Racismo no futebol espelha o da sociedade, diz francês campeão em 98
Com 142 participações em jogos da seleção francesa e passagens por clubes europeus como Juventus e Barcelona, o ex-jogador Lilian Thuram, 42, perdeu a conta de quantas vezes foi alvo de ofensas racistas dentro de estádios de futebol.
Diante do preconceito recorrente em arquibancadas de todo o mundo, ele defende que a mudança deve ser conduzida pelos protagonistas da partida.
"Quando todos os jogadores decidirem abandonar o campo diante de ofensas racistas, a situação nos estádios pode melhorar", disse Thuram, que veio ao Brasil como palestrante do Programa África Hoje realizado no Museu de Arte do Rio (MAR).
"Por que um jogador aceita permanecer numa partida quando um colega dele é alvo de racismo? Esse jogador também precisa ser questionado, também tem sua parcela de responsabilidade neste tipo de problema", acrescentou Thuram, zagueiro campeão mundial pela França em 1998.
Nos últimos 30 dias, dois jogadores brasileiros foram atacados com xingamentos racistas: Tinga, do Cruzeiro, foi hostilizado em partida da Libertadores contra o Real Garcilaso, disputada em Huancayo, no Peru, em 12 de fevereiro, enquanto o volante Arouca, do Santos, foi ofendido por torcedores do Mogi Mirim, que jogava em casa pelo Campeonato Paulista, na semana passada.
Para Thuram, o preconceito constatado em partidas de futebol extrapola a esfera esportiva.
"O racismo no futebol espelha o racismo da sociedade. O que é mais violento: ser xingado num campo de futebol ou não conseguir um emprego pelo fato de ser negro? É uma hipocrisia da sociedade associar o racismo apenas ao futebol," disse Thuram, que encerrou a carreira nos gramados em 2008, aos 36 anos, após o diagnóstico de uma anomalia cardíaca.
Na mesma época, ele criou a Fundação Lilian Thuram, com o objetivo de educar a população contra o racismo.
Paula Giolito/Folhapress | ||
O ex-jogador da seleção francesa Thuram posa para fotos no Museu de Arte do Rio |
RACISMO NO BRASIL?
No ano passado, ele publicou o livro "Minhas Estrelas Negras - De Lucy a Barack Obama", onde destaca a importância de personagens negros ao longo da História.
"Nas salas de aula, inclusive no Brasil, a referência que temos sobre os negros está sempre associada à escravidão. É uma imagem que se perpetua nas escolas e isso precisa mudar", pondera Thuram.
Em campo, ele chegou a se espantar com o desconhecimento de jogadores brasileiros sobre o tema: "Me lembro de ouvir um deles dizer que não existia racismo no Brasil".
Thuram disse que sempre enfrentou com tranquilidade os insultos sofridos em campo. E cita, como exemplo, o tempo em que jogou na Italia, primeiro pelo Parma e depois pela Juventus.
"Fui vítima de racismo na Itália e ainda hoje você vê esse tipo de coisa acontecendo por lá como foi o caso de [Mario] Balotelli. Mas isso se repete por todo o mundo," lamentou Thuram.
O ex-jogador francês é cético quanto ao empenho dos organizadores de competições em coibir os atos de racismo.
"As federações tendem a não aceitar as decisões mais radicais porque desejam garantir o espetáculo e todo o negócio envolvido num torneio de futebol."
Sobre a reação esperada dos jogadores, ele citou o caso da equipe Milan que abandonou um amistoso diante de ofensas vindas da arquibancada. E conclui: "Mas, em uma partida profissional, até onde sei, os jogadores nunca tiveram a coragem de sair de campo".
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