Novas ferramentas de inteligência artificial prometem criar games maiores e mais complexos

Inovações na área criam corrida tecnológica na indústria de jogos eletrônicos

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São Paulo

O sucesso de ferramentas de IA (inteligência artificial) generativa, em especial do ChatGPT, resultou em uma corrida tecnológica na indústria de games.

Com o interesse de investidores em alta e caixa cheio após o boom dos games durante a pandemia de Covid-19, grandes estúdios e empresas de hardware lançaram nos últimos meses uma série de ferramentas que buscam aproveitar essa tecnologia para criar jogos ainda maiores e mais complexos.

"Todo dia a gente vê alguém que criou uma nova aplicação baseada em IA que resolve algum problema, que automatiza alguma tarefa, que cria alguma coisa que ninguém tinha imaginado antes", diz Alexandre Ziebert, gerente de technical marketing da Nvidia para a América Latina. "Estamos em uma era de ouro da inteligência artificial."

A própria Nvidia lançou uma tecnologia que pode mudar a forma como os humanos interagem com personagens não jogáveis (NPCs, na sigla em inglês). O ACE (Avatar Cloud Engine) for Games, apresentado na Computex 2023, em maio, é capaz de criar personagens que conversam em linguagem natural com os jogadores.

Por esse sistema, ao invés de selecionar opções de frases de uma lista, por exemplo, o jogador pode falar diretamente com o personagem, no caso uma IA, que responde de acordo com parâmetros pré-definidos pelos desenvolvedores.

A tecnologia impressiona pelo nível de automação, mas, pelo aspecto robótico da fala e a falta de naturalidade na construção das frases, ainda deixa evidente que se trata de um conteúdo desenvolvido por IA.

"Hoje você tem artistas extremamente competentes na indústria. São experts em suas áreas e é muito difícil você conseguir, através de uma ferramenta, igualar o resultado", afirma Ziebert. "Mas a gente está chegando lá."

No momento, porém, fazem mais sucesso programas mais simples, que funcionam como um copiloto para artistas e programadores desenvolverem melhor e mais rapidamente suas funções.

A Ubisoft, por exemplo, anunciou em março, durante a última GDC (Conferência de Desenvolvedores de Games), o Ghostwriter, ferramenta que utiliza IA para diversificar falas secundárias de um jogo (conhecidas como "barks").

Desenvolvida internamente pela empresa, a ferramenta analisa uma frase escrita pelo roteirista e sugere uma série de outras, com características similares, que também podem ser usadas pelo profissional, acelerando seu trabalho.

Além disso, a Blizzard, dona de "World of Warcraft", "Overwatch" e "Diablo", treinou uma inteligência artificial com imagens de seus jogos para produzir novas artes conceituais, segundo reportagem do New York Times.

Mas até mesmo estúdios menores podem tirar proveito de ferramentas de IA. O brasileiro Pulsatrix, por exemplo, aproveitou um programa desenvolvido pela Nvidia no jogo de terror "Fobia - St. Dinfna Hotel", lançado em 2022 para PC e consoles PlayStation e Xbox.

O estúdio utilizou a ferramenta Audio2Face para otimizar a animação da boca dos personagens 3D do projeto, que deve estar sincronizada com a dublagem. Como o jogo seria lançado em dois idiomas (português e inglês), a quantidade de trabalho para completar a tarefa era inviável para uma equipe de 13 pessoas.

A tecnologia usa IA para adicionar expressões a um modelo tridimensional, mantendo a sincronia labial, a partir de uma gravação. É como se um áudio do WhatsApp fosse usado para recriar o movimento facial de quem o enviou.

O Audio2Face integra a plataforma Omniverse, voltada para design gráfico 3D em tempo real. Apesar de ser gratuita, exige um modelo de GPU (placa de vídeo) da série RTX, desenvolvida pela Nvidia, cujos preços começam em cerca de R$ 1.500 e podem passar dos R$ 10 mil.

"É um ganho de tempo absurdo. O 'Fobia' ainda não tinha tantas falas, umas 400 linhas no total, o que é bem pouco para um jogo. Mesmo assim, se a gente fosse animar essas gravações, levaria um tempo considerável para uma empresa do nosso tamanho", disse Fabio Martins, co-fundador da Pulsatrix Studios.

A Pulsatrix usou a ferramenta para animar os personagens falando em duas línguas, inglês e português, mas poderia fazer o mesmo para qualquer idioma, segundo o site da Nvidia.

Apesar do sucesso com o uso do Audio2Face, Martins é cético em relação à utilização das IAs generativas nos games. Ainda assim, reconhece que podem trazer vantagens no futuro.

"Dificilmente essas tecnologias vão ser usadas para simplesmente colocar um personagem no jogo que conversa como o ChatGPT, em tempo real. Vemos que as respostas no geral são genéricas, fogem do que é o tema do jogo, do direcionamento que queremos dar para o personagem", disse.

"Daqui a dois anos talvez já esteja com uma conversa muito mais natural, talvez você consiga ensinar tópicos específicos, ensinar a fazer parte do mundo do seu jogo. Eu acho que a gente vai chegar nesse ponto".

O estúdio sediado em São Paulo agora trabalha no terror metalinguístico "A.I.L.A.", sobre uma IA que cria jogos. O projeto arrecadou R$ 371 mil em uma campanha de financiamento coletivo e deve ser lançado em 2025.

Em "A.I.L.A.", o jogador será responsável por testar jogos gerados pela IA. Os games serão gerados a partir de escolhas feitas pelo usuário, com comandos selecionados pela personagem. Conforme essa inteligência artificial vai perdendo a percepção do que é real ou não, o objetivo passa a ser desvendar seus segredos e usá-los contra ela.

Os fundadores da Pulsatrix, Fabio Martins e Thiago Matheus, no entanto, garantem que, ao menos por enquanto, nenhuma IA será utilizada no desenvolvimento de "A.I.L.A.". Melhor não arriscar.

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