Educação integral é aposta do governo contra evasão escolar

Financiamento é direcionado só a novas vagas, o que preocupa especialistas

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São Paulo

Permanecer ao menos sete horas por dia na escola ou 35 horas por semana em dois turnos. Aprender com disciplinas da educação formal, como matemática e português, e receber conteúdos a mais, que levem ao desenvolvimento cognitivo e social. Essa é uma das principais apostas do Brasil para evitar que crianças e adolescentes abandonem os estudos.

O presidente Lula (PT) sancionou em julho a lei que institui o Programa Escola em Tempo Integral. Até 2024, 50% das escolas públicas devem oferecer matrículas do tipo.

Até 23 de agosto, 3.416 municípios de todos os estados, além do Distrito Federal, haviam aderido à iniciativa.

Crianças com chupeta brincam com fitas coloridas presas ao teto em escola
Alunos da escola municipal Maria Simonetti Thomé, em São Caetano do Sul, na Grande SP - Jardiel Carvalho/Folhapress

O programa antes desse lançamento era o Novo Mais Educação, criticado por especialistas por prever um tempo estendido para as aulas (ao menos mais de sete horas por dia), mas não necessariamente um modelo integral.

Há uma diferença entre educação integral, educação em tempo estendido e educação integral em tempo estendido —que é a proposta do programa, segundo Priscilla Bacalhau, pesquisadora da FGV (Fundação Getulio Vargas).

"A educação integral pressupõe um processo de aprendizagem que vai levar ao desenvolvimento cognitivo, social, emocional, político e cultural, e tudo isso precisa estar articulado entre si. Isso conversa muito com o que a gente espera da educação: formação de cidadãos. A proposta traz essa perspectiva, apesar de ser para indução do tempo integral, que é uma estratégia."

O programa defende "um currículo intencional e integrado, que amplia e articula diferentes experiências educativas, sociais, culturais e esportivas em espaços dentro e fora da escola com a participação da comunidade escolar".

A previsão é fomentar um milhão de novas vagas da modalidade na educação básica ainda em 2023 e 3,2 milhões até 2026. O investimento inicial será de R$ 4 bilhões neste ano e no próximo para apoiar escolas públicas a abrirem vagas de ensino integral.

Os recursos são necessários para garantir ao menos três refeições diárias para alunos, adequar os espaços para a jornada estendida, aumentar o número de funcionários e ampliar o currículo.

A verba não tem previsão de renovação após 2024. Segundo o MEC, uma vez criada a matrícula, ela será mantida por meio do Fundeb (Fundo de Manutenção da Educação Básica). A pasta diz reconhecer que a manutenção é um desafio para as redes de ensino e que tem atuado junto a estados, municípios e DF.

Agentes da educação ainda pedem apoio contínuo. "É necessário oferecer formação ao professor. Se ele, de um dia para outro, precisar ficar mais tempo na escola sem saber o que é educação integral, não vai valer a pena", diz Bacalhau.

Especialistas têm preocupações em relação ao programa, apesar de considerarem positiva a discussão. Uma delas é que o aporte financeiro é direcionado a novas matrículas e não inclui escolas que já mantinham a educação integral.

"Em Lajedo do Tabocal [cidade com cerca de 8.500 habitantes na Bahia], de 14 escolas da rede municipal, 10 são de educação integral. Elas enfrentam muita dificuldade financeira e não vão receber incentivo", diz a educadora Cláudia Cristina Pinto Santos, membro do grupo de pesquisa Formação Humana Integral.

"Só aumentar atividades em contraturno pode acabar reforçando a desigualdade. Só quem vai ter acesso são alunos que já partem de pontos mais privilegiados", diz Bacalhau.

A secretária de Educação Básica do MEC, Kátia Schweickardt, diz que a pasta busca dotação orçamentária (valor autorizado pela Lei Orçamentária Anual) para tentar viabilizar uma política de bolsas para novos alunos.

"Ainda é problemático que 20% dos jovens brasileiros estejam fora do sistema educacional. Quando olhamos para esse grupo, descobrimos que grande parte são negros, em situação de vulnerabilidade."

Cerca de 2 milhões de meninas e meninos de 11 a 19 anos que ainda não haviam terminado a educação básica deixaram a escola no Brasil, segundo estudo do Unicef de 2022.

O esforço para reverter essa situação é válido, diz Laura Muller Machado, coordenadora do Centro de Evidências da Educação Integral do Insper.

Um estudo do centro publicado em julho de 2022 estima que alunos de escolas de tempo integral têm mais chance de completar a educação básica, concluir o ensino superior e encontrar emprego. O levantamento prevê que o valor presente dos ganhos em geração de renda à sociedade, para cada estudante adicional que tenha acesso à educação média integral, será de R$ 145 mil, contra um custo de R$ 24 mil.

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