Futuro após Rio-2016 preocupa atletas brasileiros
Apesar dos bilhões investidos na preparação da equipe brasileira para os Jogos Olímpicos do Rio, não há garantia de que os recursos sejam mantidos após o megaevento.
E essa incerteza incomoda até mesmo os atletas mais importantes do país, que detêm patrocinadores mas também dependem de verba pública.
"Temo pelo esporte depois do Rio. Pode haver um corte muito grande no investimento e acabar com tudo o que está sendo feito", disse anteontem à Folha o nadador Thiago Pereira, 28, vice-campeão olímpicos dos 400 m medley nos Jogos de Londres-2012.
Para Londres-2012, o investimento total no esporte nacional chegou a R$ 2 bilhões -e o país ficou em 22º lugar. A Austrália, décima naquela Olimpíada, gastou R$ 1,7 bi. Outros personagens importantes do esporte nacional também compartilham da preocupação.
"A gente sempre pensa no que vai ser depois de 2016. E aí, vai acabar tudo? Causa um incômodo", afirmou o ginasta Arthur Zanetti, campeão olímpico em 2012 e mundial nas argolas em 2013. "Haverá outras Olimpíadas, e o investimento precisa continuar. Na verdade, até acho que precisa aumentar".
Martin Bernetti/AFP | ||
O ginasta brasileiro Arthur Zanetti compete nos Jogos Sul-Americanos do Chile, em Santiago |
Tanto Pereira quanto Zanetti estão contemplados pela Bolsa Pódio, benefício criado pelo governo federal neste ciclo olímpico que dá até R$ 15 mil mensais para preparação para os Jogos de 2016.
Todos os recursos estão dentro do chamado Plano Brasil Medalhas, que agregou R$ bilhão ao que já era investido no esporte nacional. O valor foi dividido entre 21 esportes olímpicos 15 paraolímpicos.
Até mesmo técnicos têm direito a uma bolsa especial. Um deles é Marcos Goto, treinador de Zanetti.
Eleito o melhor do país em 2013 em premiação do COB (Comitê Olímpico Brasileiro), ele reconhece que hoje o país depende muito de dinheiro vindo de estatais. E uma eventual fuga deles pós-2016 pode ser muito preocupante.
"No caso da ginástica, quem põe muito dinheiro é a Caixa, que patrocina a confederação. Se ela sair ou diminuir o investimento depois da Olimpíada, aí sim é complicado", disse.
"Mas a gente não tem garantia nenhuma de que os recursos vão ser mantidos."
Destaque da natação nos Jogos Sul-Americanos de Santiago, Matheus Santana, 17, está em seu primeiro ciclo olímpico. Disputou no Chile, inclusive, sua primeira grande competição com a seleção adulta. Mas o assunto também já passou por sua cabeça.
"Já conversei com outros atletas sobre como será após 2016. ao meu ver, hoje há bom apoio, mas depois é torcer para que não acabe", disse o carioca, que ganhou três ouros no Chile -100m livre, 4 x 100 m medley e 4 x 100 m livre.
Sátiro Sodré - 9.mar.2014/Divulgação/SSPress | ||
O nadador Thiago Pereira em prova dos Jogos Sul-Americanos do Chile, em Santiago |
Experientes de Olimpíadas passadas, os também nadadores Nicholas dos Santos e Tales Cerdeira acreditam que é muito difícil o investimento ser mantido. "Óbvio que vai cair. Mas, independentemente, temos que acreditar que a Rio-2016 vai ser boa para o país", disse Santos, campeão mundial dos 50 m borboleta em piscina curta (25 m) em 2012.
"Isso [ter desempenho] pode criar pressão. Mas haverá uma pressão natural para o atleta. Para o brasileiro, o que importa é medalha, e de ouro", acrescentou Cerdeira, que disputou os Jogos de Londres.
ATLETISMO
O bicampeão mundial do salto em distância em campeonatos indoor, Mauro Vinícius da Silva, o Duda, acredita que o investimento vai continuar após os Jogos do Rio, mesmo que com uma redução em parte das modalidade.
"Acredito que vai continuar o investimento. Pode ser que diminua, talvez uma parte dele seja hoje feita para obtenção de resultados [em 2016]. Tenho certeza que a maioria continuará", disse o saltador paulista de 27 anos em entrevista coletiva após a conquista no Mundial de Sopot, na Polônia.
Duda não sabe se seguirá competindo após a Rio-2016. Já a companheira de equipe, Fabiana Murer, do salto com vara, afirmou que vai se aposentar depois da próxima Olimpíada. Mesmo assim, torce para que o investimento continue.
"O esporte têm poucos patrocinadores. A BM&F Bovespa é a maior equipe e não tem outra como ela. Estou na equipe há 16 anos e falo que sou uma pessoa com muita sorte porque tenho esse apoio desde o início da minha carreira", disse a saltadora de 32 anos, campeã mundial em pistas coberta e ao ar livre.
"O Brasil é um país com muitos talentos e acho que precisaria de mais apoio. Se tivesse esse apoio, teria mais atletas com medalhas. Estou tranquila porque depois de 2016 eu vou parar, mas claro que penso nos atletas que estão vindo. Acredito que vai haver empresas querendo apoiar", completou a atleta em evento da equipe na sede da Bolsa de Valores em São Paulo, nesta terça-feira.
O presidente da BM&F Bovespa, Edemir Pinto, disse no evento que o investimento da empresa no atletismo vai continuar mesmo depois de 2016. "Essa decisão nós já tomamos, nosso investimento é a longo prazo", afirmou.
OUTRO LADO
Procurado pela Folha, o COB se manifestou por meio de seu superintendente Marcus Vinícius Freire. Para o ex-jogador de vôlei, "esse é um caminho sem volta", em relação ao investimento no esporte.
"Desde os Jogos Sul-americanos Brasil 2002, passando pelo Pan de 2007 e a candidatura vitoriosa do Brasil para sede dos Jogos Olímpicos, o esporte brasileiro vem evoluindo em todos os sentidos, inclusive em relação às fontes de financiamento para o seu desenvolvimento", completou.
Segundo Freire, "os Jogos Olímpicos Rio-2016 serão o ápice desse processo".
"Eles contribuirão para manter o esporte nesse patamar, com mais investimentos públicos e privados, maior visibilidade nas TVs, e consequentemente maior conhecimento do público sobre os esportes olímpicos".
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