Para quem tinha alguma dúvida da força do fenômeno Gustavo
Kuerten, a última semana foi um tapa na cara.
A negativa do tenista em se incorporar à delegação brasileira
em Sydney por causa do conflito de patrocinadores provocou
uma verdadeira histeria coletiva.
A reação avassaladora do público fez as partes chegarem a
um acordo menos de 24 horas depois. E por um único motivo:
estavam apavoradas com as eventuais e prováveis consequências.
Larri Passos, técnico de Kuerten, creditou a volta do jogador
à mídia. Assim como quase todos os integrantes do staff do
tenista, o treinador parece ainda não ter se dado conta do
que tem em mãos.
Kuerten, como Senna e Pelé, não foi inventado pela mídia.
Ele simplesmente caiu no colo da imprensa ao vencer em Roland
Garros, em 1997. Desde então, não fez esforço nenhum para
aparecer, muito menos para ser simpático. Aliás, ao contrário
do que sugere sua receptiva figura, ele detesta câmeras e
microfones.
E é isso que instiga. Senna e Pelé foram meticulosos não só
na construção como na manutenção de suas imagens. Enquanto
o primeiro tinha, por exemplo, fotógrafo exclusivo para acompanhá-lo
até na hora do jet-ski, o segundo manteve por muitos anos
um contrato de baixo valor com uma grande rede de varejo apenas
para se manter em evidência.
Enquanto Pelé preferia e prefere criar impacto nas entrevistas
_seu último grande lance foi criticar o presidente_, Senna
trabalhava com a exclusividade. Escolhia um grande veículo
de comunicação do país, conforme sua conveniência, e dava
a este sua única grande entrevista do ano.
Kuerten, por sua vez, não dá. Em alguns torneios, solta amenidades,
quatro ou cinco respostas, nada além disso. Muitas vezes,
fala o óbvio, mas com uma naturalidade que cativa de tão rara.
("Viajo em qualquer horário. É só ter uma hora para fazer
a mala, pegar duas raquetes e ir para Sydney. Estou louco
para ver meus camaradas.")
Rara, porém, em estrelas, não em um menino cabeludo e surfista
de 23 anos, que resolveu jogar tênis na vida e, um belo dia,
afirmou que não iria aos Jogos Olímpicos apenas para se manter
fiel ao patrocinador, nunca para causar comoção nacional.
Não interessa se esse patrocinador agiu de má fé ou se demonstrou
enorme incompetência ao não prever que teria problemas com
sua estrela, a única, aliás, que terá na Austrália.
Não interessa também se o outro lado estava coberto de razão.
E nem de longe interessa o fato de que o tenista está longe
de ser favorito no torneio olímpico, considerado barbada para
os locais.
O que interessa é Kuerten, com mídia ou sem mídia, com uniforme
ou sem uniforme, líder ou não do ranking, ganhando título
ou perdendo na primeira rodada. ¦Para o público, ele já é
raro.
*
A Ferrari está usando gasolina resfriada em Monza, algo que,
segundo os entendidos, dá uns quatro cavalos a mais de potência.
O artifício será proibido em Indianápolis, já comunicou a
FIA. E por que não agora, na Itália? Os ingleses têm do que
reclamar.
NOTAS
Burti
A Jaguar confirmou nesta semana o nome do brasileiro para
2001. Agora só faltam as definições de Diniz e Zonta, que,
dada a oferta atual, faria ótimo negócio se aceitasse a vaga
de piloto reserva oferecida pela McLaren.
Button
Gesto raro, o jovem inglês não se esquivou de uma saia justa
com a Benetton em Monza para lamentar publicamente ter sido
preterido pela Williams. De olho na sombra de Montoya, Ralf
também saiu em defesa do companheiro de equipe.
Recado
Por conta da Olimpíada, a coluna se ausenta do jornal pelas
próximas três semanas. A meia dúzia que a acompanha, porém,
pode optar pela versão eletrônica, que continua a todo pano,
com especial atenção a Indianápolis.
E-mail: mariante@uol.com.br
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