Mucugê, com vinho e frio de serra, revela uma Bahia sem praia nem acarajé

Famosa pelo turismo de natureza, cidade da Chapada Diamantina quer atrair visitantes com cultura e vivências rurais

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Mucugê (BA)

Mucugê não tem problema de autoestima. Apresenta-se oficialmente como "a cidade mais linda da Chapada Diamantina" —e não deixa de ter razão.

Surgida no século 19 em função do garimpo de diamantes, a cidade é uma das mais antigas da chapada e tem todo seu conjunto arquitetônico e paisagístico tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, o Iphan.

Cânion da Fumacinha na cidade de Mucugê, na Bahia
Cânion da Fumacinha na cidade de Mucugê, na Bahia - Divulgação

As ruas do centro histórico lembram Paraty (RJ), e não só pelo calçamento de pedras ou pelas fileiras de casinhas coloniais coloridas.

Com uma intensa programação cultural, que inclui uma feira literária anual, a Fligê, que atraiu 10 mil visitantes este ano, Mucugê entrou no radar de turistas estrangeiros. Famílias baianas, sobretudo de Salvador, têm transformado as construções tombadas em residências de férias.

Por ser uma das portas de entrada do Parque Nacional da Chapada Diamantina, Mucugê ganhou fama pelo turismo de aventura. Suas centenas de quedas d’água, amparadas por formações rochosas peculiares, são de fato deslumbrantes, como é o caso da cachoeira da Fumacinha, ali próxima.

Hoje, porém, a cidade também se esforça para chamar a atenção de outro tipo de público –e com o objetivo de manter as porteiras fechadas para o turismo de massa.

"Não temos linhas regulares de ônibus e 85% dos turistas chegam de carro. Nossos preços são mais altos do que os das cidades vizinhas, o que nos ajuda a preservar essa calmaria típica do interior. Aqui, as crianças ainda correm pelas ruas", diz Fabiana Profeta, secretária municipal de cultura e turismo.

Embora esteja no miolo da Bahia, Mucugê fica mais perto de Minas Gerais do que de Salvador. A altitude, em torno dos mil metros, garante um clima fresco que não lembra em nada o litoral baiano —no inverno, a temperatura mínima pode chegar a 7º graus.

Não por acaso, o turismo de experiência rural cresce nos arredores —os dias amenos e ensolarados são propícios ao cultivo de frutas vermelhas e até de uvas viníferas.

Inaugurada oficialmente em 2022, a vinícola Uvva já nasceu com vocação enoturística. Fundada pela família Borré, grande produtora de café e batatas, ocupa um imponente prédio projetado pela arquiteta Vanja Hertcert, cercado por 52 hectares de vinhedos. Do terraço, vê-se o contorno da serra do Sincorá, cujas rochas rosadas mudam de cor conforme a hora do dia.

O visitante pode escolher entre três experiências, que custam a partir de R$ 160 por pessoa. Quem paga pelo tour Entusiasta Sincorá (R$ 220) ou pela Experiência Uvva (R$ R$ 310) pode descer até a cave, onde obras de arte contemporânea do artista baiano Marcos Zacariades estarão à mostra até julho de 2024.

A vinícola ainda dispõe de loja, onde os rótulos da casa custam entre R$ 143 e R$ 350, wine bar e um restaurante, o Arenito, aberto apenas para almoço, com menu composto de ingredientes da região.

Mucugê também tem produção de frutas vermelhas. O Sítio do Galera, que colhe 25 toneladas de morangos por ano, promove visitas guiadas de segunda a sábado, com degustação de licores e geleias. Nas férias escolares, a propriedade chega a receber 300 turistas por mês, muitos oriundos de São Paulo.

Perto dali, o Sítio Frutas Especiais permite visitar os canteiros de framboesas, amoras, mirtilos e pitaias amarelas –e encerrar o tour na lojinha.

O setor hoteleiro, que soma 1.400 leitos, tem acompanhado a mudança de perfil turístico de Mucugê. Inaugurado em dezembro de 2020, o Refúgio na Serra é um hotel-boutique com apenas 13 suítes. Diárias para o casal a partir de R$ 1.160 dão direito a café da manhã com quitutes regionais.

Também surgiram hospedagens para aluguel de temporada. Desde 2021, a Vila 61 oferece três casas para casais e uma para grupos de até dez pessoas, com diárias a partir de R$ 400. As paredes de rochas típicas da chapada, arrematadas por canteiros floridos, lembram as vilas da Toscana.

As épocas mais concorridas em Mucugê são os meses de junho, quando as festas juninas sacolejam a cidade, e o Carnaval, embalado pelas bandas de marchinhas de antigamente.

O calendário de eventos culturais e esportivos, no entanto, ocupa o ano inteiro. No feriadão de 12 de outubro, a cidade vai abrigar a quinta edição do Festival de Forró da Chapada. Em novembro, é a vez da ultramaratona de montanha Ultra Trail Chapada Diamantina.

Para quem busca paz e sossego, a recomendação é visitar Mucugê fora dos festejos oficiais. Sem tantos turistas, fica mais fácil encontrar lugar nos dois restaurantes mais famosos do centro: o de Dona Nena, mais antigo da cidade, que enfileira as panelas com receitas sertanejas sobre o fogão a lenha, e o de Cláudia, cujas especialidades são o godó de banana verde e o cortado de palma, cozidos caldosos criados nos tempos do garimpo.

Pode parecer estranho, mas visitar o cemitério é obrigatório. Encarapitado na encosta da serra do Sincorá, tem túmulos góticos e bizantinos, todos pintados de branco —os caixões não são enterrados, já que as sepulturas são apenas apoiadas sobre as rochas.

Ao entardecer, quando os alto-falantes da matriz de Santa Isabel ecoam rezas pelas ruas do centro, é hora de escolher um banco da praça e tomar sorvete de mucugê, frutinha que nasce na beira dos rios e deu nome à cidade. Tem na Gelateria Café Preto, vale a pena provar.

O que visitar

Gelateria Café Preto – @gelateriacafepreto

Refúgio na Serra – refugionaserra.com.br

Restaurante da Dona Nena – R. Direita do Comércio, 140, Centro, tel. (75) 3338-2123

Restaurante da Cláudia – @claudiarestaurante2

Sítio Frutas Especiais – @sitiofrutasespeciais

Sítio do Galera – @sitiodogalera

Vila 61 – vila61mucuge.com.br

Vinícola Uvva – vinicolauvva.com.br

A repórter viajou a convite da Vinícola Uvva

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