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Desafios nas capitais Eleições 2024

Levar emprego à periferia é melhor do que ocupar o centro

Havendo renda e consumo, os negócios se multiplicam

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José Luiz Portella

Engenheiro civil, é doutor em história econômica pela USP, onde faz pós-doutorado em sociologia. Atua como pesquisador do IEA-USP (Instituto de Estudos Avançados) e é professor de pós-graduação

Melhor do que ocupar o centro do Rio de Janeiro, concentrando a mobilidade, é levar o emprego aos bairros periféricos.

Reportagem publicada por esta Folha abordou os desafios envolvendo o tema da habitação na capital fluminense.

A construção de unidades habitacionais no centro da cidade não é de todo ruim, todavia conduzirá à gentrificação ou ao investimento, com o consequente aumento do preço para aquisição, aluguel ou turismo.

Morador da zona oeste do Rio de Janeiro, Leandro Martins deixa a casa na madrugada diariamente para trabalhar no centro da cidade - Eduardo Anizelli/Folhapress

Se o emprego na periferia for qualificado, o trabalhador morar e consumir por lá, o desenvolvimento vem de imediato. O dinheiro corre atrás do dinheiro. Havendo renda e consumo, os negócios se multiplicam, criando um ambiente que catalisa o progresso e a distribuição de renda.

A ocupação urbana no Brasil é um grande problema desde as capitanias hereditárias. Gerou uma série de consequências, inclusive o latifúndio e o patrimonialismo. Ela juntou os equívocos da metrópole à conduta do povo brasileiro.

O colonizador português construiu cidades sem planejamento, diversamente dos espanhóis.

A ocupação urbana do Rio de Janeiro é um espelho da falência do estado na Cidade Maravilhosa.

O avanço do crime na política habitacional, o Estado calado, conivente ou inepto assistindo ou piorando o processo. Como o projeto de desfavelização de Carlos Lacerda, empurrando a população para uma periferia destituída de infraestrutura. Afastando a moradia do emprego. Problema vigente até hoje.

A apropriação do espaço urbano no Rio de Janeiro contempla todas as mazelas que envolvem essa cidade: a luta por moradia, o crescimento das milícias, com a tomada do espaço público, e a iniciativa de políticas habitacionais, que não se concretizaram nem se concretizam, sobretudo por serem legalmente desrespeitadas. Leis que não "pegam".

O primeiro plano urbanístico no Rio de Janeiro foi o Plano Beaurepaire, século 19, não executado, segundo Verena Andreatta.

Pereira Passos tratou de tentar urbanizar a região central, removendo a população instalada em cortiços, levando ao início do processo de constituição das favelas. Outros movimentos sempre empurraram os mais carentes para a periferia.

Carlos Lacerda, governador do então estado da Guanabara, contribuiu muito com a ocupação infeliz, seja por intermédio da remoção compulsória para a periferia; seja pelos canteiros, que instalou na cidade com o conjunto de obras.

Os canteiros de obras, alojamentos dos trabalhadores, após a conclusão dos projetos, transformaram-se em moradias subnormais ou impulsionaram à ocupação dos morros próximos. A luta dos habitantes era por moradia próxima ao trabalho.

Leonel Brizola conectou o morro à zona sul, sem planejamento adequado.

A zona oeste do Rio, mutatis mutandis, está se assemelhando à zona leste de São Paulo, onde temos cerca de 33% da população com 13% dos empregos da cidade.

Se tirarmos a subprefeitura da Mooca, colada ao centro, e onde se instalou o eixo Platina, Anália Franco, o restante da ZL contém apenas 6% dos empregos paulistanos, mais da metade de baixa qualificação.

Com alto risco estrutural de engenharia, a zona oeste do Rio está em boa parte sob controle de milícias, que descobriram lucro significativo com a construção de conjuntos irregulares.

O desafio habitacional se defronta atualmente com a questão da preservação ambiental e a falta de infraestrutura para saneamento e tratamento dos resíduos sólidos.

Há políticas esboçadas pelas esferas federal, estadual e municipal. Nenhuma crível no sentido da consolidação, porque são elaboradas no encanto do entusiasmo, sem formulação correta, com implantação deficitária, sem medição de resultados.

Políticas prontas para as fotos de largada, para os lançamentos, sobretudo no período eleitoral.

São as formas presentes que explicam o pretérito. O Rio está assim, porque foi o que foi.

As promessas dos candidatos carecem de detalhamento a comprovar a viabilidade. São arquipélagos de intenções, perdidos em mares de impossibilidades. Em volta, um poder público débil, que não inspira confiança.

O Rio faliu o estado como ente administrativo. Precisa cair em si, realizar uma "recuperação judicial" e ressuscitar o moribundo.

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