupadas, na capital com mais favelas no país

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Belém e Manaus

Belém, a capital amazônica que sediará a COP30 (Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas) em 2025, é uma cidade onde 12% dos moradores não contam com coleta regular de lixo em pelo menos um dia da semana, 80% não são atendidos por coleta de esgoto e mais da metade da população vive em áreas classificadas como favelas, sem acesso a serviços básicos.

A cidade passa por uma crise do lixo persistente, com problemas que vão da coleta –o que resulta em acúmulo de resíduos em diferentes bairros– à destinação, com uma mudança na rota do lixo. Primeiro, o destino dos resíduos domésticos era um lixão em Ananindeua, cidade conurbada. Agora, a solução encontrada foi mandar o lixo para um aterro em outra cidade vizinha, Marituba.

Gunara Ribeiro, 33, operária da construção civil, na janela de sua casa palafita às margens do rio Tucunduba
Gunara Ribeiro, 33, operária da construção civil, na janela de sua casa palafita às margens do rio Tucunduba, em Belém - Alessandro Falco/Folhapress

Os índices de cobertura de coleta de lixo e de recuperação de recicláveis são inferiores à média nacional, conforme dados do SNIS (Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento), do Ministério das Cidades. A produção de lixo por pessoa é superior à média no país.

Ao longo da última década, Belém não conseguiu evoluir substancialmente seus indicadores de coleta e tratamento de esgoto, como mostra uma análise feita pelo Instituto Trata Brasil, uma organização formada por empresas que atuam com saneamento básico. O levantamento usa dados de 2022 do SNIS.

O tratamento de esgoto chega a 2,38% dos moradores da cidade, um dos piores índices do país. A capital do Pará conseguiu avançar em abastecimento de água, saltando de 70,3% para 95,5% da população atendida em cinco anos, mas não consegue sair do lugar em relação ao esgoto.

Os municípios atribuem ao estado a responsabilidade por esgoto e água. A solução para o problema, porém, passa por parcerias e pela maneira como a cidade é ocupada.

Em Belém, essa ocupação é desordenada, com invasões sem serviços urbanos básicos, como água encanada e energia elétrica regular. Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) compilados pelo Instituto Cidades Sustentáveis mostram que Belém é a capital com a maior quantidade de domicílios em favelas: 55,5%, superior a Manaus, com 53,3%.

A próxima gestão do município, o segundo mais populoso da Amazônia, tem esse cenário como principal desafio.

Até a COP30, uma cúpula diplomática que tenta alcançar acordos para frear as mudanças climáticas e que pela primeira vez será realizada na região amazônica, nada deve mudar. A conferência está prevista para novembro de 2025.

O prefeito de Belém, Edmilson Rodrigues (PSOL), é candidato à reeleição na disputa em outubro. O vice na chapa é do PT, Edilson Moura, atual vice-prefeito.

A candidatura apoiada pelo presidente Lula (PT) vai enfrentar um nome lançado pelo governador do Pará, Helder Barbalho (MDB). O deputado estadual Igor Normando (MDB) foi secretário na gestão de Barbalho e tenta se eleger prefeito de Belém.

Outro candidato que tenta impedir a reeleição de Rodrigues é o deputado federal Éder Mauro (PL), o principal nome do bolsonarismo na disputa. Mais seis candidatos brigam por votos na capital paraense.

Entre os bairros mais desassistidos na periferia de Belém, estão o Jurunas, o Terra Firme e o Guamá. Neste último, uma ocupação conhecida como abrigo do Tucunduba –às margens do rio Tucunduba– caminha para a desapropriação, segundo os moradores do lugar.

A Cohab (Companhia de Habitação do Estado do Pará) chegou a fazer uma análise das casas na ocupação e a se reunir com os moradores, mas não houve evolução nas tratativas nos últimos dois anos.

Na ocupação do Tucunduba, as casas são de madeira e construídas sobre palafitas. Quando chove, os imóveis na parte mais baixa são alagados. Não há asfalto nem sistema de água e esgoto. A água é puxada do rio por bombas e também improvisada em ligações clandestinas de ruas vizinhas.

