Polícia é última barreira para evitar a barbárie, diz novo secretário do Rio
Recém-nomeados secretário da Segurança Pública do Rio em meio a uma grave crise financeira no Estado, o delegado federal Roberto Sá, 51, afirma que a só "vocação, juramento e sacerdócio" mantém a rotina do policial sob ameaça de atraso de salários.
"Existe uma vocação, um juramento e um sacerdócio da profissão. A polícia é a última barreira que a sociedade tem para evitar a barbárie", afirmou à Folha.
Escolhido para substituir José Mariano Beltrame, ele criticou o pacote fiscal enviado pelo governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) à Assembleia Legislativa. Entre as medidas, previa-se uma alíquota de 30% sobre o salários de servidores para a previdência -proposta já recusada pelos deputados.
"É uma classe que já recebe pouco pelo que faz."
O secretário disse que não há expectativa de novas UPPs no atual cenário de cortes de gastos. Afirmou que promessas eleitorais do ex-governador Sérgio Cabral ("pacificar todas as favelas") em 2010 e de Pezão em 2014 (40 novas UPPs) eram inexequíveis.
"Em campanha fala-se muito. A gente fez o que era possível", afirmou.
Ricardo Borges/Folhapress | ||
Delegado federal Roberto Sá, 51, novo secretário da Segurança do Rio |
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Folha - O Rio retrocedeu ao cenário de 2006, quando a sede do governo foi atacada?
Roberto Sá - Já estivemos melhor. Ainda não chegamos ao nível de 2006. Embora alguns indicadores de criminalidade possam estar voltando para aqueles patamares, a gente não vê criminosos com a audácia que tinham, nas ruas caçando policiais.
A UPP gerou uma grande expectativa e agora está em xeque. O que mudou?
A resposta às causas exige um sistema, não só polícia. O sistema como um todo está desequilibrado. A UPP veio com uma estratégia um pouco diferente de várias outras com o mesmo conceito de polícia comunitária. O problema é que é sempre a polícia se reinventando. O sistema como um todo não tomou medidas para que as causas da violência pudessem ser atacadas. No mundo inteiro, não se cobra só da polícia.
Das 38 UPPs, quantas o sr. considera problemáticas?
Mais da metade ainda está dentro do esperado. Vamos criar um comitê de avaliação das UPPs para ter esse olhar com indicadores e tentar me antecipar ao que aconteceu na Cidade de Deus [com confrontos e mortes]. Por outro lado, esperar o que, olhando a história do Rio? Não dava para ter a utopia de achar que tudo seria maravilhoso. A polícia tenta dar uma contribuição. Pesquisa da FGV mostrou que 87% dos moradores de favelas com UPP desejam que ela permaneça.
A expansão das UPPs foi mais acelerada do que devia?
Julgar obra pronta é fácil. Na hora de implementar, é preciso fazer escolhas. Elas foram possíveis naquele período. A velocidade delas, está demonstrado, não foi a velocidade do poder público.
O ex-governador Sérgio Cabral prometeu que 'todas as favelas estariam pacificadas' até o fim do mandato [2014].
Não era possível.
O governador Luiz Fernando Pezão prometeu 40 UPPs na campanha de 2014.
Também não é possível.
Essas promessas não prejudicaram a expectativa sobre as UPPs?
Essa pergunta tem que ser feita para eles. Hoje não é possível avançar. Mas é possível estabilizar e trabalhar para melhorar. Em campanha fala-se muito. A gente fez o que era possível.
O Estado vive um cenário de penúria financeira. Como enfrentar o crime assim?
Existe uma vocação, um juramento e um sacerdócio da profissão. Se nós nos acomodarmos e cruzarmos os braços... A polícia é a última barreira que a sociedade tem para evitar a barbárie. As duas polícias estão trabalhando para caramba com toda essa dificuldade. Temos que otimizar recursos humanos.
O sr. falou sobre a barbárie, mas na Cidade de Deus, há suspeita de execução por parte de policiais.
O laudo não aponta sinal de execução. É uma polícia que atua dentro da lei. Se qualquer servidor se afastar dela, tem que sofrer com os rigores da lei.
O policial do Rio não naturaliza o confronto com mortes?
Não quero pensar assim. Quero que ele entenda que quem tem que fazer Justiça é o Judiciário. Mas o fato é que [o policial] passa a ter um controle emocional maior. Mas o policial não quer isso, ele quer tirar um serviço como o policial londrino. Oito horas patrulhando a rua e depois vai para casa cuidar dos filhos.
Como o ajuste fiscal atrapalha esse sacerdócio?
Pode atrapalhar muito. Pedi uma agenda [ao governador] e levei a eles os anseios e abrimos um canal. Mas ele [canal] foi aberto depois do envio do pacote. Nem sabíamos o que vinha. É uma classe que já recebe pouco pelo que faz. O Estado precisa de uma reforma, mas não tão gravosa para esses servidores.
Isso não pode atrapalhar o comando da tropa?
Todo profissional desmotivado tende a produzir menos.
Houve relatos de dois policiais que abandonaram a repressão aos manifestantes.
O comando da PM, que tem atendido às minhas diretrizes, não me confirmou isso. Manifestação pacífica é ponto fundamental.
A prisão de um ex-governador que tem ligações com a atual gestão não afeta o comando e desmotiva a tropa?
Toda a prisão de qualquer agente público que exerceu uma função de liderança acaba causando nos liderados uma perplexidade. Isso faz com que as pessoas questionem.
O sr. como policial que trabalhou com ele, como se sente com a prisão de Cabral?
A gente prefere esperar e aguardar as investigações. No tempo que tive aqui, o tratamento sempre foi muito respeitoso, estimulando decisões técnicas.
O sr. acha que o Rio precisa de uma intervenção federal na segurança?
Por que na segurança? Se tiver que ser em segurança, não sei porque no Rio. Se olhar o ranking de homicídios dolosos por 100 mil habitantes, o Rio está longe de ser o que tem os maiores indicadores. Não vejo motivos. Tem que vir muitos Estados na frente antes de acontecer no Rio.
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RAIO-X: ROBERTO SÁ
Cargo: Secretário da Segurança do Rio
Funções anteriores: Subsecretário de Plane-jamento da Secretaria de Segurança do Rio (2007-2016), delegado federal, tenente-coronel da PM do Rio e instrutor do Bope (Batalhão de Operações Especiais)
Formação: Direito na PUC-Rio e pós-graduação em controle externo na FGV
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