Livro destrincha altos e baixos da formação do mito Frank Sinatra
O escritor americano James Kaplan é a prova viva do fascínio que a voz do cantor Frank Sinatra ainda exerce no imaginário popular.
Ele escreveu mais de 700 páginas para contar, em termos gerais, como Sinatra construiu a sua arte --uma arte sustentada pela voz.
Crítica: Livro sobre Frank Sinatra patina na falta de intimidade com o mundo musical
O título da biografia vai direto ao ponto: "Frank: A Voz".
"Há milhares de vozes maravilhosas no mundo, tecnicamente perfeitas. Mas a voz de Sinatra é única", diz Kaplan. "Ele colocou emoção e inteligência nas canções."
Sinatra (1915-1998) tem sua vida escrutinada mais uma vez. Mas as centenas de páginas de "A Voz" dedicam-se apenas ao período que vai de seu nascimento ao Oscar de ator coadjuvante que levou para casa pelo filme "A um Passo da Eternidade" (1953).
O recheio do livro é também feito de mitologias. Baixinho, careca antes dos 30, nascido a fórceps com inacreditáveis seis quilos, deixado de lado numa pia enquanto a mãe era socorrida, o homem que comoveria multidões e levaria as garotas à loucura era um cara triste, ainda que bem-dotado.
"Ele não tinha autoestima elevada", explica o biógrafo. "Teve uma educação deficitária, e ainda por cima era ítalo-americano." Ítalo-americanos e negros tinham o mesmo status entre os anos 1920 e 1930 nos EUA: viviam para cantar, dançar, falar alto e comer macarrão (melancia, no caso dos negros).
Esse era o estereótipo, até que o rapaz franzino de Hoboken, Nova Jersey, filhinho da mamãe, mas também maltratado por ela, tomou conta das paradas com o que tinha de melhor: a voz e os implacáveis olhos azuis.
"Fiquei surpreso ao descobrir como ele trabalhava duro a sua arte", diz Kaplan. O livro conta como Sinatra observava a respiração do trombonista Tommy Dorsey, com quem trabalhou no começo da carreira e de quem se desligou de forma traumática. E mostra como o cantor aprendeu a usar o diafragma.
Mas o principal, de acordo com a biografia, estava na obsessão que Sinatra tinha em relação às letras. Antes de soltar a voz, ele estudava as palavras com profundidade.
Kaplan vai fundo na relação de Sinatra com a máfia, assunto sempre candente desde que Mario Puzo criou, em "O Poderoso Chefão", o personagem John Fontaine.
Trata-se de um cantor romântico e decadente que pede ajuda aos Corleone para ganhar um papel no cinema --e o consegue quando o diretor é intimidado ao encontrar a cabeça de um puro-sangue em cima de sua cama.
Sinatra teria inspirado Puzo, e vestiu a carapuça ao esmurrar o autor numa festa.
Quando ganhou um personagem em "A um Passo da Eternidade", Sinatra estava na pior, desacreditado e endividado. Dedicou-se tanto ao papel, o soldado Angelo Maggio, que ganhou o Oscar e salvou a própria vida.
O biógrafo escreve agora a continuação da saga, abarcando os 60 anos de atividade do cantor. Certamente vai passar pela parceria com Tom Jobim. "Fico escutando Tom o tempo todo. Ele e a Voz fizeram um som miraculoso."
CADÃO VOLPATO é músico e escritor, autor de "Pessoas que Passam pelos Sonhos" (ed. Cosac Naify)
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