A diarista Maria Eliete Pantoja, 44, mora há cinco anos na ocupação. Cuida sozinha dos filhos. Eliete tem quatro filhos, e três vivem com ela no abrigo do Tucunduba.

Uma ponte de acesso à casa de madeira quebrou, o que comprometeu uma caixa d’água que tinha a ponte como pilar. A casa tem apenas dois cômodos.

"Aqui é um lugar que não tem nada. A gente só mora aqui mesmo porque não tem nenhum lugar para ir", diz Eliete. "Quando falta luz, não tem água, porque a gente puxa na bomba."

A família precisa armazenar água em panelas e bacias, para posterior uso no banho e na rotina de casa. A água para consumo é comprada, uma forma de contornar os corriqueiros problemas de saúde quando a água consumida é bombeada do rio.

Eliete quer sair da ocupação. Até isso ocorrer, diz que o mais urgente é ter acesso a água tratada. "Moro aqui porque não tenho condições de pagar aluguel. Minha maior preocupação é sair. Quero ir para um lugar melhor para os meus filhos."

Uma creche funciona bem próxima à ocupação. Chamado Centro Infantil Frei Daniel Samarate, é mantida pela Igreja Católica e tem parceria com a Secretaria Municipal de Educação.

Parte dos alunos é do abrigo Tucunduba e de outras ocupações do entorno. É comum que alunos se afastem por problemas de saúde, decorrentes da falta de água tratada, segundo a coordenadora pedagógica da creche, Maria Guimarães, 66.

"A área aqui atrás da creche [onde está o abrigo Tucunduba] não tem saneamento, eles ainda moram em cima dos rios", diz a coordenadora. "Muitas crianças chegam aqui com micose, escabiose e aquela doença de pé e mão, quando a criança fica com o pé a mão cheios de bolhas. Alguns têm diarreia e infecção intestinal."

Gunara Ribeiro, 35, mora na ocupação. Trabalhadora da construção civil, ela vive no Tucunduba há dez anos. Uma filha já precisou de internação hospitalar em razão do consumo da água, segundo Gunara.

"Eu pediria [a quem for o novo prefeito de Belém] uma nova rua, porque essa não presta para nada, a tubulação está podre. Quando chove entope e alaga tudo", diz ela.

Sobre a COP30, Gunara afirma que nada mudará para os rumos da ocupação. "No centro estão mexendo tudinho. Aqui só estão vindo porque é tempo de eleição."

O QUE DIZEM OS PRINCIPAIS CANDIDATOS À PREFEITURA DE BELÉM SOBRE O TEMA:

Edmilson Rodrigues (PSOL), prefeito que tentará reeleição: Afirma que vai concluir a macrodrenagem da Estrada Nova e do igarapé Mata Fome e fazer a macrodrenagem do Ariri-Bolonha e do Paracuri. As obras beneficiarão 18 bairros, segundo a campanha, e contarão com urbanização, arborização e construção de estação de tratamento, além de substituição de moradias precárias.

A coleta de lixo e o número de ecopontos serão ampliados, conforme o prefeito, e haverá estímulo a cooperativas de catadores de recicláveis. Outra proposta é implantar um novo aterro sanitário, dentro das normas de respeito ao ambiente. Segundo a gestão de Rodrigues, nos primeiros 60 dias de contrato com uma nova empresa foram retiradas 100 mil toneladas de lixo na cidade.

Igor Normando (MDB), deputado estadual: O candidato diz prever ações emergenciais caso seja eleito, como readequação de contratos de parcerias público-privadas para incluir monitoramento do descarte de lixo e de pontos de alagamento. Outra proposta é estimular empreendedores e cooperativas a criarem "hubs" nos bairros para exploração comercial de resíduos.

Normando propõe intensificar coleta de lixo e criar pontos de coleta seletiva, além de parcerias com instituições para desenvolvimento de tecnologias de saneamento e monitoramento ambiental. A prefeitura fará parcerias com o governo do estado para avanço de tratamento de água e esgoto, especialmente em áreas de vulnerabilidade social, segundo o candidato.

Éder Mauro (PL), deputado federal: não respondeu aos questionamentos da reportagem.

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