Engenheiros da Odebrecht são réus por mortes em acidente no Itaquerão
O Ministério Público de São Paulo denunciou seis pessoas pela queda de um guindaste durante a construção da Arena Corinthians. O acidente, que aconteceu em novembro de 2013, matou dois funcionários, Ronaldo Oliveira dos Santos e Fabio Luiz Pereira.
A Justiça entendeu que a acusação preenchia os requisitos formais exigidos e deu início a uma ação penal, conforme a Folha apurou.
Dos seis, quatro trabalham para a Odebrecht e dois para a Locar, empresa terceirizada pela construtora para a operação dos guindastes.
Os réus respondem por causar desabamento combinado com resultado de morte. Se forem condenados, eles podem chegar ao máximo de quatro anos de reclusão e mínimo de um ano.
Entre os indiciados, está Frederico Barbosa, engenheiro do alto escalão da Odebrecht e número dois das obras do estádio, abaixo apenas de Antônio Gavioli, diretor de contratos.
Foi Barbosa quem conduziu as reformas no sítio do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em Atibaia.
Outro réu é José Walter Joaquim, funcionário da Locar e operador do guindaste que caiu durante a construção.
Os demais são Leanderson Breder Dias, supervisor da Locar, e Márcio Wermelinger (também engenheiro), Valentim Valeretto (encarregado) e Gilson Guardia (técnico), esses três da Odebrecht.
"Os denunciados concorreram de algum modo, cada qual na sua respectiva área, para a ocorrência do acidente e consequente morte dos infelizes funcionários", diz trecho da denúncia feita pelo Ministério Público, assinada pelo segundo promotor de Justiça Criminal de Itaquera, Joacil da Silva Cambuim.
"Isso porque ficou demonstrado o nexo causal entre as condutas dos denunciados e o resultado naturalístico, a morte dos dois empregados que se encontravam nas proximidades do local."
No inquérito aberto pelo Ministério Público e pela Polícia Civil, os envolvidos no acidente e as testemunhas foram ouvidos.
FALHA NO TERRENO
Na resposta à acusação, a Odebrecht postulou a absolvição sumária dos réus na ação penal, mas a juíza Alice Galhano da Silva decidiu pela continuação, por não vislumbrar, no primeiro momento, elementos para isso, em despacho de 20 de janeiro.
De acordo com a acusação do órgão estadual, "os funcionários da Odebrecht agiram com culpa, na modalidade imperícia, ao deixar de tomar todas as cautelas para que a área por onde se movimentaria o guindaste fosse corretamente compactada".
O Ministério Público utiliza como base da denúncia a perícia feita pelo Instituto de Criminalística, que apontou como causa do acidente "falha na compactação do terreno por onde trafegava o guindaste no momento da operação do içamento do módulo que veio a desabar sobre a estrutura do estádio".
Já os funcionários da Locar se tornaram réus por terem acompanhado todo o processo de preparação do terreno e também por terem participado da aprovação do "plano de rigging", que é uma espécie de "plano de voo" do guindaste para uma operação específica.
A peça que estava sendo içada na construção do estádio e que caiu era a última de um total de 38, que faziam parte da cobertura da arena. As outras 37 foram colocadas sem problemas, todas cumprindo o mesmo roteiro.
OUTRO LADO
Na defesa preliminar do processo, os advogados dos réus da Odebrecht responsabilizam os dois funcionários da Locar pelo acidente.
"Mesmo percebendo a criticidade da operação decidiram prosseguir com ela e, o que é mais grave, mesmo tendo tempo suficiente para aborta-la ou, ao menos, dar ordens para que a área fosse evacuada, não o fizeram, assumindo o risco", consta no documento apresentado pa-ra a Justiça.
Procurado pela Folha, David Rechulski, advogado que representa a construtora e os quatro réus que trabalham para a empresa, afirmou que há "laudos de renomados especialistas que também atestam tal argumento e que o Ministério Público ofereceu a denúncia para que exista uma conclusão judicial sobre o caso, pois as dúvidas existentes, neste momento, suscitam a existência de um processo para dirimi-las".
Já a Locar, por meio de nota enviada pela assessoria, informou à reportagem que "há dois laudos conclusivos que demonstram ter sido o solo a causa do desabamento ocorrido", o que responsabilizaria a Odebrecht.
Também diz que "tais laudos, do Instituto de Pesquisas e Tecnologia (IPT) e do Instituto de Criminalística da Polícia Científica de São Paulo, têm conteúdo e conclusões irrefutáveis e anulam argumentações em contrário".
LAUDO SOB SIGILO
O laudo do IPT foi encomendado pelo Ministério do Trabalho, que trabalhou sob sigilo durante os últimos tempos. O documento demorou quase dois anos para ficar pronto, e o órgão do governo se recusou a torná-lo público para a imprensa.
Após tentativas frustradas de obter esse laudo, a Folha pediu o estudo por meio da Lei de Acesso à Informação e obteve resposta de que o documento seria publicado em breve no site do ministério, o que ainda não aconteceu.
Nesta semana, a Justiça começará a fase de instrução processual, ouvindo acusados e testemunhas.
A primeira audiência foi marcada para quarta (16).
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