Polícia do Rio tenta reconstituir 30 horas em estupro de garota
Após 12 dias de investigação, a Polícia Civil do Rio busca esclarecer lacunas do que ocorreu com a adolescente de 16 anos estuprada em um morro da zona oeste no período próximo de 30 horas em que ela ficou numa casa abandonada da comunidade.
Os policiais tentam saber se ela foi forçada por traficantes a permanecer no local conhecido como "abatedouro" e se esteve inconsciente no período inteiro em que foi mantida nessa casa –do começo da tarde de sábado (21) até a noite de domingo (22).
Até agora, os investigadores já sabem que a garota foi para um baile funk na comunidade por volta da 1h de sábado. De lá, seguiu com Raí de Souza, além do jogador Lucas Perdomo e uma outra jovem, para uma casa no interior do morro da Barão, onde teriam feito sexo consentido –a vítima com Raí, a outra menina com Lucas.
O passo-a-passo traçado pela investigação indica que, depois de ser deixada sozinha neste imóvel, provavelmente no final da manhã, a adolescente foi levada por Moisés de Lucena, conhecido como Canário, ao "abatedouro", onde foi estuprada.
Neste local foram feitos dois vídeos do crime, encontrados no celular de Raí.
QUATRO VOZES
Nesta terça-feira (7), peritos do Instituto de Criminalística Carlos Éboli, ligado à Polícia Civil, concluíram que no vídeo que deu origem à investigação existem quatro vozes de homens –e não três, como se suspeitava até então.
A polícia tenta agora descobrir de quem seria a quarta voz e por que em nenhum dos depoimentos essa quarta pessoa foi citada.
Segundo a delegada Cristiana Bento, três dos homens já estão identificados: além de Raí, as vozes são de Raphael Belo (ambos estão presos temporariamente) e de um traficante conhecido como Jefinho, que está foragido.
Apontado pela polícia como responsável por levar a adolescente estuprada ao "abatedouro", Canário teve suspensa pela Justiça, nesta terça, a liberdade condicional em que estava desde fevereiro, após ser condenado por roubo e porte ilegal de arma. Ele é considerado foragido.
Uma perícia está sendo feita no segundo vídeo apreendido no celular de Raí, que foi encontrado na casa de um amigo dele, em Madureira, zona norte do Rio, na sexta (3). A análise deve ser concluída no fim da semana.
A primeira gravação, na qual um homem toca nas partes íntimas da garota em meio a risadas de outros rapazes, já era considerada prova do crime por Cristiana Bento, titular da Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima e que assumiu a investigação.
De acordo com a polícia, Raí enviou esse vídeo para pelo menos quatro pessoas.
A segunda gravação reforçou a convicção da delegada, ao mostrar a garota reagindo ao estupro e negando contato sexual com os rapazes.
BUSCA PELA CASA
Após passar mais de um dia no "abatedouro", a adolescente saiu do local na noite de domingo (22), suja e vestindo roupas de homens.
A polícia pretende voltar ao morro da Barão na quinta (9) para procurar a primeira casa em que a jovem ficou acompanhada de uma amiga, Raí e Lucas Perdomo.
Este último, que chegou a ser preso, mas foi liberado por falta de provas, será chamado para acompanhar os investigadores e mostrar a localização do imóvel.
A delegada Cristiana Bento pretende verificar qual a distância entre a primeira casa e a segunda. Assim, buscará reconstituir a rota realizada por Canário e pela vítima no final de semana do crime para desfazer algumas dúvidas sobre esse relato que compõe a investigação.
