'Alemão' da ficção chega ao cinema enquanto tensão cresce nas favelas
Na última segunda, enquanto a polícia prendia suspeitos de atacarem uma UPP (Unidade de Polícia Pacificadora) no Complexo do Alemão, um cinema da Barra da Tijuca fazia a pré-estreia de um thriller inspirado na ocupação daquelas favelas.
O longa de ficção "Alemão", do diretor brasiliense José Eduardo Belmonte, lançado com uma campanha publicitária gigantesca, se passa nas 48 horas que antecederam a tomada do complexo por forças de segurança, em 2010.
Intercalando imagens reais da operação, que teve até tanque de guerra, o longa adota a perspectiva de policiais, infiltrados para ajudar a implantar as UPPs no Alemão.
Paprica Fotografia/Divulgação | ||
Os atores Cauã Reymond, como o chefe do tráfico, e Jefferson Brazil, que faz seu braço-direito |
Descobertos pelo chefe do tráfico (Cauã Reymond), eles se escondem em um porão.
Com o lançamento ocorrendo na mesma semana em que a Segurança Pública do Estado cogita uma reocupação da região pelo Exército, Belmonte diz que seu filme não defende uma tese sobre os fatos.
"Mais interessante, nesse tempo de incerteza, é articular as perguntas", afirma. "O filme não toma partido, mas levanta discussões sobre o tema. As pessoas encaram a UPP como o fim de uma novela, mas ela é só um começo."
Segundo ele, o filme é "mais sobre a psicologia, os dramas pessoais, do que sobre a sociologia" do evento.
Em uma cena, um dos confinados (Caio Blat) diz que a operação vai ajudar a comunidade. "Mas a gente não pediu nada", rebate uma moradora (Mariana Nunes).
"Ele é o mais ingênuo, acredita na cartilha da polícia", diz Blat sobre o personagem que interpreta. "Acha que a ética vai nortear a invasão."
MEL E PIMENTA
O filme teve locações em duas comunidades (Rio das Pedras e Chapéu Mangueira) além do complexo, onde foram rodadas as cenas do QG de Playboy (Reymond).
A relação com as UPPs no local foi "zero", segundo o produtor Rodrigo Teixeira.
"A gente só ligava para saber se tinha tido tiroteio."
Já no Rio das Pedras, área controlada pela milícia, a situação foi outra: "Ali tinha jeitinho brasileiro. Não havia uma entidade organizada, cada hora aparecia alguém se apresentando como líder".
Filme 'Alemão' retrata tensão na favela
Editoria de Arte/Folhapress |
Para viver Playboy e "pegar o suingue", Cauã diz que ouviu muito "proibidão" no carro, bebeu cerveja com membros da comunidade e falou com ex-traficantes, "para saber como alguém se sente quando mata outra pessoa".
Dessas conversas, tirou um de seus bordões no filme: "A gente precisa deixar de ser bandido para ser criminoso".
O galã explica a diferença: "Tem traficante que não quer ser bandido, não quer matar. O criminoso é o traficante que tem a mente no 'business'".
O grupo (além de Blat, Gabriel Braga Nunes, Marcello Melo Jr, Milhem Cortaz e Otávio Müller) passou por testes físicos, sob ordens do diretor.
"Ele instaurava a sensação de violência mandando a gente comer pimenta malagueta e dizer o texto", diz Caio Blat. "Enchia as nossas roupas de mel para criar a ideia de ter de ajudar alguém sangrando."
O filme dá algum retorno à comunidade? "Joga luz sobre as pessoas de lá que têm as suas versões sobre a história", diz Belmonte. "Se um blockbuster incentivar as pessoas a conhecer os documentários feitos pela própria comunidade ali, já é um retorno."
O repórter GUILHERME GENESTRETI viajou a convite da produção do filme
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