Carta-manifesto de biógrafos encerra festival em Fortaleza
Reunidos num festival de biografias em Fortaleza, 12 dos principais biógrafos do país divulgaram no domingo (17/11) uma carta em que defendem as ações no Supremo Tribunal Federal e no Congresso Nacional para alterar a lei que permite censura prévia a biografias e dizem confiar no "espírito democrático e republicano" dos congressistas e dos ministros do STF.
"A legislação em vigor transformou nosso país na única grande democracia do planeta a consagrar a censura prévia, em evidente afronta aos princípios de liberdade de expressão e direito à informação conquistados com a Constituição Cidadã de 1988", diz a "Carta de Fortaleza".
O trecho faz referência aos artigos 20 e 21 do Código Civil, por meio dos quais é possível impedir a publicação de biografias sem autorização prévia.
"Nós, que vivemos sob a censura imposta pela ditadura instaurada em 1964, recusamo-nos a aceitar agora formas de cerceamento da livre manifestação de ideias e relatos históricos. O conhecimento da própria história é um direito dos brasileiros", diz outra passagem.
O manifesto veio a público no encerramento do festival e quatro dias antes do início da audiência pública no STF para debater a ação movida por editoras para modificar a lei. A audiência acontece na quinta e na sexta desta semana.
Assinam a carta o jornalista Mário Magalhães, autor de uma biografia do líder guerrilheiro Carlos Marighella, curador da programação literária do evento e redator do documento, e os 11 convidados do festival.
São eles: Fernando Morais, Guilherme Fiuza, Humberto Werneck, João Máximo, Josélia Aguiar, Lira Neto, Lucas Figueiredo, Luiz Fernando Vianna, Paulo César de Araújo, Regina Zappa e Ruy Castro.
A sugestão da carta e a ideia de que Magalhães a redigisse partiram de Fernando Morais. O texto foi lido no encerramento do FIB, na tarde deste domingo em Fortaleza, pelo biógrafo cearense Lira Neto (autor de biografias de Getúlio Vargas e padre Cícero, entre outras).
Ruy Castro, um dos pesos pesados do encontro, de início se mostrou cético quanto à validade da iniciativa ("Não sei se precisa de mais carta"), mas terminou por assinar.
ATAQUES E CARPINTARIA
O bom nível dos debates orientou a programação do 1º FIB (Festival Internacional de Biografias) --cujo nome não refletiu o time de convidados. O único estrangeiro, o biógrafo americano Laurence Bergreen, entrou de última hora, por iniciativa da mulher dele, quando nome e programação já estavam fechados.
Com curadoria geral dos sociólogos Bete Jaguaribe e Paulo Linhares, reuniu aspectos de literatura, cinema e música.
No que se mostrou um acerto, o encontro ocorreu no entorno do Estoril, antigo cassino e restaurante reduto da boêmia de Fortaleza tombado pelo patrimônio, à beira-mar da praia de Iracema. Com capacidade para 180 pessoas, a tenda onde ocorreram teve em geral boa ocupação --a entrada era gratuita.
As mesas literárias, carro-chefe do festival, se equilibraram entre a defesa das biografias livres --o que incluiu ataques aos artistas contrários à alteração da lei-- e a descrição da arte de contar a vida dos outros, que Magalhães definiu como "carpintaria biográfica".
Chico Buarque, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Djavan e Roberto Carlos, defensores da lei atual e para quem liberdade de expressão deve ser conciliada com o direito à privacidade, foram criticados em todos os debates. Ruy castro chamou Roberto de "censor nato e hereditário".
Na parte cinematográfica --Silvio Tendler, autor de várias cinebiografias, recebeu homenagem no FIB--, foram exibidos longas sobre Guimarães Rosa, Jards Macalé, Jorge Mautner e o próprio Tendler, ao final dos quais se seguiram debates.
O ponto alto da parte musical foi o show de Macalé e Mautner e, dentro dele, os dois artistas interpretando juntos "Vapor Barato", de Macalé e Waly Salomão.
Antes do show, em seguida à exibição do documentário sobre sua trajetória ("O Filho do Holocausto", de Pedro Bial e Heitor D'Alincourt), Mautner fez um desagravo a Caetano, Gil, Paula Lavigne (ex-mulher do primeiro) e Flora Gil (mulher do segundo).
O jornalista FABIO VICTOR viajou a convite do Festival Internacional de Biografias
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