Na pandemia, passageiro viaja em avião desinfetado e recebe comida sob demanda

Repórter pega voo entre São Paulo e Minas para ver o que mudou nos aeroportos e companhias

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São Paulo e Belo Horizonte

Pegar um voo durante a pandemia de Covid-19 exige que o passageiro reveja seus conceitos sobre viagens de avião.

Esta repórter acompanhou voos operados pela GOL e Latam entre o aeroporto de Guarulhos (SP) e Confins (MG) nesta segunda (25) e conversou com passageiros, funcionários de companhias e do comércio sobre as transformações causadas pela pandemia.

As mudanças começam antes de sair de casa, quando, além do documento, é preciso se lembrar da máscara e do álcool em gel, diz a curitibana Ariadne Saldanha, 21, supervisora de logística.

Em escala no aeroporto de Guarulhos com destino a Belo Horizonte, Ariadne diz que começou a retomar as viagens a trabalho, mas está preocupada porque mora com a mãe, que faz parte do grupo de risco. “Ela me pediu cuidado para não encostar em nada”, diz.

No check-in do aeroporto de Confins, divisores de fluxo foram colocados em frente ao balcão para aumentar a distância entre o atendente e o cliente que vai despachar malas, explica Eden Pisani Júnior, gerente de aeroporto da Latam. Caso um passageiro solicite informações com a máscara abaixada, funcionários pedem que a peça seja reposicionada.

Corredores vazios, lojas fechadas, grandes dispensers de álcool em gel e avisos sobre o uso de máscara são os sinais mais aparentes de que a rotina nos aeroportos mudou e o movimento diminuiu.

Segundo a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), no mês abril de 2020 foram registrados 5.715 voos domésticos, contra 63.112 no mesmo período do ano passado.

A Latam realizava em média 750 voos por dia no Brasil antes da pandemia e, em maio, está operando uma média diária de 35 voos. Na terça (26), o Grupo Latam Airlines entrou com pedido de recuperação judicial nos Estados Unidos. O processo não inclui a empresa brasileira.

Em maio, Azul, Gol e Latam devem operar em 44 cidades brasileiras. Essa malha aérea é cerca de 90% menor do que a prevista pelas empresas para o período, segundo a Anac.

Com menos voos, algumas viagens demoram mais, como a da bancária Cristiana Cardoso, 46, que teve passagem remarcada quando voltava de Brasília para São Luís (MA). A rota direta, que demora duas horas e meia, levou cerca de oito horas e incluiu paradas em Confins e Viracopos (SP).

Outro reflexo da diminuição de passageiros se dá nos negócios dentro dos aeroportos. Gerente do único comércio aberto na área do embarque doméstico de Confins, Christopherson Murta Gusmão, 38, viu lojas fecharem e funcionários serem demitidos. A Casa do Pão de Queijo, onde trabalha, funcionava 24 horas por dia. Agora, a lanchonete fica aberta das 6h às 21h.

No saguão, a área de alimentação com 700 lugares tinha, durante a visita da repórter, cerca de dez mesas ocupadas.

Na área de embarque, passageiros esperam em bancos distantes uns dos outros —e até buscam áreas vazias, mesmo que longe do portão de embarque, caso do casal Romário Monteiro, 26, e Victor Aro, 35, administradores.

Para Aro, a necessidade de pegar um voo a trabalho o ajudou a compreender o impacto da Covid-19. “O estacionamento está cheio de carros para alugar, parece uma montadora. Nunca vi isso.”

Em voos nacionais, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) recomenda a suspensão do serviço de bordo. No caso da manutenção do serviço, a entidade recomenda que sejam priorizados alimentos e bebidas em embalagens individuais, higienizadas antes do serviço.

No caso da Latam, biscoitos e água são servidos sob demanda em rotas com menos de duas horas.

Os comissários se esforçam para manter um tom pessoal no atendimento mesmo com os novos protocolos. “Observamos a expressão do passageiro. Se percebemos um problema, nos colocamos à disposição. Não dá para ver nosso sorriso com a máscara, mas você percebe que o formato do olho muda”, diz Flávio Tonini, 38, comissário.

Para ele, o passageiro já entendeu a necessidade de estar seguro, higienizando com frequência as mãos. “Se acaba o sabonete no banheiro, somos questionados na hora.”

Os voos acompanhados pela repórter aparentavam ter metade ocupação dos assentos. No fim do embarque, comissários reorganizaram passageiros mantendo distância entre eles, quando possível.

No avião, viajantes precisam usar máscara de pano, que deve cobrir boca e nariz, ser retirada apenas pela lateral e reposta quando estiver úmida, diz o infectologista Moacyr Silva Junior, do Hospital Israelita Albert Einstein.

Para reduzir o risco de contágio, as companhias adotaram novos procedimentos de desinfecção. A Gol, por exemplo, reforçou a higienização de poltronas, cintos de segurança e bandejas. À noite, a empresa utiliza um desinfetante equivalente ao usado em hospitais dentro da cabine.

Além de reforçar a limpeza, a Azul faz a medição da temperatura de seus tripulantes antes do início de cada turno.

Para especialistas, algumas medidas devem continuar após a pandemia. “Os procedimentos de higienização não devem retroceder. Até porque melhorias na qualidade do serviço sempre são bem avaliadas pelos usuários”, diz Mariana Aldrigui, professora do curso de turismo da USP.

Para a especialista, porém, espera-se que as orientações sobre aglomeração sejam revistas no futuro.

Para junho, Latam, Gol e Azul anunciaram um aumento na quantidade de voos. Com a ampliação, a Azul deve chegar a 168 decolagens em dias de pico —antes da pandemia, a companhia operava cerca de 916 voos diários para 116 destinos no Brasil e exterior.

Para Lito Sousa, especialista em aviação, a retomada será gradual e cautelosa. “As companhias estão aumentando o número de voos porque há demanda. Mas a expectativa é que o tráfego volte ao nível de pré-pandemia no fim de 2021.”

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