Casal de sociólogos lamenta ausência de cooperação social
A sociedade moderna tirou das pessoas a capacidade de se organizar coletivamente e de comunicar com o diferente.
Essa é a opinião do sociólogo americano Richard Sennett e de sua mulher, a holandesa e também socióloga Saskia Sassen. Os dois foram os conferencistas desta quinta-feira (26) do ciclo de debates "Fronteiras do Pensamento", evento do qual a Folha é parceira, no Instituto Tomie Ohtake em São Paulo.
Para os sociólogos, essa incapacidade se expressa de forma contundente na atual crise ambiental e social por qual passam as grandes cidades do mundo.
Marlene Bergamo/Folhapress | ||
Richard Sennett e Saskia Sassen foram destaque do 'Fronteiras do Pensamento', com parceria da Folha |
Primeiro a falar, Sennett tratou do tema ao qual se dedica em seu último livro "Juntos"; como a dinâmica do capitalismo contemporâneo destruiu a capacidade de colaboração entre os indivíduos.
Ele elencou três habilidades que a sociedade deveria desenvolver de forma a recuperar a possibilidade de cooperação.
São elas a capacidade de ouvir uns aos outros e empatizar com aquilo que o outro faz; superar o vácuo de comunicação a partir de relações ordinárias e criar sociabilidade por meio da ambiguidade; e não enxergar as identidades de cor, gênero, religião ou origem como obstáculos para a interação.
Faltam pessoas que digam "eu não entendo o que você está dizendo porque eu não entendo a sua experiência, conte-me mais". Segundo Sennett, devemos "preferir a empatia à identificação".
Para ele, a razão pela qual as pessoas protestaram tão pouco contra a crise financeira de 2008 é que a modernidade tirou nossa habilidade de nos relacionar com pessoas diferentes no trabalho, na cidade e já não sabemos como lutar contra um sistema predatório.
CIDADES GLOBAIS
Saskia, por sua vez, mobilizou conceitos desenvolvidos pelo marido para falar das grandes cidades, "sistemas complexos e incompletos que devem se reinventar constantemente".
Segundo ela, urge atualmente uma reorganização estrutural das cidades globais, que vivem crises ambientais -como a falta de água em são paulo-, e a desigualdade.
O espaço urbano, para Saskia, é um sistema aberto que permite, por exemplo, que a ausência de poder seja mobilizada de forma colaborativa.
Os imigrantes em Londres ou Nova York, por exemplo, podem estruturar a economia, a cultura e a política. "Eles não se tornam poderosos, mas ganham a capacidade de fazer algo".
Não haveria, de acordo com ela, uma correlação entre o aumento da densidade urbana e a urbanização. Pelo contrário, mega-projetos residenciais ou comerciais tendem a tirar da cidade seu caráter incompleto e promovem, inclusive, uma "desurbanização".
"Não se trata aqui de promover um discurso romântico sobre colaboração, trata-se da necessidade que temos de trabalhar juntos e reestruturar as cidades desde as bases".
É esse caráter que faz da cidade uma zona estratégica onde colocaríamos conhecimento e inovação, diferentemente do espaço nacional, um lugar mais "fraco e disforme".
CICLOVIAS
Respondendo a perguntas do público, Saskia disse admirar a coragem do prefeito Fernando Haddad por resistir a protestos quanto à implementação de ciclovias. "Em Nova York houve a mesma coisa. Ele está certo em pensar no futuro".
Perguntado sobre a violência nas grandes cidades, Sennett criticou parte da burguesia de centro-esquerda que muitas vezes pensa que a solução está na ausência de Estado.
"Eles acham que a coesão social da comunidade se dá de forma autônoma e extirpa a violência com a saída da polícia". A experiência de Chicago, segundo ele, mostra o contrário.
Reduzir o papel da polícia deixa a comunidade mais violenta. "Sou resistente à noção de que uma melhor forma de vida pode ser encontrada a partir da retração do Estado".
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