Proteção e tragédia: o assassinato do menino que tentou proteger a amiga
Leonardo não era de festa. Não era de funk, de briga nem "de ficar pela rua". Boné de marca, piercing no nariz, aparelho nos dentes, era como qualquer adolescente da vizinhança, em São Mateus, zona leste. Aos 15 anos, era cheio de amigo(a)s. Morreu com um tiro no peito ao tentar zelar por uma delas.
Nesta quarta-feira (6), sentados em frente à casa da avó do menino, vizinhos e parente tentavam entender o que acontecera na noite anterior.
Às 23h, o adolescente voltava a pé da escola com um grupo de quatro amigas. Normalmente, ele saía mais cedo. Na terça, porém, atrasou o regresso para fazer um trabalho em grupo.
No meio do caminho, os amigos foram abordados por quatro criminosos, em duas motos, na rua Forte de Cananéia. Os homens desceram, mandaram os adolescentes parar e, quando um deles mostrou a arma, "por instinto" Leonardo colocou-se na frente da amiga M.F., 14.
"Não chegaram a apontar para mim, mas ele estava com a mão no bolso, e acho que pensaram que ele poderia estar armado, que ia reagir, não sei", desabafou a menina.
O adolescente não teve tempo para dizer nada. Apenas se postou entre os homens e a garota. Foi atingido no peito. Os bandidos fugiram sem levar nada.
Leonardo chegou a ser socorrido. Levado ao pronto-socorro do Hospital Estadual de Sapopemba, passou por cirurgia, mas não resistiu.
Chorando muito após saber da morte do filho, a mãe pedia justiça. "Mataram meu filho, esses bandidos têm que ser presos", disse Patrícia de Cássia Cassiano, 33, encarregada de limpeza.
Arquivo Pessoal | ||
O estudante Leonardo Almeida, 15, que morreu após ser baleado em tentativa de roubo na zona leste |
Segundo a avó, Margarete Cassiano, 55, o menino passava quase que diariamente pela casa dela. "Me pedia a bênção, conversava com minha mãe e ia para a casa dele, não ficava por aí", disse.
Patrícia lembra que geralmente o filho voltava de carona com uma amiga, mas ela faltou à escola na noite de terça. "Meu filho era muito bom, não estava envolvido com coisa errada", afirmou.
Inconformada, nesta quarta (6), ela repetia que o filho não bebia nem usava drogas. "Ele estudava pelo segundo ano à noite porque queria trabalhar como aprendiz e fazer faculdade de enfermagem."
Segundo ela, familiares da amiga defendida pelo filho disseram que a menina não tem envolvimento com o autor dos disparos.
"Não faço ideia. Não briguei com ninguém, acho que ele também não. Não tenho namorado e não tenho inimigos", afirmou M.F.
Leonardo cursava o primeiro ano do ensino médio na escola São João Evangelista, na mesma rua onde foi baleado.
Segundo moradores, a região é escura e perigosa. "À noite é um lugar deserto, ninguém tem segurança", diz M.H., 41, mãe da amiga defendida por Leonardo.
VAQUINHA
Nesta quarta (6), enquanto os pais do menino faziam uma vaquinha para pagar o enterro e corriam para liberar o corpo no IML (Instituto Médico Legal) , ela ia ao 49º Distrito Policial. Temia pela segurança da filha e da família.
Logo cedo, às 6h37, a menina recebeu uma ligação anônima, que ficou registrada como "número restrito" em seu celular. "Disseram que eu tenho que pagar, que ele morreu por minha causa. Mas não é culpa minha, não é...".
Enquanto chorava, a garota era amparada pela mãe. "Temo pela segurança dela, é claro, não sei como vai ser daqui para frente", diz.
De acordo com a polícia, o caso está em investigação e nenhuma hipótese é descartada até o momento. Segundo o delegado José Francisco Rodrigues Filho, o caso tem características de tentativa de assalto, mas ainda é prematuro tirar conclusões.
Nesta quarta (6), três equipes de investigadores trabalhavam na análise de gravações de câmeras de segurança de empresas da região. Até a conclusão desta edição, ninguém havia sido preso.
Na delegacia, a família da menina tentava administrar o trauma e a ameaça. Em pouco tempo, surgira também o boato de que ela não seria bem-vinda no velório de Leonardo, o que fez com que se desesperasse.
Olhando para a mãe, repetia. "Eu não vou poder ver meu amigo, por quê? Ele era meu amigo".
Após ser levada ao pronto-socorro para ser medicada e tentar se acalmar, a avó de Leonardo foi à delegacia. Queria que a menina soubesse que ninguém de sua família tem nada contra ela. Mesmo assim, vizinhos diziam a M.F. para não ir ao cemitério.
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