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CRONOLOGIA DO CASO
21.mai.2016
1h - A adolescente de 16 anos vai a um baile funk no morro da Barão, na zona oeste do Rio, acompanhada de uma amiga; lá, já no fim da noite, encontra Rai de Souza, 22, e Lucas Perdomo, 20
7h - Os dois casais vão para uma casa abandonada e fazem sexo consentido –a vítima com Rai, a amiga com Lucas
10h - Lucas sai para levar sua acompanhante em casa e Rai também deixa o local; segundo depoimentos dos três, a vítima resolveu ficar. Sozinha, foi encontrada por traficantes e levada por um deles, Moisés Camilo de Lucena, o Canário, para a casa conhecida como "abatedouro", onde foi estuprada
22.mai.2016 - Após passar mais de 24 horas no "abatedouro", a vítima é encontrada na noite de domingo por Rai, que estava acompanhado de Raphael Belo, 41, e do traficante Jeferson, conhecido como Jefinho; os três e mais um quarto homem, não identificado, gravam dois vídeos em que abusam da jovem; ela é ajudada por um conhecido, apelidado Fubá, e liberada para voltar para casa
24.mai.2016 - A vítima fica sabendo que um dos vídeos, que mostram seu estupro, circula na internet e volta ao morro para falar com o chefe do tráfico, Sergio Luiz da Silva Junior, conhecido como Da Russa, e tentar reaver seu celular, que havia sido roubado
25.mai.2016 - A família da menina é avisada por um vizinho sobre a gravação. No vídeo, de 38 segundos, um grupo de quatro homens debocha da vítima e ao menos um deles toca nas partes íntimas da garota e diz que ela foi violentada por "mais de 30". Em 2009, a lei 12.015 foi alterada e passou a considerar como estupro, além da conjunção carnal, atos libidinoso, como o que é mostrado no vídeo
26.mai.2016 - A jovem presta o primeiro depoimento à polícia, é medicada em um hospital e faz exames no IML (Instituto Médico Legal), que não detectam material biológico ou marcas de lesão; policiais atribuem isso ao longo tempo decorrido entre o crime e o exame
27.mai.2016 - Ela presta mais dois depoimentos à polícia,assim como Rai de Souza, Lucas Perdomo e a jovem que os acompanhou na noite de sábado; a polícia localiza a casa em que o estupro aconteceu
28.mai.2016 - A então advogada da vítima, Eloísa Samy, pede à Promotoria do Rio o afastamento do delegado Alessandro Thiers. Segundo Samy, Thiers estava tratando o caso com "machismo e a misoginia"
29.mai.2016 - Pressionada, a Polícia Civil do Rio passa o comando das investigações à delegada Cristiana Bento, da DCAV (Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima); a pedido da família, a Defensoria Pública passa a defender a menina
30.mai.2016 - Polícia Civil realiza operação para prender seis suspeitos de participar do crime; Rai de Souza, 22, e Lucas Perdomo, 20, são detidos; o jogador seria liberado quatro dias depois, por falta de provas que sustentassem sua prisão
31.mai.2016 -A vítima e sua família entram no programa federal de proteção à testemunha, o que significa que a menina pode ganhar uma nova identidade e deixar o Rio; a polícia volta ao "abatedouro" e apreende dois colchões com manchas de sangue
1º.jun.2016 - Um terceiro suspeito se apresenta à polícia. Raphael Duarte Belo, 41, aparece no vídeo fazendo uma selfie ao lado do corpo da jovem
2.jun.2016 - Polícia Civil do Rio pede a prisão de mais dois homens: Moisés de Lucena, o Canário, e Jeferson, o Jefinho; ambos teriam estado com a vítima durante a gravação dos vídeos em que ela é estuprada. Com isso, passam a ser oito os suspeitos de envolvimento no crime
3.jun.2016 - O jogador de futebol Lucas Perdomo, 20, é liberado do presídio Bangu 10, no Rio, para onde havia sido encaminhado no dia anterior, após passar quatro dias em detenção na Cidade da Polícia. Segundo a delegada responsável pelo caso, não havia provas suficientes para que ele continuasse preso
5.jun.2016 - Depois de encontrar o celular de Rai na casa de um amigo dele, em Madureira (zona norte do Rio), a polícia examina o aparelho e descobre um segundo vídeo do estupro, além de fotos e gravações que incriminam o jovem de ligações com o tráfico
6.jun.2016 - A amiga da vítima, que esteve com ela e com os dois jovens no baile funk e na primeira casa, depõe novamente à polícia e reafirma sua versão de que houve sexo consensual entre a adolescente de 16 anos e Rai, e que a vítima ficou sozinha na casa depois disso
7.jun.2016 - Perícia conclui que há quatro vozes no primeiro vídeo sobre o estupro
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