Palestina usa futebol para ajudar reconhecimento do país
Mais do que uma vitória improvável ou gols, Husam Younis, diretor técnico da seleção da Palestina, sonhava com dois momentos na disputa inédita da Copa da Ásia: a entrada em campo do time com a bandeira do país e a execução do hino nacional. A equipe fez sua estreia na competição nesta segunda-feira (12) e foi derrotada pelo Japão por 4 a 0, em jogo realizado na cidade australiana de Newcastle.
"Ver a bandeira da Palestina sendo exibida dentro da Austrália, que não nos reconhece como país, é mais do que um gol", afirma Younis à Folha.
O dirigente se refere à posição do governo australiano no Conselho de Segurança da ONU, no dia 30 de dezembro de 2014, que vetou uma proposta de criação do Estado da Palestina.
O projeto previa ainda a retirada das forças de segurança de Israel do território até 2017. Oito países votaram a favor, mas Austrália e Estados Unidos foram contra a medida, que precisava do apoio de nove nações para ser aprovada.
"Viemos aqui jogar futebol, mas sabemos que a nossa presença representa mais do que o esporte. O nosso hino sendo ouvido aqui na Austrália, a nossa bandeira sendo vista é uma resposta. Mostramos que somos um país, um povo livre, que tem o direito de ser representado", defende Younis.
Pela primeira vez na história, a Palestina disputará a Copa da Ásia, torneio que tem uma fase eliminatória antes da disputa no país sede.
Aceito como seleção nacional pela Fifa em 1998, o país só foi liberado para disputar partidas oficiais em seu território em 2011. Antes, a entidade máxima do futebol não permitia a realização de jogos internacionais na região por entender que não havia garantias de segurança para as equipes rivais.
ENTRE BOMBAS E PERDAS
O caminho desde a conquista da vaga para a Copa da Ásia, em maio de 2014, até o desembarque na Austrália na última semana foi tortuoso.
Responsável pela campanha vitoriosa nas eliminatórias do torneio continental, o técnico Jamal Mahmoud teve sua casa bombardeada durante ataques israelenses ao território palestino, em setembro. O treinador sobreviveu, mas depois do caso resolveu pedir demissão, segundo ele explicou na época, para "cuidar de sua família".
Em 2014, a Federação Palestina de Futebol entregou à Fifa um relatório com denúncias de agressões do exército de Israel a atletas do país.
Um dos casos mais conhecidos é o do jogador Mahmoud Kamel Sarsak, preso em 2009 pelas autoridades israelenses, quando se deslocava de Gaza para o leste do país. O motivo, segundo o exército, era uma suposta relação dele com a Jihad Islâmica, força militar islâmica, responsável por ataques a Israel.
A ligação com o grupo foi negada pela Federação de Futebol da Palestina e pelo jogador, que ficou detido por três anos.
"Como todos os palestinos, os atletas sofrem com injustiças nos pontos de checagem do exército de Israel. Somos impedidos de nos deslocar no país, o que atrapalha o desenvolvimento do esporte", diz Younis.
Dias antes do embarque para a Austrália, o atacante Sameh Ma'raba, convocado para a Copa da Ásia, teve seu passaporte cassado pelas autoridades israelenses e foi impedido de viajar. Em 2014, ele esteve preso por oito meses também por suposta ligação com grupos militares da Palestina.
Com tantos percalços e um futebol profissional ainda engatinhando, os jogadores reconhecem que dificilmente a equipe passará da primeira fase do torneio.
"Somos o time mais fraco, que teve mais dificuldade na preparação, porém vamos fazer uma Copa da Ásia digna", admite o lateral esquerdo Alexis Norambuena. "Mas o futebol é mágico. Seria lindo mostrar para o mundo outra imagem da Palestina que não a dos conflitos e mortes", completa.
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